CARRAPICHO
Antigamente quando morávamos no sítio, era comum a gente ficar
toda espinhada com carrapichos, que cresciam à beira dos caminhos.
O carrapicho é uma
erva daninha difícil de combater. Para
erradicá-la, é necessário arrancar ou capinar, antes que dê frutos, ou que
desenvolva as bolinhas cheias de espinhos, ou garras nas pontas, que grudam na
roupa das pessoas e nos animais.
Na verdade, esse
processo de “grudar” é o recurso
inteligente que, a planta desenvolveu para disseminar a espécie. Os animais e pessoas que transportam esses frutos, em seus pelos ou
roupas, acabam levando as sementes para outros lugares, onde cairão e se
desenvolverão. E a espécie garante a sua sobrevivência. Os animais e pessoas
assim usados, se transformam em disseminadores involuntários da espécie.
Há muitas outras ervas que se utilizam desse
recurso, tais como o picão preto e o
amor do campo, cujas sementes achatadas grudam em carreira na roupa, e no pelo
dos bichos. É muito difícil se livrar
delas. Possuem pequenas garras que “colam” nas roupas, como carrapatos.
Ora, o propósito dessa minha crônica é denunciar que não é mais preciso ir para o
campo, para os sítios e chácaras para “pegar carrapicho”. O carrapicho está logo ali, grudando nas
roupas de todos os passantes da esquina, onde cresce também picão e tantas outras ervas daninhas.
A calçada está toda
tomada de mato, que ficou impossível gente transitar por lá. O pedestre tem que
apelar para a rua. Mas como é uma esquina movimentada, ele corre o risco de ser
colhido por um carro ou moto, que surge repentinamente, virando a rua. Ali, cresce toda variedade de ervas daninhas, que
daria até para fazer um estudo sobre elas. E estão todas com frutos maduros
grudentos, que logo, logo essas daninhas se multiplicarão pela cidade, transformando-a numa quiçaça.
Além disso, há ainda na mesma calçada, dois
esqueletos de árvores, que lutaram bravamente para não morrer. É impressionante
ver esses cadáveres de árvores: estão
secos e descascados, e no alto há uns galhos finos que brotaram à revelia, como pedindo clemência para não deixá-las
morrer. A impressão que passam é que esses galhos eram as mãos das pobres,
implorando vida. Mas, ninguém as
atendeu...
É comovente vê-las.
Mas, não só de mato está cheia a esquina. As
ervas daninhas, que incomodam demais os transeuntes, servem de moldura para uma
velha casa abandonada.
A casa está morrendo, esquecida lá no seu canto. No mesmo canto, onde morou
uma gentil senhora, que deve ter deixado tantas lembranças da vida vivida ali,
com os seus. Que deve ter sonhado lindos sonhos, que deve ter amado aquela
esquina que era o seu domínio, o seu ponto de referência no mundo. Aquelas
paredes devem guardar os suspiros e os
anseios de todos que ali viveram, correram, cantaram, choraram, e partiram para
não mais voltar.
Já percebi que, as casas se mantêm
firmes sobre os alicerces, enquanto há
gente morando nelas. Deve haver uma relação intangível entre a matéria casa e a vida do ser humano.
Parece até que, a vitalidade humana dos
moradores é que sustém a casa de pé. Quando é esvaziada de seus habitantes, a
casa vai morrendo, pouco a pouco, para
se transformar em escombros.... Já vi isso acontecer outras vezes.
Acho terrível ver uma casa, que já foi tão
forte, bonita e feliz, quando crianças corriam pelos aposentos, que abrigou tanta gente das chuvas e dos temporais, que teve a
varanda ocupada pelo casal de idosos, curtindo os derradeiros anos de sua vida,
ser assim abandonada, como um chinelo
velho.
A paisagem é deprimente. E é deprimente para
quem mora por perto e, para quem passa por ali sempre. É deprimente para a
cidade, porque dá um ar de desleixo, de
descaso, como se ninguém se importasse com essas coisas.
Não sei a razão de se abandonar uma casa assim,
mas acho que deve haver uma solução, se alguém se empenhasse.
Enquanto isso não ocorre, há que se
providenciar a limpeza da calçada para
que os transeuntes não sejam “atacados” por picão, carrapichos e outros
espinhos ferozes.
Além dos móveis e eletrodomésticos, com
que os comerciantes de nossa pequena
cidade costumam atravancar a passarela dos pedestres, agora a moda é quiçaça.
E quiçaça das brabas!
Carrapicho para os pedestres!
Ninguém merece!
Mirandópolis, 16 de fevereiro de 2012.
kimie oku (kimieoku@hotmail.com)
Quando publiquei essa crônica no Jornal Diário, alguém que não se identificou ligou via telefone e me xingou com todos os nomes de que foi capaz. Acho que era alguém da família, um homem. Por sinal muito grosseiro e sem um mínimo de sensibilidade. E não me deixou dizer uma palavra. Daí, desliguei antes que ele continuasse a me ofender.
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