Há uma semana, de repente, reencontrei um amigo que conheci cinco décadas atrás.
Era tão jovem, quase menino, cheio de vontade de viver, contente de estar no mundo.
Naquela época, os revezes da vida já o tinham ferido. Mesmo assim, ele lutava bravamente, ajudando o pai para sustentar a família.
Nesses quase cinquenta anos, cada um de nós e nossos amigos de então, tomamos rumos diferentes, cuidando cada qual da própria vida.
E súbito, a trombada.
Não o reconheci de imediato.
Cabelos brancos como algodão, e uma visão mais fraca, mostraram-me a figura de um senhor... Mas quando sorriu... Era o mesmo jovem que, corria atrás das tarefas, com um entusiasmo raro.
Que bênção é um encontro desses! Trocar notícias. Falar das famílias. Dos amigos da época. Destinos dos filhos. Aposentadoria. Vontade imensa de ficar o dia todo, trocando figurinhas...
Mas, é preciso retomar a vida e cumprir destinos.
Fiquei pensando no feliz acaso, que nos colocou frente a frente, assim sem mais nem menos.
E pensei em tantos amigos, que cruzaram o meu caminho, e que nunca mais tive notícias.
Como num caleidoscópio, as imagens vieram à memória. E numa velocidade incrível, as imagens se sobrepunham umas nas outras. Misturadas com pessoas queridíssimas, que não mais estão aqui.
E senti saudades.
Saudades da infância tão distante. Da mocidade cheia de ilusões. Do trabalho, da correria de todo dia, da Faculdade, dos colegas, de chefes, de reuniões tão chatas, das greves...
Por nostalgia, as imagens passadas são sempre douradas, os dias luminosos e as lembranças tão nítidas.
Estava eu a curtir essas e outras saudades, quando uma amiga do Japão veio me ver.
Que alegria rever a menina que partiu tão garota!
E hoje se apresenta uma mulher. Bonita, forte, determinada.
Não é mais a jovem cheia de sonhos. Pé na realidade. Conheceu o mundo. China. Estados Unidos. Japão. Canadá. Coréia. Viu o que acontece nos bastidores dos países avançados. Viu a terra tremer, o povo chorar e endurecer. E endureceu também.
E ficou rija. Olhar desconfiado diante da vida. Pensamentos e conclusões frias da realidade global.
O que fizeram com a doce menina?
Para onde foram seus sonhos, sua inocência, suas ilusões?
Percebi então que, o mundo mudou.
Aquelas imagens douradas dos anos 60 só existem na minha memória. São apenas doces lembranças.
E percebi que, a minha geração foi muito feliz, por ter experienciado a mudança, a transformação de um país pobrezinho, caindo pelas tabelas, numa terra forte e poderosa como é hoje.
Só quem sofreu as agruras daqueles anos duros, sabe realmente dar valor à vida de hoje.
Que lembranças douradas terão as gerações de hoje, quando chegarem ao limiar de suas vidas?
Mirandópolis, 23 de agosto de 2011.
kimie oku
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