Era
uma vez....
Conversa entre um avô
e um neto daqui a uns cem anos:
“Sabe,
meu pequeno, há muitos e muitos anos, a Terra era habitada por umas criaturas
verdes que não andavam, mas eram muito amigas dos homens e dos animais. Ocupavam
grande parte da superfície desse planeta, e era uma felicidade descansar junto
delas, porque nos protegiam do calor do sol, dessa secura da terra.... Possuíam
os formatos mais variados, umas eram tão enormes e poderiam abrigar centenas de
pessoas sob sua abas. Outras eram finas, compridas e elegantes. A
característica principal dessas criaturas era que estavam fixas no solo, e não
andavam, não se moviam do lugar e não falavam. Mesmo assim, eram vivas e cresciam e se
multiplicavam sem dificuldade. Até os animais gostavam de ficar junto delas...
Como se
chamavam, avozinho?
Eram
conhecidas como Árvores, netinho.
Ár- vo- res?
Sim, árvores
com que Deus cobriu a superfície da Terra, para esta não se desintegrar. Era
uma cobertura de cor verde que existia em todos os lugares, formando florestas
fechadas. Funcionavam como protetoras do solo, e exerciam funções como fazer o
ciclo d’água, atraindo a chuva para regar a terra, e levando-a de volta ao céu,
para formar nuvens. Nuvens eram massas de vapor d’água, que ficavam suspensas
no ar à espera de um vento frio, para se transformarem em chuva, que era um rio
que caía do céu em forma de longas tiras de água. Essa chuva molhava o solo e
renovava a vida em todos os sentidos.
A Terra bebia a chuva,
os animais corriam felizes e os camponeses agradeciam a Deus a bênção, porque
suas plantações iriam produzir muita comida, para sustentar suas famílias... A
chuva escorria pelo chão, enchia os regatos, os rios e os pântanos, que eram as
reservas desse líquido precioso, que hoje quase nem temos mais. Havia tantos
rios, com tanta fartura que funcionavam como artérias da Terra, e suas águas
límpidas irrigavam tudo e saciavam a sede dos seres vivos. Era uma alegria ver
crianças como você nadando na água limpa e fresca dos riachos, em dias muito
quentes como hoje...
Como essas coisas
faziam esse ciclo, vô?
Elas sugavam a água do
chão, se alimentavam dos nutrientes e depois, através das folhas respiravam
devolvendo um vapor d’água ao ar, que iria formar as nuvens. E ao respirar, as
folhas também soltavam um gás chamado oxigênio, que é muito necessário para os
seres viventes como nós.
Mas vô, elas só faziam
a água subir e descer dos céus?
Não, meu querido.
Elas possuíam mil
utilidades. Além das sombras, nos forneciam alimentos como laranjas, maçãs,
mangas, bananas, jabuticabas, jacas, ingás, mamões, palmitos, cocos e uma
centena de outras frutas, que hoje não existem mais. Quando não ofereciam
frutas, elas ficavam floridas e embelezavam o mundo com mil cores, e seus
perfumes faziam a loucura dos insetos e passarinhos, que vinham sugar seu mel.
Era uma festa maravilhosa para toda a natureza ver essas árvores cobertas de
flores... Havia árvores que só produziam frutas que nos alimentavam... Outras
ofereciam a beleza das flores e exalavam deliciosos perfumes... Outras
ofereciam sementes que serviam de alimentos como cocos, tâmaras e castanhas...
De algumas outras, nós aproveitávamos o tronco para usar a madeira para
construir nossos abrigos. E quando ficavam velhas e sem serventia, usávamos
seus galhos para queimar e nos aquecer nas noites de inverno... Mas, todas elas
nos forneciam a sombra que você tanto gosta, meu querido.
Mas, vovô, por que não
existem mais? Eu nunca vi uma coisa dessas... Queria ter conhecido para ser
amigo dela, comer suas frutas, cheirar seus perfumes e brincar na sombra...
Pois é, meu netinho.
Isso é uma longa e triste história da humanidade. É a história da ignorância,
da ambição desmedida do homem na Terra.
Quando Deus colocou o
homem na terra, ofereceu uma floresta sem fim composta de milhões dessas
árvores, onde ele podia se abrigar, se alimentar e viver em harmonia com outros
seres... Era um lugar perfeito, era o Paraíso...
No
começo, o homem usou as ramagens para fazer um abrigo, e conviveu mais ou menos
em paz com outros bichos... Bebendo a água limpa dos riachos, comendo as frutas
saborosas que as árvores ofereciam. Aos poucos, porém foi aperfeiçoando suas
artes e, ao mesmo tempo que criava suas ferramentas de trabalho, foi destruindo
as árvores que existiam ao seu redor. Começou a derrubar as matas, para
construir uma porção de casas... Que se transformaram em cidades... Até então,
poderiam viver bem e em paz... Usufruindo do paraíso criado por Deus.
Mas, alguém inventou
uma coisa chamada Moeda. Moeda ou dinheiro, ou money, ou dindin...
Que servia de troca
das coisas, que sobravam em algumas casas e faltavam em outras...
Inicialmente as trocas
eram de moedas por comida. A comida necessária passou a ser comprada de quem a possuía
em excesso. Trocava-se por moedas, que poderiam ser trocadas por outras coisas.
A Moeda enlouqueceu o
homem. De repente, ele ficou ganancioso, querendo mais e mais moedas, para
poder comprar mais coisas e mandar no pedaço...
Foi assim que o homem
descobriu a força do poder sobre outros homens. E infelizmente gostou muito
disso.
Então, veio a saga de
alguém que manda e outros que obedecem. E veio a servidão, o domínio de uns
sobre outros, veio a tristeza da escravidão... O homem poderoso passou a
dominar os que não tinham moedas, submetendo-os a serviços degradantes por um
prato de comida... E nessa esteira de ambição e poder, o homem foi derrubando
florestas inteiras de árvores milenares para vender a madeira, que trocava por
moedas e mais moedas. E não replantava para renovar essas matas... E em poucos
anos, florestas inteiras foram devastadas, restando uma árvore aqui e outra
ali. Mesmo estas foram destruídas, porque atrapalhavam as máquinas, que usavam
para colher os talos de cana para produzir combustível... E a superfície da
Terra ficou pelada dessa cobertura verde. E todos os rios foram secando...
A ganância humana criou
um sistema de explorar tudo a sua volta, para transformar em moedas. Quem tinha
mais moedas era o manda chuva do lugar...
Eu me lembro meu
querido netinho que, havia umas árvores chamadas ipês, que mesmo sozinhas no
meio da pastagem verde, se cobriam de flores amarelas, e era uma felicidade
vê-las...
Muita gente tomou
consciência da destruição e procurou defender essas amigas... Mas, o poder do
dinheiro foi forte demais e a batalha foi perdida.
Sabe meu querido, se
tivéssemos uma só árvore aqui no quintal, eu faria um brinquedo para você que o
deixaria muito feliz.
Que brinquedo seria,
vovozinho?
Amarraria uma corda
num dos braços da árvore, e faria um balanço para você. E o colocaria sentado
ali e balançaria pra lá, pra cá, pra lá, pra cá...
Como era mesmo o nome
dessa amiga, vô?"
Mirandópolis,
fevereiro de 2016.
kimie oku in
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