Tiau, Baká!
Era uma ponta de
rua.
Sem asfalto, com
serviço precário de iluminação, água e esgoto.
Logo adiante
terminava a cidade.
Havia a venda do sr.
Bonadio, a Colchoaria do seu Domingos e a Ferraria do sr. Yomassa. O resto era
só casas de moradia.
Morávamos na
travessa Júlio Prestes. Havia umas cinco, seis famílias. Gente simples,
pelejando para sobreviver.
Na rua de terra sem
calçada, o sol era presença constante.
Às vezes, passava
uma carroça vendendo verduras. Às vezes, passava um caminhão levantando poeira.
De manhã à tarde se ouvia a voz de dona Maria
“- Sírvia ! Sirvia
!"
Sílvia era a filha
adolescente, magrinha, alta, tão cheia de vida, que não parava quieta. Desde
que despertava, ela percorria o trecho falando com os vizinhos, para saber das
novidades, e aprontar algumas com as amigas.
Sentava-se no chão
mesmo e conversava com todo mundo, rindo e falando alto.
Quando via alguém de
minha família, ia logo gritando:
"-Ó baká!"
Baká é uma
abreviatura da palavra bakayarô, ou bakatarê, que em japonês significa
bobo/boba.
Foi a única
expressão que aprendeu em nosso convívio, e que ela usava como um troféu, para
lançar a mim e a meus irmãos, onde quer que nos encontrasse.
Mesmo depois de
adulta, ela sempre nos tratou assim, com carinho. Do outro lado da rua ao nos
ver, ela lançava "- Ó baká!" E era só risada.
Na verdade, nós a
designávamos de Repórter Esso, porque ela sabia de tudo.
Repórter Esso era o
noticiário mais famoso de rádio da época.
Televisão nem
existia.
Ela não se importava
de ser assim chamada. Só dobrava o corpo para frente no meio da rua, e dava
sonoras gargalhadas.
Até hoje, ouço essa risada
feliz.
Para mim, ela era a
personificação da boneca Emília do Sítio do Pica-Pau Amarelo, de Monteiro
Lobato.
Era bonita, sem
nenhuma vaidade, alegre, barulhenta, curiosa. Cheia de vida, tal qual a boneca.
Era a alegria da
rua.
Sílvia, você foi um
belo raio de sol luminoso e incandescente, que irradiou alegria para todos os
lados.
E plagiando você
mesma despeço-me com saudade:
"-Tiau, baká
!"
Mirandópolis,
janeiro de 2011.
kimie oku
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