Presente do João
Quando se aposenta, qualquer
cidadão passa por uma situação de insegurança e desconforto, por ter saído do
ninho. Ou ter sido jogado fora como um pássaro sem saúde, sem condições de
sobrevivência...
Mesmo que a aposentadoria seja o sonho dourado de uma vida toda
de trabalho, quando ela chega causa um choque, que balança toda a estrutura da
pessoa. A rotina que era tão certinha e organizada perde sentido, e os dias ficam
longos e vazios. Não há mais obrigação de acordar cedo, de ligar o despertador,
de correr para cumprir agenda, porque há tempo de sobra...
Tomar o café da manhã demorado para esticar a hora, por não ter o
que fazer depois... Ler os jornais nos mínimos detalhes, coisa que nunca havia
feito antes... É preciso administrar as horas do dia, para preenchê-las...
Os primeiros dias do aposentado podem ser alegres, pela
libertação da rotina de obrigações... Mas, devagarinho vai ficando sem graça e
sem sentido, porque o tempo vai sobrando e não há como usá-lo de forma produtiva
e agradável.
Tive uma amiga que se queixava sempre que a Escola havia lhe
esquecido... Que ninguém a convidava para participar dos eventos da Escola,
onde havia dado o seu sangue como Professora... Ela se revoltava com o
esquecimento...
Entretanto, acho que não é a Escola que deverá carregar a
aposentadoria de seus funcionários... Cada aposentado deve se inserir no meio
em que irá viver a partir de então, e programar sua vida para que ela flua de
forma serena, organizada, útil e sobretudo ocupada. Porque o vazio dos dias
acabará matando a pessoa de tristeza.
E a Escola ou outra sede de trabalho não poderá carregar os
aposentados pela vida afora, porque os problemas de cada dia requerem soluções
imediatas de quem está na ativa. Os aposentados seriam um estorvo... Que já
deram o que tinham que dar e, devem ceder o lugar para os novos, os jovens... Ninguém é insubstituível, a não ser as pessoas
que amamos, como diz o nosso querido Dr. Roberto Yuassa. Mas, tem gente que se
acha competente demais, e não larga o osso. Reconhecer sua limitação e a
capacidade de outros é sinal de sabedoria. Aposentar-se e partir é a lei
natural da vida. Deixar que os novos assumam.
Depois de um certo tempo de aposentado, o cidadão vai se
acomodando e se organizando para viver o resto de seus dias, sem a ocupação que
fora a razão de sua vida. Alguns, movidos ainda pela capacidade e talvez
necessidade financeira, passam a exercer outras atividades e, acabam se
dedicando de corpo e alma ao novo trabalho. (E muitas vezes, atrapalhando os
jovens ávidos de trabalho). Outros, já cansados de tanto trabalho e estressados
pela função exercida ao longo da vida, procuram se ocupar em atividades leves e
recreativas como pescaria, futebol, jogos de truco e caxeta. As mulheres passam
a colaborar nas Instituições da cidade, fazendo doces, artesanatos, ginástica e
formando grupos de amigas...
Mas, uma coisa é certa. Todos sem exceção acabam se isolando de
uma forma ou outra. Alguns ainda conservam a amizade e o contato de algum colega
de trabalho, com quem irá conviver para sempre. Esses ficam em zona de
conforto, porque não perderam o vínculo com o passado.
A maioria porém, parece que se muda para outro planeta. Vai se
isolando e confinando no seu mundinho, onde parece não caber mais amigos...
Embora a estima e a consideração continuem vivas. E a vida desses aposentados
vai ficando triste, solitária, porque cada vez mais a solidão vai envolvendo-o,
e o esquecimento acaba chegando. É como se fossem estranhos no ninho, que não
querem mais voltar ao ninho antigo, porque lá não tem mais lugar para eles.
Então, a vida desses aposentados é recheada de saudades, de
lembranças guardadas a sete chaves no coração. E a vida vai fluindo assim
triste, isolada, esquecida.
E eis que de repente, uma pessoa querida acaba falecendo. Todos
os ex-colegas levam um choque e devagarinho, vão chegando para lhe prestar a
última homenagem.
E aí acontece o Reencontro.
E foi o que ocorreu com o funeral de João Mikio.
Chegaram, se abraçaram e lamentaram o momento. Momento triste de
perda do amigo querido. E vieram todos os que moram na cidade e na redondeza,
porque ele era uma pessoa muito querida.
E mataram as saudades dos longos anos de separação, conversando
e trocando informações sobre famílias e sobre colegas, que partiram para outros
locais. E outros que partiram para sempre... Embora o momento fosse de imensa
tristeza, havia uma alegria contida no reencontro, no abraço, no olhar, no
sorriso de carinho... Era como se tivessem recuperado o tempo perdido e voltado
à Agência, onde pelejaram lado a lado por longos anos.
Esse foi o belo presente do João Mikio, que saiu desta vida em
grande estilo e foi festar lá no céu.
Obrigada João, por ter proporcionado esse reencontro. Todos com
certeza, serão gratos para sempre.
Mirandópolis, maio de 2015.
kimie oku in
As palavras às vezes chegam aos outros em forma de consolo. Muito bom ler você.
ResponderExcluirObrigada, Regina!
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