Grupo Escolar de Amandaba
No Bairro havia o Armazém do seu Alaby pai
do Professor Yussuf, meu colega de trabalho; o Armazém do seu Adelar Junqueira,
pai da amiga Nadir Junqueira, o Bar do seu Paulo Kanamaru, o Açougue do Zezão Frazilli, e outras pequenas vendas. Havia ainda uma extensão do Cartório Civil
comandado pelo amigo Luiz Nunes e o policial seu Aldo Barbosa de Almeida, um
nordestino arretado de bom que conseguia manter a ordem no bairro.. Uma Capela, onde o Padre Epifânio celebrava as
missas de vez em quando. A vida fluía tranquila no bairro. Os trens chegavam e paravam levando as
sacas de café colhido para Santos. E todos viviam mais ou menos servidos. Não
faltava trabalho e comida. Ocorrências policiais eram apenas de brigas entre
bêbados...
Havia fazendas nas proximidades, como a
do Lourencinho, do Lourenção, do João Godoy, dos Gottardi, e fortes sitiantes como os Pinhatta, os Hattori, os Cabeça, os Sekine... E a Granja do Shirakawa que produzia ovos. Mas, a superprodução de café fez
os preços baixarem e a economia do café quebrou. Além de que havia concorrentes
estrangeiros produzindo café de melhor qualidade que o Brasil. O governo mandou queimar os estoques de
café para manter os preços, mas não teve jeito. A economia de repente passou da
produção de café para a pecuária. E onde havia colônias de vinte a trinta
famílias eram necessárias apenas uma ou duas para cuidar da boiada. E
os pobres peões do café vieram para as cidades, inchando-as à procura de
ocupação que não existia. Em Amandaba foi assim também. Famílias inteiras foram
embora e as crianças foram diminuindo aos poucos.
Era um novo tempo, o trem foi aos poucos parando de exportar café, a população local diminuiu drasticamente e os alunos foram se reduzindo. Os que continuavam eram bem pobres, mal nutridos e carentes de material escolar. A Caixa Escolar não dava conta de fornecer material para todos...
Mas os alunos continuaram levados da breca. Lembro do Natal Brito que arrastava uma perna por deficiência de nascimento, que apareceu um dia com o braço engessado e a mãe veio junto para que eu ficasse de olho nele. Na sala de aula estava quietinho. Fui observá-lo no Recreio e levei um susto! Ele estava batendo num outro moleque com o braço engessado... Um outro menino muito taludo quando recebeu a caneta esferográfica para escrever com tinta, tirou a camisa e desenhou traços e mais traços no próprio peito. Quando lhe chamei a atenção dizendo: "Você não é índio para se pintar assim!" Ele respondeu: "Sou sim, professora. Minha avó é índia!"
Um dia, uma colega minha deu uma varada nas pernas de um dos moleques dos Brito, que não parava de andar na sala brigando com outros... Aí, o moleque mandou dizer que no dia seguinte viriam sete mulheres das famílias Brito para dar uma surra na professora. E a professora Deise Teixeira (esposa do Pedro Paulo Guizelini) lhe respondeu:" Pode vir quente, que estamos fervendo!" Essa música do Roberto Carlos estava na moda... Mas não apareceu nenhuma mulher.
Eu gostava de iniciar Estudos Sociais com a ficha de identidade de cada aluno. Na primeira página do caderno, cada um fazia a sua identificação: Nome, data de nascimento, sexo, onde nasceu, nomes dos pais.... Para isso, pedia que trouxessem sua certidão de nascimento, para escrever seus nomes corretamente. E descobri que um garoto tinha sido registrado como de sexo feminino, porque o nome era Valdete. Chamei o pai e lhe disse que deveria ir ao Cartório para corrigir isso, pois no futuro teria transtornos. Mas o pai não tinha recursos. E nós professoras cotizamos e pagamos as despesas. E toda vez que vejo esse pai, ele me agradece.
