Vai um cafezinho aí?
No Japão, em qualquer ocasião
oferece-se chá, assim como na China e outros países do Oriente.
No Brasil, o costume é oferecer
café.
O café quentinho, passado na hora
tem o poder de ligar as pessoas numa roda de descontração e bem estar. E
transforma qualquer reunião num bate papo agradável.
O cafeeiro fez parte da vida de
grande parte dos brasileiros... Nos anos 40, 50 e até 60, o café ainda era o
propulsor da economia do país. E, nascidos nos anos 40 e 50 tivemos que labutar
muito nas roças de café. Desde crianças tivemos que ir à roça e ajudar os pais
e irmãos mais velhos na colheita dos grãos. Era um trabalho duro e áspero.
Tínhamos que segurar os galhos e puxar os grãos pretos e vermelhos para baixo.
Isso machucava nossos dedos que ficavam com as pontas todas perfuradas e doíam
muito, até a gente se acostumar.
As mãos perdiam a maciez e ficavam ásperas e
grosseiras. (A gente nem conhecia cremes para proteger a pele. E mesmo que
soubéssemos, não tínhamos dinheiro pra comprar esses luxos.) O café derrubado
era rastelado e peneirado ali mesmo na roça e depois ensacado. Só os adultos
fortes conseguiam peneirar os grãos. Os grãos meio verdes eram pesados e havia
muita terra misturada, pedregulhos e folhas do cafeeiro. Então era necessário
abanar, lançando todo o conteúdo para o alto várias e várias vezes, para
eliminar as folhas e a terra. Depois, as carroças transportavam os sacos de
café para casa, onde eram colocados num terreiro de cimento para secar. Lá eram
revirados todos os dias, até a secagem completa. Só depois de tudo isso, era
vendido para as Máquinas de café da cidade, que os descascavam e os revendiam
para os exportadores.
O cafezal fez parte de minha
infância e da maioria dos brasileiros de minha época. O Brasil foi o maior
exportador de café do mundo. E a vida dos lavradores embora dura e árdua era mais ou menos confortável,
porque todos plantavam arroz e feijão e verduras nas entressafras do café.
Todos eram pobres, mas a comida era farta e ninguém saía pedindo ajuda...
Quando revejo os cafezais, eles me parecem soldadinhos verdes parados nos
morros, cumprindo a missão de produzir aqueles frutos vermelhos tão bonitos,
que garantiam o sustento de tantas famílias brasileiras. Nada era fácil, porque
a colheita era apenas uma vez por ano, e enquanto não se vendia o produto, era
preciso recorrer a outros meios para sobreviver. Assim, muitos produtores
passaram a plantar algodão, cebola, feijão, banana... Mais tarde, a
superprodução de café provocou uma crise e o Governo brasileiro mandou queimar
sacas e mais sacas de café... Pra manter os preços. E os cafezais foram queimados,
e substituídos por pastagens para se criar gado bovino. Hoje, até as pastagens
estão sendo tomadas pelos canaviais, para produzir o etanol...
Outros tempos...
Inicialmente, o café foi cultivado
no Norte do país, mas logo se alastrou por todas as regiões, especialmente no
Sul. Sua produção enriqueceu muita gente, que até fez surgir uma classe social
diversificada, a dos Barões do café que moravam
Mas, outros países começaram também
a produzir café e a superprodução provocou a queda dos preços e a falência da
economia do café. E a falência da agricultura. Os braçais que perderam o
emprego na roça vieram todos para as cidades, e incharam as periferias com seus
barracos. E como não havia emprego disponível, essa população desocupada se
transformou num grande problema. Décadas se passariam até as cidades
recuperarem o equilíbrio. Muitos desses desempregados passaram a exercer pequenos
serviços, como ambulantes oferecendo seus préstimos de porta em porta. Quando a
agricultura se recuperou em parte, nova classe social surgiu – eram os boias
frias, que passaram a ser levados das cidades para trabalhar nas roças de
algodão, de cana...
Hoje, até os cortadores de cana
estão sendo substituídos por máquinas colheitadeiras...
Mas voltando ao café, antigamente os
grãos eram socados no pilão para descascá-los, e torrados numa torradeira que
nós girávamos sobre um fogãozinho de tijolos ao ar livre. E todas as manhãs, os
grãos eram moídos para se fazer o café. Era tudo um processo difícil, que nós
encarávamos naturalmente. Não havia alternativas...
Hoje, a tecnologia facilitou tudo. A
geração atual não conheceu os cafezais e nem os grãos de café. Conhece o pó
moído e nem coa o café mais. Existe o café instantâneo, que é preparado só acrescentando
água quente... Café cremoso, com chantilly, café expresso... Já tomei café à
moda alemã, com limão...
Lembro que um amigo me ensinou que
tomar muito café provoca azia. E é fato! Passei a reduzir os goles de café
diário e adeus azia! Isso devo ao inesquecível e saudoso Professor Carlos
Rizzo.
Quando trabalhava ainda, tomava
muito café. O café era a fuga dos aborrecimentos, a pausa para esfriar a
cabeça. E o amigo Jorge Chaim costumava dizer que as melhores decisões não
saiam durante as reuniões, mas na hora do café.
De qualquer forma, o café ainda é o
rei absoluto de pequenas reuniões, servido quase sempre com bolos ou pães.
E eu gosto muito de visitar amigos e
tomar um cafezinho enquanto batemos um papinho.
Vai um cafezinho aí?
Mirandópolis, abril de 2017.
kimie
oku in
Trabalhei um pouco nas fazendas da café, empreitada que não me deixou saudade. Para mim que era garoto foi sofrimento...
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