O
Diário fez anos
Quando era bem jovem,
li toda a coleção de livros de Cronin, escritor escocês que descreveu com
bastante realismo, a vida vivida pelos mineiros de carvão da Europa.
Todos
os seus romances me impressionaram bastante, como “Sob a luz das estrelas”, que
relata o sofrimento dos pobres mineiros, que vivem a vida toda dentro das
cavernas subterrâneas, sem ver a luz do sol, escavando carvão para as
indústrias... “O castelo do homem sem alma”, que narra toda a prepotência de um
chefe de família, que usa uma filha para satisfazer a sua vaidade pessoal diante
da sociedade... “A Cidadela”, que revela
o lado difícil da carreira de um médico, empenhado em cuidar de seus
pacientes...
Mas, o livro que me
marcou de vez foi “O Farol do Norte”, que é a história de um jornal de uma
pequena cidade, e cujos redatores só querem divulgar a verdade. Por praticarem uma imprensa correta e respeitosa, os
diretores são perseguidos por concorrentes poderosos, que usam os piores artifícios para os destruir. E eles passam
dificuldades mil, para continuar no jornalismo. Todo jornalista não deve
dispensar a leitura desse livro, que é muito edificante.
Lembrei-me
dessa leitura feita há tantos anos, quando a Eloyce do Diário me disse que em
maio o jornal fez 27 anos. E diante desse fato, resolvi levantar a história do Jornalismo
em Mirandópolis. Para isso, consultei o livro “MIRANDÓPOLIS, sua evolução no
século XX ” de Doutor Alcides Falleiros.
Da leitura apurei o que segue: em 1944,
veio para cá o senhor Belarmino da Cunha Matos, como Fiscal de Algodão da
Secretaria da Agricultura, para atuar junto a Esteve e Irmãos S/A, que comprava
e revendia a fibra de algodão in natura. E montou uma Tipografia pretendendo lançar
um jornal.
Dois ou três anos
depois, veio o senhor Rubens Bêngio, Escrivão de Polícia, que em 1948 se
associou a Edgard Correa Vilela e a Belmiro Borine e adquiriram a Tipografia de
Belarmino de Matos. E lançaram o jornal “O Mirandópolis” em 1º de janeiro de
1949, com 22 páginas, e farta propaganda.
“O
Mirandópolis” foi o primeiro jornal desta cidade e desde o lançamento
declarou-se apartidário.
Mas,
houve mudanças na sociedade e em julho de 1949, os responsáveis passaram a ser Belmiro
Borine e Alcino Nogueira de Sylos, que adotaram como princípio criticar o 1º Prefeito
eleito, Delmiro Luiz Rigolon, a quem desmoralizavam com seus afiados ataques. A
população não aceitou essas críticas e, o jornal “O Mirandópolis” sem o apoio
do povo e da Prefeitura, que suspendeu as encomendas gráficas, encerrou suas
atividades com o número 49.
A
Tipografia foi vendida aos irmãos Depieri, que já trabalhavam nessa área, em
Santo Anastácio. Antonio Depieri veio morar em Mirandópolis, e fundou a Gráfica
Paulista, que lançou no Natal de 1949 o jornal “A Cidade”, que teve como
Diretor Antonio Depieri e como Redator, Elídio Ramires.
Conforme o depoimento
do Dr. Alcides Falleiros, “A Cidade” foi um bom jornal, isento, com críticas
construtivas e conseguiu a adesão e colaboração de gente muito capaz como Dr.
Edgar, Prof. Edvaldo Perassi, Padre Epifânio Ibanez, Dr. José Goyanna, Prof.
Pedro Perotti, Dr. Neif Mustafa entre outros.
Em
1951, a Gráfica dos Depieri foi comprada pelos senhores João Ribeiro dos Santos
e Idanir Antonio Momesso, com o seu Elídio Ramires continuando na Redação do
jornal “A Cidade”.
Ao longo dos anos,
mesmo trocando os redatores, “A Cidade” foi publicada, falhando uns tempos e
reaparecendo depois, até que em 1955, entra como sócio de Idanir Momesso, o
senhor José de Fátima Lopes. Nessa fase, o Redator passa a ser o Professor
Antonio Sanvito, que permanece até 1960, quando o senhor Momesso vendeu a sua
parte na sociedade, ao senhor Moacir dos Santos que, pouco depois a revendeu
aos senhores Altino Lorena Machado e Dr. Gerson Gonçalves.