Também tive excelentes alunos, como o Júlio Cesar Barbosa de Almeida, o Adauto Ribeiro, a Dalva Pereira dos Santos e seus irmãos Valdir e Valmir, a Rosângela Cabeça, os irmãos Hattori, os Shirakawa, dos quais o Luigi só falava japonês quando entrou na Escola, os Quaresma Xavier, os Proieti, os Carinhena, a Tomiko Sugimoto e tantos outros. A Nice Brito também foi minha aluna, mas me deu um trabalhão!
Tenho muitas saudades daqueles tempos. Volta e meia vou até a velha Escola, que está fechada e abandonada. Sento-me à sombra das frondosas árvores e parece que ouço todo o barulho da molecada que encheu aqueles tempos felizes...
A vida segue mas vamos deixando pegadas por onde passamos.
Mirandópolis, maio de 2019.
kimie oku in
http://cronicasdekimie.blogspot.com.br/
Era um novo tempo, o trem foi aos poucos parando de exportar café, a população local diminuiu drasticamente e os alunos foram se reduzindo. Os que continuavam eram bem pobres, mal nutridos e carentes de material escolar. A Caixa Escolar não dava conta de fornecer material para todos...
Mas os alunos continuaram levados da breca. Lembro do Natal Brito que arrastava uma perna por deficiência de nascimento, que apareceu um dia com o braço engessado e a mãe veio junto para que eu ficasse de olho nele. Na sala de aula estava quietinho. Fui observá-lo no Recreio e levei um susto! Ele estava batendo num outro moleque com o braço engessado... Um outro menino muito taludo quando recebeu a caneta esferográfica para escrever com tinta, tirou a camisa e desenhou traços e mais traços no próprio peito. Quando lhe chamei a atenção dizendo: "Você não é índio para se pintar assim!" Ele respondeu: "Sou sim, professora. Minha avó é índia!"
Um dia, uma colega minha deu uma varada nas pernas de um dos moleques dos Brito, que não parava de andar na sala brigando com outros... Aí, o moleque mandou dizer que no dia seguinte viriam sete mulheres das famílias Brito para dar uma surra na professora. E a professora Deise Teixeira (esposa do Pedro Paulo Guizelini) lhe respondeu:" Pode vir quente, que estamos fervendo!" Essa música do Roberto Carlos estava na moda... Mas não apareceu nenhuma mulher.
Eu gostava de iniciar Estudos Sociais com a ficha de identidade de cada aluno. Na primeira página do caderno, cada um fazia a sua identificação: Nome, data de nascimento, sexo, onde nasceu, nomes dos pais.... Para isso, pedia que trouxessem sua certidão de nascimento, para escrever seus nomes corretamente. E descobri que um garoto tinha sido registrado como de sexo feminino, porque o nome era Valdete. Chamei o pai e lhe disse que deveria ir ao Cartório para corrigir isso, pois no futuro teria transtornos. Mas o pai não tinha recursos. E nós professoras cotizamos e pagamos as despesas. E toda vez que vejo esse pai, ele me agradece.
Também tive excelentes alunos, como o Júlio Cesar Barbosa de Almeida, o Adauto Ribeiro, a Dalva Pereira dos Santos e seus irmãos Valdir e Valmir, a Rosângela Cabeça, os irmãos Hattori, os Shirakawa, dos quais o Luigi só falava japonês quando entrou na Escola, os Quaresma Xavier, os Proieti, os Carinhena, a Tomiko Sugimoto e tantos outros. A Nice Brito também foi minha aluna, mas me deu um trabalhão!
Tenho muitas saudades daqueles tempos. Volta e meia vou até a velha Escola, que está fechada e abandonada. Sento-me à sombra das frondosas árvores e parece que ouço todo o barulho da molecada que encheu aqueles tempos felizes...
A vida segue mas vamos deixando pegadas por onde passamos.
Mirandópolis, maio de 2019.
kimie oku in
http://cronicasdekimie.blogspot.com.br/
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