As Primaveras da Vida
Agora que estamos no meio
do Inverno brasileiro, percebemos quantas árvores estão desfolhadas, com
aparência de mortas, apresentando imagens tristes de figuras esqueléticas.
As
árvores, porém, irão renascer quando vier a Primavera, e se cobrirão de folhas
verdes e flores coloridas.
Nós
temos o costume de comparar a nossa vida com as estações do ano: Primavera
significando a infância até a juventude, Verão significando a formação completa
e o amadurecimento, Outono como um tempo de produção e de trabalho, e Inverno
como o ocaso da vida.
Sendo assim, é como se na Primavera da nossa
vida, o botão se formasse e florescesse, no Verão preparasse os frutos, no
Outono sazonasse os frutos e formasse sementes, para garantir o futuro da
espécie, e no Inverno se despojasse dos galhos e folhas secas, para recomeçar
tudo de novo.
Entretanto, não é assim. Isso só ocorre com as
árvores. As árvores de beira de estrada, no meio das pastagens, nos pomares,
nas matas, que ainda sobreviveram à ganância do homem, se transmudam conforme o
tempo vai passando: todas elas, independente de nossa vontade, sentem as
mudanças que o tempo impõe, ou seja, despindo-se totalmente, rebrotando com
folhas verdes, cobrindo-se de lindas e perfumadas flores, apresentando frutos e
sementes... e ... voltando ao novo ciclo.
Os animais e os humanos não procedem assim.
Quando o inverno chega é o fim da vida, e não há retorno. O ciclo não se
repete. E é uma pena. Para nós, diferentemente das árvores, a Primavera é só
uma vez, assim como o Verão, o Outono e o Inverno. Quem está no ocaso da vida,
não terá a Primavera de volta. Não há outra chance de rebrotar, de renascer, de
florescer, e de frutificar.
É certo que a nossa
Primavera tem longa duração: é a fase que vai do instante que, nascemos como
seres totalmente dependentes e incapazes, e descobrimos aos poucos a utilidade
das pernas, dos braços e do próprio corpo, até sermos capazes de nos conduzir
sozinhos.
O Verão já é o tempo da
adolescência, da formação, do amadurecimento, da aprendizagem para sobreviver.
O Outono é mais longo. É
o tempo de produção, de trabalho, de
cuidar da prole.
E o Inverno que, deveria
ser uma preparação para recomeçar o ciclo, para nós é apenas uma preparação
para encerrar o ciclo, para sempre.
Então, quando vejo
árvores secas e esqueléticas penso sempre em nós, seres humanos, que ao chegar
nessa fase só vai perdendo a vitalidade, até fechar o ciclo. E penso: Como
seria se a gente tivesse a oportunidade de repetir as primaveras, os verões e
os outonos?
É certo que os animais e
os humanos têm a capacidade de procriar várias vezes, de viver uma boa fase de
produção, mas a Primavera só dura uma vez, assim como as outras estações.
Que felicidade seria se,
ao chegar ao Outono da vida, a gente pudesse retornar à juventude! Sonho de
tantas gerações, que já provocou a busca incessante da fonte da juventude, que
nunca se concretizou.
Há árvores seculares, que
já viram tantas transformações ocorrerem ao seu redor, e continuam firmes,
presas ao chão, repetindo, repetindo as mudanças que o tempo impõe:
desfolhando-se, rebrotando em galhos e folhas verdíssimas, florindo e
alegrando os insetos e enfeitando o
lugar, frutificando para saciar a fome dos bichos e dos homens e novamente, se
descobrindo da cobertura verde.
Por outro lado, as
árvores podem até se cansar de existência tão interminável, como as existências
de seres que pensam no absurdo da vida. Essa questão foi profundamente
estudada, pelo moderno pensador francês Jean Paul Sartre (1905/1980).
Sartre levantou a questão
da existência inconsciente, em que os seres vivem por viver, sem nenhuma
consciência de seu próprio EU nesse mundo, sem nunca atinar com o significado
de viver. E propôs que, o pensar é que torna o homem consciente de sua
existência. Quem não pensa não tem consciência de seu existir. É como as
árvores que repetem os ciclos interminavelmente, por séculos e séculos. Ele
considerava a existência de uma árvore gratuita e absurda, sem lógica.
Esse sentimento doentio
sobre a Existência foi dissecado dolorosamente em A Náusea, em que o pensador
ateu coloca todo o pessimismo diante da vida, considerando-a absurda, sem
sentido.
Com ou sem razão, o certo
é que suas idéias agitaram os meios filosóficos e, provocaram mais
questionamentos sobre o significado da vida, em todo o mundo.
E sem querer, vendo as árvores
se vestindo deslumbrantemente outra vez de flores, vem à minha mente, o desejo
inconsciente de querer retornar à Primavera.
O que não deixa de ser um
desejo absurdo, para quem já chegou à última estação.
Mirandópolis, 10 de
agosto de 2012.
kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”
É Kimie, seu relato das estações é impressionante e lemos e caem-se a realidade da vida, ficamos triste, mas é o vertedouro da existência humana, sempre lembro desta frase "Só Deus é Eterno".Efim perecemos e nada impede a esse destino trágico que nos acometemos. Por enquanto vamos viver, vivendo.
ResponderExcluirVocê também não queria a Primavera de volta, pelo menos uma vez mais? Quando chegamos à maturidade, sabemos que com sorte, teremos a oportunidade de viver o Inverno, antes de partir definitivamente. E por mais que você esteja consciente disso, não lhe dá um frio na barriga? O que será que existe daquele lado? E para onde vai a nossa alma, hein, Dinho?
ResponderExcluirKimie Oku, ninguém até hoje veio até nós disser o outro lado da vida, aprendemos coisas belas, jardins suspensos, acho que tudo isso é para nós encorajar e preparar nossas mentes para um bom fim devemos acreditar nisso para que nós possamos viver em plenitude sem medo. Mas essa discussão nunca chegará a um fim, vai ser eterna e por isso a vida também é eterna. Vamos viver sempre a primavera e esperar o inverno chegar.
ExcluirBela crônica Kimie. O paralelo que voce traça entre o ciclo de vida da natureza marcado pelas estações do ano e o sentido da vida dos humanos que a habitam nos levam a refletir em tempos de meio ambiente o quanto de responsabilidade temos com a natureza. Ela por sí só faz a sua parte e nós humanos com toda a inteligência somos os curadores dessa natureza. Se não for assim, como teremos mais primaveras?
ResponderExcluirAbçs,
Lupércio Ailton
É, Lupércio, como teremos mais Primaveras? No sentido lato da palavra, Primavera significando a florescência das árvores e Primaveras nossas de sobrevivência neste planeta,né? Fico tão feliz quando pessoas como você pegam a essência do que estou tentando passar... Um abraço
ResponderExcluir