A Cidade passou então,
a publicar duas colunas: “Fatos e Ângulos” de Altino Lorena Machado com
insinuações venenosas sobre assuntos locais e políticos, que lhe valeram o epíteto
de “Timbó” e a coluna “Saca-rolha”, de Gerson Gonçalves, que só abordava sobre
a política local, mas de forma moderada.
Idanir Antonio Momesso
deixando a empresa, fundou a Tipografia Santo Antonio e em 5 de agosto de 1962,
lançou o 1º número de “O Labor”, jornal que circularia por 14 anos, parando em
1976. E em 1963, o senhor José de Fátima deixaria também a Gráfica, indo embora
para Campinas.
Em 1967, Altino L.
Machado fecha “A Cidade” e lança “Jornal de Mirandópolis”. Em 1974, Altino
deixa o jornal e a cidade, restando então só Joaquim Alves Filho como
proprietário da Gráfica, que passa a denominar-se Gráfica Mirandópolis.
Durante anos, A Cidade
lançou uma revista primorosa, nas comemorações do aniversário da cidade,
chamada “Mirandópolis em Revista”, que relatava os fatos mais importantes
ocorridos até então, no âmbito municipal, regional e estadual. Hoje, restam
apenas alguns desses números, nas mãos de saudosistas e colecionadores. A
coleção completa seria um valioso documento da História de Mirandópolis.
Após a suspensão dos
jornais A Cidade e o Labor, por aqui não circulou nenhum jornal por um bom
tempo. Os cidadãos ressentiam da falta mesmo de um semanário, que divulgasse as
últimas notícias da cidade e da região.
Até que um dia, por
aqui aportou o senhor Eloi Mendonça.
Mendonça nascera em
Tubarão, Santa Catarina em 31 de março de 1943. Em Guaíra, Estado do Paraná fez
circular por 8 anos o jornal “7 Quedas”.
Quando os Saltos de
Sete Quedas foram engolidos pelo lago para a construção da Hidrelétrica de
Itaipu, Eloi fechou o seu “7 Quedas” e veio para Araçatuba. Junto com Genilson Senche que era o
proprietário da “Folha da Região” desenvolveu um grande Projeto, fazendo o
jornal chegar a 37 cidades da região, e transformando a Folha da Região no mais
importante veículo de comunicação gráfica, dessa Região Administrativa do
Estado.
Dono de uma aguçada percepção
notou que, Mirandópolis não possuía nenhum jornal para atender às necessidades
da população. E em 1º de maio de 1985 lançou o semanário “Hoje de
Mirandópolis”. Esse semanário teve boa aceitação e em 1989, passou a circular
diariamente, de terça a sábado.
Com o sucesso do
jornal, Eloi investiu em equipamentos e comprou os títulos de 5 jornais: “O Jornal”
de Pereira Barreto, “A Cidade“ de Ilha Solteira, ”O Jornal“ de General Salgado,
“Correio da Região” de Auriflama e “O Jornal“ de Palmeira D’Oeste. Eloi
investiu pesado, modernizando sua Tipografia e começou a editar todos esses
jornais diariamente, além do “Hoje” de Mirandópolis, “Hoje” de Castilho e
“Diário” de Andradina. Com isso nascia o Grupo Jornal de Fato, que no auge de
sua produção contou com uma equipe de 75 funcionários.
Entretanto, as
despesas também eram imensas, por causa do maquinário, que cada vez se fazia
mais necessário. Basta dizer que acreditando no futuro da imprensa, Eloi
comprou a primeira Impressora em Off Set, comprou Linotype Mod 31, Clicheria
Hell, Impressora alemã Keickbuch, Máquina Datilográfica IBM Composer e a
Impressora Rotativa de 4 unidades de impressão e dobradeira, diretamente de
Arkansas, dos Estados Unidos.
E aí vieram os Planos
Econômicos do Governo, que atingiram diretamente as finanças da Empresa,
impossibilitando-a de continuar editando os jornais, como vinha fazendo. Além
dos planos do governo, houve problemas políticos, que afetaram a manutenção dos
periódicos e dos funcionários.
A Empresa teve que se
reestruturar para continuar sua jornada. Eloi Mendonça ficou doente ao ver
desmoronarem os seus sonhos e, acabou falecendo em 27 de junho de 2009, com 66
anos de idade. Foi uma vida toda dedicada à imprensa, remando contra a maré
todos os dias, para levar adiante o seu sonho de um grande jornal, que não
conseguiu concretizar em vida.
