domingo, 22 de novembro de 2015

                               50 anos depois...
     
     De repente, um convite.
Participar de um Encontro de Jubileu de Ouro de Professores Normalistas, que se graduaram no Colégio Estadual e Escola Normal Dona Noêmia Dias Perotti, Mirandópolis.
Pensei não sou da turma, posto que me formei em 1960, isto é cinco anos antes, e minha turma é outra, e lá vão 55 anos que saímos da Escola, para trabalhar em outras Escolas... Mesmo assim, considerei a chance de cumprimentar esses colegas de trabalho, que escolheram e se dedicaram à mais nobre das profissões, ser Professor e ensinar a ler, a escrever, a contar, a cantar, a brincar, a ser gente da sociedade...
Dei um tempo para o pessoal almoçar e botar o papo em dia... E lá fui eu. Sabendo que seria um estranho no ninho. Surpresa! A maioria era gente conhecida, com quem convivi um pouco por aí nos caminhos percorridos.

Os anfitriões Regina Rosado e Ademar Bispo... O Antonio Fábriga que era de Lavínia... A Zilda Zonzini, com quem convivi na AABB, a Flora Tanaka, que fez parte da minha roda da juventude (nossa! Há quanto tempo!), a Naoe Miyamoto sempre tão animada, espalhando alegria por onde passa, a Sônia Veroneze, que continua bonita como era, a Dineia Martins Tonello, minha parceira do face, a Marlene Gonfiantini que nem me lembrava, a Roselle Carvalho, irmã da minha amiga de Lavínia, Maria Adelaide, as moradoras locais Teresa Veronese, Zilda Vendrame, Vera Lúcia Bonfim Nakano, Vandelcy Bonfim; o Osvaldo Siqueira com quem convivi no Lascabode há uns duzentos anos, o Milton Carvalho que era de Lavínia como eu, e outras três nisseis, que não tive o prazer de conviver, que são as irmãs Hideko e Yossiko Kato, e Noriko Seki; e Ofélia de Oliveira, que também não conheci.
Como cheguei no fim da festa, com o pessoal se despedindo, não deu pra trocar figurinhas com a maioria, o que foi uma pena. Gostaria de ter trocado duas palavrinhas com cada um dos participantes, que moram em diversos lugares do Brasil. Tão difícil se reunir e foram embora logo. No final  ficaram as três irmãs Tanaka, o Osvaldo Siqueira, a Simone, a Regina e eu.
Então, a Regina me deu as coordenadas do Encontro. A homenagem para aqueles companheiros que cumpriram sua missão, e foram morar no céu: Antonelli Antonio Secanho, Helena Ortegas Coggo, Hide Aparecida Nars, Kikuko Sato, Kunihiro Sato e Teresinha Squinca. Desses conheci bem o Antonelli, que era um rapaz muito inteligente e educado; e o Kunihiro Sato ou Paulinho Sato de Lavínia, que deu aulas em Tabajara quando nós faltávamos. Seis Professores que já cumpriram sua missão na vida.
E citou alguns colegas que ficaram impossibilitados de comparecer, por questões de saúde própria ou de familiares.
Com exceção do Antonelli, que se tornara um Promotor Público, não sei se todos se dedicaram à missão de ensinar. Mas, pelo que percebi, estão bem de saúde, ostentando alegria por estarem vivos. E notei que todos sem exceção estão bem conservados, não aparentando que já estejam na casa dos setenta anos.
Pensei em contar aqui como foi o Encontro, mas não posso porque não participei. Então, vou colocar minha visão do que foi a tarefa de Professor. Por tudo que eu vivenciei e acho que eles também.
Há cinquenta anos eram todos jovens, cheios de vitalidade, com as cabeças recheadas de sonhos para conquistar o mundo. Iriam direcionar os passos para Escolas, e eram Escolas lá no fim do mundo, porque todos começavam em escolinhas rurais, sem transporte, sem estrada decente, sem companhia de colegas para dividir e dirimir dúvidas... Escolinhas de três séries, a quem o Professor precisava atender e vencer o Programa fazendo malabarismos... E trabalhava-se aos sábados. E não tinha nada de emendar feriados, e não eram só 180 dias letivos. Começava-se em 14 de fevereiro e ia até 14 de dezembro, com férias em julho. Aulas aos sábados eram obrigatórias. Não havia hora-atividade paga para preparar aulas. E na falta de material, o Professor comprava para os alunos carentes. E ninguém o reembolsava. Salário miúdo, dificuldades mil mas sempre tocando barco, acudindo alunos, sem desistir nunca.
