(memórias)
Todo início de ano é a mesma
coisa. Reunião de família, comida, muita comida, um converseiro só e bastante
esperança. Esperança de, superar no novo ano, tudo que ficou sem resolver.
É assim com todo mundo.
Sempre que amanhece o primeiro
dia do ano, crianças “pedem” boas festas de ano novo, para receber guloseimas.
Como fui criada no sistema
japonês, nunca saí por aí, fazendo isso. Fui criança nos anos do pós-guerra, de
1945 a 1950. E a lembrança que tenho desse tempo é que, o oshougatsu ou dia de
ano novo, era comemorado pelos imigrantes do Japão, de forma totalmente
diferente.
Morávamos numa comunidade de
japoneses e tudo era feito em conjunto. E na época, ainda predominava o culto
aos Imperadores do Japão, culto fortalecido com a tristeza da derrota na
guerra. Os japoneses aqui residentes, reverenciavam
os monarcas
japoneses, como se fossem deuses. E tentaram passar esse sentimento para nós,
crianças.
Logo de manhãzinha, quando clareava
o dia, todos os chefes de família, e seus filhos homens vestiam-se de ternos, e
se reuniam num barracão, ou tulha de algum vizinho.
Ali, diante das fotografias dos
imperadores Hiroito e Nagako, e da bandeira vermelha e branca, realizava-se uma
cerimônia solene de súditos, jurando fidelidade ao Japão. Naquela época, todos
os imigrantes achavam que, estavam só de passagem no Brasil. A pátria, sem
dúvida nenhuma, era o Japão. O Brasil era apenas uma terra emprestada,
temporariamente.
Se não me falha a memória, a
cerimônia constava de discursos,
enaltecendo as figuras dos Imperadores, e relembrando sempre a pátria distante.
Era um ritual rápido, com a entoação do Hino Nacional do Japão: “kimiga yoowa/
Chiyo ni/ Yachiyoni/
Sazare/ Ishino / Iwao to narite/ Kokeno/ Mussu made....” traduzindo: “Que o reinado dos Imperadores dure até que,
os rochedos se transformem em seixos, cobertos de musgos” (eternamente)
É claro que nós, as crianças,
também entoávamos o hino, sem saber o significado, e depois quando se davam os
vivas, ficávamos contentes, porque a comemoração chegava ao fim. Os vivas eram:
“Banzai, Tenno Reika !”... “Banzai, Kogo Reika!” ... “Banzai, Nippon!” ...”Banzai, Oriente Shokuminchi” ou, Viva o Imperador, Viva a Imperatriz, Viva o Japão,
Viva a Colônia Oriente!
Depois desses vivas repetidos
várias vezes, alguém começava a distribuir os manjus, os motis e balas. Era o
melhor momento da reunião para nós, crianças.
Os adultos homens sentavam-se em
volta de uma mesa, repleta de coisas gostosas, e saboreavam a culinária
japonesa. Depois, iam de casa em casa, cumprimentar as famílias e desejar um
bom ano para todos.
Lembro ainda que, entre os pratos
enfileirados, contendo sushis , nishimê,
ozooni e pedaços de toofu servidos com shoyu, havia também leitoas assadas
inteiras , assim como frangos dourados, crocantes... Nesse dia, todos se
alimentavam bem, pois se dizia que, quem passasse fome nesse dia, passaria
necessidade o ano inteiro. Tudo era motivo para se encher a barriga. Hoje, relembrando aquele tempo que
passou, vejo que nada restou desses costumes tão inocentes, dos japoneses.
Cultuar uma
pátria distante...cultuar Imperadores que nunca ninguém conhecera ... manter
costumes de outro mundo... não há sentido nisso. Por isso, tudo se perdeu ao
longo dos tempos...
E acabamos adotando os costumes da
Terra. E foi bom, porque não há sentido em consumir comida com temperos de uma
região gelada, já que lutamos todos os dias, para sobreviver ao calor tórrido
dos trópicos.
E não há sentido em cultuar
governantes de outros países, se é aqui
que sofremos, se é aqui que a inflação não perdoa, se é aqui que
pelejamos todos os dias.
E não há sentido fingir que, o
Brasil é terra emprestada, uma vez que os nossos pais estão enterrados neste
solo, para sempre. E nossos filhos e netos são totalmente brasileiros, assim
como nós.
Sei que muitos desses costumes vão
prevalecer, pois origem é origem. E comer um sashimi de vez em quando é muito
revigorante. E falar em japonês não faz mal a ninguém, porque cultura é
cultura.
Mas tudo isso já virou moda
abrasileirada.
E é por isso que gosto de, lançar
de vez em quando, umas palavras japonesas como esse “oshougatsu”.
Mesmo porque, há palavras que têm
um significado especial para nós, descendentes de japoneses.
Palavras como
"Shinnem akemashite omedetou gozaimasu",
ou Feliz Ano Novo!
"Shinnem akemashite omedetou gozaimasu",
ou Feliz Ano Novo!
E Arigatô!
Mirandópolis, 1° de janeiro de 2012.
kimie oku in
Nenhum comentário:
Postar um comentário