Gente de
fibra -
Mitsuko e Masaji Tanaka
De
vez em quando, não resisto à tentação de contar a história de certos cidadãos
nossos. São histórias de gente que batalhou duramente e construiu a cidade,
enquanto pelejava para cuidar da família.
Hoje quero contar a história de
um casal de idosos, que mora na minha rua e leva a vida numa boa, após anos de
trabalho no comércio e apesar da idade avançada.
É a história
da senhora Mitsuko Ijichi Tanaka que nasceu em 1925 em Satsuma Gun, na
Província de Kagoshima, Japão.
Dona
Mitsuko nasceu em tradicional família, ou shizoku, cujo avô fora engenheiro e o
pai era carpinteiro. Na escala social japonesa da época, havia a Nobreza ou
Kizoku, que abrangia os membros da Casa Imperial, parentes e agregados; havia o
Gouzoku, que detinha a riqueza e o poder e participava do governo do país;
havia o Shizoku, que eram os profissionais de categoria mais elevada e formavam
clãs, que mantinham a tradição. Depois vinha a plebe, que eram os operários,
lavradores e gente de menos recursos e estudos.
Como
se pode constatar, dona Mitsuko nascera em família privilegiada e tinha
perspectivas de um futuro tranquilo e feliz. Conseguiu estudar parte do Curso
Primário, aprendendo um pouco do difícil e complicado alfabeto japonês. Teve
uma infância feliz na terra natal.
Entretanto,
naqueles tempos dos anos 30/40, o Japão atravessava uma época de muita fome em
razão das guerras, e não havia esperanças de um futuro promissor. Então, toda a
família acabou se emigrando para o Brasil em 1935. Dona Mitsuko era uma menina
de apenas onze anos de idade.
Após
a longa viagem de navio, que levava mais de um mês para atravessar o oceano,
chegaram ao Brasil, e foram parar em Lussanvira, que hoje conhecemos como
Pereira Barreto. A família Ijichi que era composta de pais e irmãos, dos quais
conhecemos o Takaomi e o senhor Takatomo, pai do Riyuichi veio se instalar no
Bairro União, onde plantou arroz e algodão. Após um ano, comprou vinte
alqueires de mata virgem, que tiveram que derrubar para iniciar a plantação. A
derrubada da mata era uma coisa terrível, pois as árvores eram imensas e era
necessário queimá-las, antes de pô-las abaixo.
No
local havia outros imigrantes japoneses, que acabaram formando uma colônia,
para se unirem e se ajudarem, pois tudo era difícil, a começar pela língua
estranha dos brasileiros, que dificultava a comunicação. E também no meio da
mata, havia falta de tudo a que estavam acostumados no Japão, onde levaram uma
vida até mais confortável. As adversidades eram muitas, mas com a ajuda dos
patrícios, conseguiram vencer. Dona Mitsuko trabalhou muito nesse lugar
juntamente com a família, plantando e colhendo arroz, algodão e milho. E ela me contou um fato curioso: Sua família morava no
Bairro Nova Inhuma e, do outro lado do córrego no Bairro Inhuma, morava a
família de minha mãe Torá Tsutsumi, de quem foi amiga desde menina e continuou
até ela partir para sempre, há nove anos. E conforme informação de dona Mitsuko, meus avós Tsutsumi fabricavam nessa época o açúcar preto, tirado da
calda de cana e o vendia. E todos os vizinhos iam comprá-lo, assim como
a família dela. E a dona Mitsuko foi diversas vezes à casa de meus avós, para
comprar esse açúcar. Naqueles tempos difíceis, o açúcar era um produto valioso
para todos do lugar.
Aos
vinte e três anos de idade, dona Mitsuko se casou com o senhor Masaji Tanaka,
que nascera em Ookowa Gun, Provincia de Kagawa, Japão em 1923. Seus pais eram
lavradores.
Ao se
casar, dona Mitsuko foi morar em Bela Floresta, perto de Itapura. Lá trabalhou
muito nas roças de algodão. Nesse local, pelejaram por sete anos na lavoura.
E aí
se mudaram para Mirandópolis, trazendo os sogros e dois filhos que lá haviam
nascido.
Naqueles tempos, o irmão da dona
Mitsuko, o seu Takatomo possuia um Bar lá onde está a primeira loja do Nilton
Supermercados. Vieram de mudança e se acomodaram na casa desse irmão, ficando
aí por uns três meses. Quando souberam
que a Casa Hombo estava à venda, o senhor Masaji e e senhor Takatomo
compraram-na em sociedade. Era um grande Bazar muito frequentado pela
população, porque havia poucas lojas na cidade. A Casa Hombo recebeu o nome de
Casa Tietê, em homenagem ao grande rio que os donos conheceram em Pereira
Barreto. Para comprar as mercadorias que
seriam revendidas, os irmãos Mitsuko, seu Takaomi que era um jovem e o seu
Takatomo viajavam periodicamente a São Paulo, e abasteciam a loja.