De um jeito ou outro tudo foi vencido, o Professor se efetivou. E aí vieram as Greves. Greves por melhores condições de trabalho e aumento de salários, que os Governantes sempre deram o mínimo... E tudo foi se transformando, as famílias se desagregando e deixando a educação integral de seus filhos para os Professores, como se estes fossem babás deles...
E com a sociedade falida, mães trabalhando fora começaram a mandar crianças confusas, rebeldes, carentes de atenção e sem um mínimo de respeito pelos mestres. E aí começou a dificuldade do Professor. Tinha que ensinar conhecimentos e, corrigir atitudes de crianças meio perdidas na vida. Mesmo assim, ele não desistiu. Usou da Psicologia que aprendeu um pouquinho lá no Curso Normal, e foi conquistando as crianças rebeldes com brincadeiras, com histórias interessantes, com técnicas diferentes de abordagem.  E assim foi... Até que acabou a caminhada. Aposentou-se. Cansado, esgotado, sem ninguém saber das infinitas horas gastas preparando aulas, e corrigindo tarefas e provas. Das dificuldades vencidas com muitas lágrimas, sem nenhuma recompensa, sem um alento por parte do Governo.
Enfim aposentou-se.
Sem o reconhecimento da sociedade, que é sempre ingrata para as pessoas que passam. Sem um salário decente, que o Governo nunca se preocupa com quem se aposenta. Sem muita saúde, que o IAMPE jamais cuidou direito do bem estar de seus dependentes... Aposentadoria triste e solitária.
Mas, um belo dia, o Professor reencontra um ex aluno, de vinte, trinta nos atrás... Já é um cidadão inserido na sociedade, pelejando para viver e dar conta de sua prole. E de lá vem um abraço caloroso, cheio de felicidade ao reencontrar o velho mestre. E fala da sorte de ter sido seu aluno, que teve infinita paciência para lhe ensinar a tabuada, a conjugar os verbos... A escrever corretamente... E diz que está bem, dando conta da vida, andando nos conformes. E é feliz. Feliz, palavra que mexe lá no fundo da alma do velho mestre.
É apenas um momento numa esquina qualquer.
    Mas, é tudo que o Professor precisava ouvir, para perceber que não lutou em vão. Que sua labuta deu certo, que a semente germinou e, deu uma bela árvore que está frutificando... E a partir daí, volta e meia encontra mais um aluno, e mais outro e outros e outros, que lhe são gratos pelas lições recebidas.
Então, o pobre Professor aposentado, esquecido pelos mandantes da sociedade descobre que, ele deu a vida por uma das mais belas profissões, que é a de construir gentes. Gentes para não se perderem nunca na vida...
E então se sente gratificado por tudo que vivenciou, sofreu e foi mal remunerado. Porque a gratidão dos alunos é tudo, e constatar que conseguiu encaminhá-los na vida é o maior prêmio. É uma glória suprema.
E descobre que apesar dos percalços da vida, valeu a pena ser Professor. Porque Ensinar é a mais nobre das profissões.
Não é?
     
Mirandópolis, novembro de 2015.
kimie oku in




2 comentários:

  1. Você ( como sempre !!!) retratou direitinho a alma do professor. Também me sinto grandiosa por ter sido professora ( e olha que não fui das melhores ) e satisfeita por
    ter passado uma vida lidando com jovens que mantiveram em mim a juventude deles. Parabéns ! Abraços!

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