terça-feira, 3 de janeiro de 2012


OVERDOSE

        Na crônica Civilização em mutação, relatei as mudanças das condições de vida, que a minha geração experienciou nos últimos 50 anos. 
E lamentei que, os jovens de hoje não conheceram e, nem vivenciaram tudo 
que passamos.
       Pensando bem, porém, eles têm muito que viver.  As mudanças estão ocorrendo tão 
vertiginosamente, 
que não há tempo para escolher.
       Em primeiro lugar, a permissividade e a moral frouxa liberou os costumes.
 A relação familiar entrou em decadência. 
Há um desrespeito total entre pais e filhos, 
e a agressão física e moral já 
faz parte do cotidiano,
de muitos lares.
       A completa negligência, a indiferença 
e a violência doméstica estão destruindo
 o esteio da sociedade, a família.
       Os japoneses costumam dizer 
que a hora da refeição é sagrada – 
todos unidos em volta de uma mesa, 
consumindo a mesma comida, 
e se comunicando, fortalece mais e mais
 os laços de família . 
Qualquer refeição, por mais simples que seja 
tem um sabor diferente, 
quando  é degustada com mais pessoas, 
mais ainda se forem íntimas. 
Hoje, isso é coisa do passado. 
As pessoas comem por turnos,
 e isso está acabando com a 
comunicação familiar.
       A refeição não é saboreada, é engolida.
 E esse consumo desorganizado e desenfreado está criando bonecos gigantes, 
com dificuldades para respirar
 e se locomover.
       Em conseqüência,
 os  problemas de saúde estão vitimando gente cada vez mais jovem.
 É lastimável que moços de trinta, 
quarenta anos, com tanto tempo ainda para viver são pegos e, levados para sempre,
 por infartos e acidentes vasculares.
       Além disso, os jovens de hoje têm que conviver com  a velocidade. 
A Fórmula 1,  a Fórmula Indi  e outras lhes ensinaram que, têm que ser ousados, 
corajosos e atrevidos até a morte. 
“O piloto morreu a 300 km/hora?”  “Morreu, mas deixou uma marca!”.....
essa aceitação tácita e indiferente não espanta
mais ninguém.
       E a bebida?
       O álcool substituiu a água.
       Sextas e Sábados viraram dias reservados para a bebedeira e comilança. 
Tudo em excesso. Excesso que se reflete na relação familiar, em ausências prolongadas, 
em conflitos com as caras metades, 
com os filhos... 
irresponsabilidade total...
       Quer mais? Pois há  mais, 
e pior que tudo isso.
 É a busca incessante de novas sensações. 
A busca do prazer inaudito, 
da emoção nunca experimentada...
 e o caminho que se abre é o 
das substâncias químicas,
 cujo consumo altera o comportamento psicoativo 
dos usuários. 
E estes, frágeis criaturas humanas,
 as consomem para experimentar novas sensações e, acabam  se tornando
 dependentes químicos.
 E aí  estarão perdidos para sempre.
       As substâncias químicas provocam 
sensações diferentes, de verdade. 
As pessoas ficam diferentes, 
porque perdem  o controle da vontade própria, 
o controle da vida. 
E daí para se inocularem a maldição da Aids, 
é só um passo.
       E tudo isso por quê?
       Falta de parcimônia. 
Não há mais controle de nada.
 O homem desembestou em exceder-se,
 cada vez mais.
       Correr para superar marcas, 
consumir até morrer,
drogar-se para chegar ao paraíso....
 essa é a verdadeira  imagem do homem de hoje, 
que quer experimentar de tudo, 
até o extremo.
       É tudo em dose exagerada.
Ninguém vive de overdose.
       Overdose mata.

                     Mirandópolis,  outubro de 2010.
                        kimie oku (kimieoku@hotmail.com)
       

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