O sucesso foi grande e acabaram
adquirindo outra loja, que se destinaria ao casal Tanaka. Era o Bazar Tietê, na
esquina da Rafael Pereira com a Rua Dr. Edgar Raimundo da Costa. Mais tarde,
seu Takatomo compraria a Ótica Tietê para o irmão Takaomi, que havia feito um
Curso de Ótica. E assim, as três famílias acharam o seu caminho e o meio de
sustento.
Dona Mitsuko e o seu Masaji
pelejaram por mais de cinquenta anos no Bazar, atendendo a população. Vendiam
brinquedos, armarinhos, lãs, linhas, botões, agulhas e tudo que as donas de
casa e costureiras necessitavam na época. Eles moravam no fundo da loja e os filhos
ajudavam no atendimento ao público, mesmo quando voltavam de férias das
Faculdades que cursavam fora. Na época de Finados, Dona MItsuko
fazia coroas de flores de plástico para servir a comunidade nas peregrinações
ao cemitério. Quem fazia os arcos de
bambu era o senhor Masaji...
Dona
Mitsuko lembra com saudades desse tempo, em que conhecia toda a clientela. O
comércio era seguro e tranquilo, não havia necessidade de vender a prazo ou
fiado. Todos que compravam, pagavam na hora. Com o decorrer do tempo, seu filho
mais velho começou a fazer as compras em São Paulo, mesmo porque ela tinha que
atender na loja e cuidar dos demais filhos
O
casal teve sete filhos, que foram deixando a cidade para estudar. E a renda do
Bazar deu para manter todos os sete filhos, nas Faculdades que cursaram. Esse é
o maior orgulho de dona Mitsuko e seu Masaji.
Assim,
o Takashi se formou Engenheiro pela Faculdade de Engenharia de Barretos, o Hiroshi
se tornou Médico-oftalmologista pela Santa Casa de São Paulo, o Minoru seria
Engenheiro pela Faculdade de Engenharia de Bauru, o Tadashi Engenheiro pela Engenharia Federal de
Itajubá, a Sachiko seria Odontologista pela Universidade de Mogi das Cruzes, a
Eiko e o Shigueru seriam Odontólogos
pela Faculdade Franciscana de Bragança Paulista.
Como
se pode concluir, apenas o Tadashi conseguiu se formar em Faculdade Pública
Federal. Os demais estudaram em escolas particulares, que oneraram muito os
pais. Mesmo assim, todos conseguiram concluir os estudos e puderam se dedicar a
profissões de sua escolha. Para o casal Mitsuko e Masaji foi um tempo duro de
economia, pois as Faculdades e as pensões consumiam toda a renda do Bazar.
Durante anos e anos, tudo era destinado aos estudos dos filhos. Mas, os pais
cumpriram a sua parte, pois o estudo e o encaminhamento dos filhos era
prioridade. Nunca tiveram férias, nem luxo, nem vida mansa, era só trabalho e
mais trabalho por décadas seguidas...
Além disso,
hoje eles são cuidados pelos filhos que, periodicamente voltam ao lar paterno
para dar-lhes assistência e carinho. Nessa tarefa, os filhos fazem um revezamento
com o filho Hiroshi, que mora na cidade. E levam esses pais já velhinhos para
comer fora, para passear e curtir estância de águas. Os filhos são todos
casados e a família foi acrescida de sete netos.
E o
mais interessante é que os dois já com 89 e 91 anos são pessoas alegres, de bem
com a vida, felizes por terem chegado até aqui. Conversar com eles é ter uma
lição de otimismo.
Dona
Mitsuko e seu Masaji Tanaka por tudo que batalharam, por tudo que venceram e
pela vida longa de amor aos filhos e netos, é sem dúvida alguma Gente de Fibra!
Legenda:
foto 1. dona Mitsuko e Masaji Tanaka
foto 2. família Ijichi em Lussanvira
foto 3. Casa Tietê, antiga Casa Hombo, na Rafael Pereira
foto 4. dona Mitsuko no interior do Bazar Tietê
foto 5. com filhos e cunhada no Restaurante do Lió
foto 1. dona Mitsuko e Masaji Tanaka
foto 2. família Ijichi em Lussanvira
foto 3. Casa Tietê, antiga Casa Hombo, na Rafael Pereira
foto 4. dona Mitsuko no interior do Bazar Tietê
foto 5. com filhos e cunhada no Restaurante do Lió
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