sexta-feira, 5 de setembro de 2014



        Quando os ipês florescem

   ,Agosto, mês de cachorro louco, de poeira, da seca sem fim... De queimadas, cujas fumaças fazem os olhos arderem tanto. De saudade das chuvas abençoadas... Do gado magro no pasto berrando: bé, bé, bé numa tristeza sem fim, pedindo água e capim.. Dos bezerros magros implorando leite o dia todo. Do pasto ralo e seco que não sustenta a vacada triste...
   Mês de agosto é um tempo duro no calendário. Todo mundo suspirando pelas chuvas, economizando água, e reclamando do preço das hortaliças e frutas, que chega às alturas...
     Mês de agosto é longo, tem 31 dias, que nunca acabam; mais ainda porque julho também teve 31 dias...
     Em agosto, todo mundo espera a chegada de setembro. Até a palavra “setembro” tem uma ressonância mais vibrante, pois lembra o alegre bimbalhar dos sinos. “Agosto” por outro lado lembra desgosto, deposto, imposto... Ai, nem me fale!
   
 Setembro já é outra conversa. É o mês da Primavera, das flores, da natureza se enfeitando de cores. É tempo dos pássaros se acasalarem, das borboletas fazerem seus bailados nos jardins floridos. É tempo dos namorados passearem de mãos dadas pelas ruas iluminadas pelo sol...
    Setembro é o mês que chama as chuvas, que chegam com força total em outubro, dando um banho completo na natureza. Setembro é um tempo agradável de doces perfumes no ar, de tardes longas e iluminadas...
    Entretanto, agosto tem uma vantagem sobre setembro. Apesar da seca prolongada, dos açudes secando cada vez mais, dos pombinhos gritando “fogo apagou! fogo apagou!”, no meio da pastagem cinzenta e triste, um milagre acontece!
   Em agosto, quando tudo está seco e triste, os ipês começam a florescer. No meio de um bosque, à beira do caminho, na beira das rodovias, no meio da pastagem seca, no meio do canavial, eles se destacam, cobertos de flores rosas, brancas ou amarelas.
    Florescem num deslumbre de encher os olhos. No meio do nada, uma árvore se veste de roupagem de gala, toda em dourado, em branco ou em rosa. E se destaca justamente porque ao redor está tudo morto, seco e triste. Não há quem não aprecie um ipê todo vestido de amarelo dourado, chamando a atenção de longe, como um convite para descansar os olhos da paisagem descolorida, que o cerca.
    E como as sombras são muito raras nessa época, o gado procura se abrigar bem aí do sol ardente. E é muito bonito de se ver as vacas brancas debaixo dos ipês coloridos...
    Quando se fala de ipês floridos, lembro-me de um senhor japonês que esteve aqui em Mirandópolis. Aproveitando a oportunidade, quis conhecer as Alianças e a Comunidade Yuba. Um amigo o levou e no meio do caminho, o estrangeiro começou a gritar para parar o carro. O motorista assustado perguntou-lhe o que havia acontecido. Sem dizer uma palavra, apontou para um ipê rosa todo florido e correu para ver a árvore de perto. Estava longe, no meio de um pasto, mesmo assim lá foi ele correndo e falando alto sem parar. Quando o motorista o alcançou junto do ipê, o homem estava encantado com a beleza das flores, e disse: “Por que os brasileiros apreciam tanto o sakurá do Japão, se vocês têm essa beleza aqui?”
     A diferença é que nós não temos olhos para apreciar essas dádivas da natureza. Estamos tão acostumados com seu florescimento, que nem todas as pessoas reparam nelas.
     Assim como os ipês que florescem na época mais seca do ano, outras plantas sofrem transformações ao longo dos meses. É o milagre da vida trabalhando na natureza. Florescem deslumbrando o mundo com sua beleza e, espalham suas sementes para a reprodução. E essa disseminação das sementes contendo novas vidas, ocorre lá pelos meados de outubro, quando chuvas torrenciais garantem o surgimento de novos pés e de novas árvores. A natureza é sábia, funciona por ciclos bem programados.
    Mas, dirão: “Em setembro também há ipês floridos!” É verdade, não resta dúvida! Mas, o florescimento começa em agosto e continua pelo mês seguinte. Parece que a natureza quer compensar a tristeza da paisagem com suas belas flores.
     E falando em árvores, lembrei-me que há pouco tempo descobrimos uma paineira de flores vermelhas, bem ali na rua que vai para o Kaikan velho, beirando a ferrovia. E me disseram que, existe ainda paineira amarela e branca. Achei muito interessante, porque só conhecia a paineira rosa, que é linda também.
     E falando nisso, será que a paineira vermelha já não estará cheia de painas? Precisamos colher as sementes para reproduzir a espécie que é mais rara. Se deixar que os caroços se abram, as sementes irão embora. Temos que ficar de vigília, para colher.
    Os moradores da Rua Profeta Gentileza precisam colher as sementes. E garantir a continuidade da espécie.

Mirandópolis, agosto de 2014.
       kimie oku in http://cronicasdekimie.blogspot.com.br/

     

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