Empresa acéfala, sem
garantias de um futuro promissor, a esposa Alice Baraviera Gonçalves pensou em
encerrar as atividades de vez. Entretanto, o filho Alan resolveu fazer
Jornalismo e juntando forças com a irmã Eloyce e a mãe, decidiram continuar a
obra de Eloi Mendonça. Já são passados três anos deste a morte do Eloi. Três
anos de muita incerteza, de falta de recursos e de muito trabalho. Entretanto,
a fase mais difícil já foi ultrapassada.
Hoje circulam apenas O
Diário de Pereira Barreto e o Diário de Mirandópolis. E dia a dia, estão
conquistando espaços, com noticiário variado e colaboração de vários cidadãos.
E sempre, sempre caprichando nas edições, com algumas coloridas, vez ou outra.
O Diário tem boa aceitação e é muito lido pela população local e da região, e
mesmo o seu site diariodefato@diariodefato.com.br é bastante visitado.
O melhor depoimento
que ouvi foi do senhor Elídio Ramires, que aqui residiu nas décadas de 40 e 50.
Seu Ramires reside em Valinhos, aposentado como Fiscal de Renda, exercendo
ainda a Advocacia, com a idade de 74 anos. Teve oportunidade de conhecer o
jornal Diário recentemente, quando lhe enviei um número, que publicou uma
crônica sobre uma foto histórica de Mirandópolis.
Ele me disse que,
ficou encantado ao perceber que o nosso Diário circula todos os dias, pois nem
em Valinhos, que é uma cidade muito mais potente que a nossa, não há jornal
local diário. Disse que o Diário é um jornal bem feito e agradável de se ler. E
ele entende do assunto, pois foi por muito tempo o Redator do nosso 2º jornal
“A Cidade”, que circulou na década de 50.
Mas, o que tem Cronin,
o escritor escocês a ver com esse relato de hoje?
Em primeiro lugar, tem
que o meu desejo de escrever para jornais, nasceu após a leitura de sua obra “O
Farol do Norte”. Cronin ressaltou a
importância de um jornal, que circule entre todas as classes sociais, pobres ou
ricos, letrados ou ignorantes, humildes ou poderosos, conscientes ou alienados.
Ele pregou que o jornal é necessário para formar opiniões, como instrumento de
reflexão, para despertar consciências...
Um cidadão que não lê,
que não tem notícias de nada, que não é instigado a pensar para tirar
conclusões, viverá perpetuamente alienado, no seu mundinho limitado pela inconsciência...
Um cidadão assim jamais crescerá, continuará a ser uma toupeira, morando num buraco.
Por tudo isso, o
jornal é necessário. Um jornal que informe, que noticie, que desperte, que
denuncie, que propague as boas ações, que alerte os cidadãos sobre os perigos,
que o rondam todos os dias, que lhe ensinem os melhores caminhos para se viver
bem.
Acho mesmo, que o Eloi
Mendonça tinha esses propósitos, apesar de não tê-los publicado, porque ninguém
peleja tanto na redação de um jornal, se não for movido por objetivos mais
elevados. Vi o Eloi brigando com políticos e só levando prejuízos, quando era
muito mais fácil concordar com as negociatas, e viver tranqüilo. Mas, a sua
consciência não lhe permitia isso, e o fazia dar e levar bordoadas a torto e a
direito.
Um dia, lhe prometi
que o ajudaria no jornal, quando eu me aposentasse. Ofereceu-me uma mesa para
trabalhar, mas fui protelando, achando que não era hora ainda. E quando ele
partiu, achei que a hora era chegada. De cumprir a promessa.
E aqui estou eu, junto
dessa brava gente do Diário de Fato, pelejando toda semana com as minhas
crônicas, porque acredito no poder da palavra. E ultimamente, temos conseguido
a adesão de outros excelentes cronistas, como o Lupércio Nery Palhares, o
Ademar Bispo e a Maria Nívea, todos apaixonados por Mirandópolis, mesmo não
mais residindo aqui.
E assim, de
colaboração em colaboração, o Diário vai seguindo o seu destino, e acredito que
vai cumprindo bem o seu papel de disseminar notícias, de informar, de provocar
debates, de denunciar falhas, de facilitar a comunicação e sobretudo, de
despertar consciências.
E desejo que tenha
vida longa, servindo a comunidade.
Mirandópolis, 12 de
junho de 2012.
kimie oku in
“cronicasdekimieoku.blogspot.com”
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