domingo, 28 de março de 2021

 

                                               Velórios e Funerais

    Não sei quem estabeleceu que é preciso esperar 24 horas para enterrar o corpo de uma pessoa que morreu. Deve ter sido um médico. Eu me lembro que umas décadas atrás, o médico marcava até a hora extrema para o enterro, no atestado de óbito...

     E ao longo da História, a humanidade cumpriu o rito do enterro após 24 horas ou mais, conforme as condições de preservação do morto.

     E de repente, sem mais nem menos, um vírus mortal mudou tudo! De 2020 até agora, os velórios foram proibidos e os funerais são feitos rapidamente, como se as famílias estivessem cometendo algo ilícito.

     O que é um velório?

    E o derradeiro momento de se despedir de alguém que marcou nossas vidas. Muita gente ia a um velório só para marcar presença e assinar a lista de comparecimento. Eu, não! Só compareci a funerais, tirando uma hora do meu dia a dia para homenagear aquele que partiu e, fazer as orações para uma viagem de paz para a eternidade.

   Como eram os velórios? Longos, cansativos e muitas vezes adentravam pelas madrugadas, deixando os familiares esgotados. Familiares que passaram o dia sem se alimentar e estavam enfraquecidos e tristes...   Por outro lado, durante o dia, era um desfilar de gente de todas as categorias que chegavam para lamentar a perda. Muitos amigos que não se viam há décadas se abraçando e matando saudades... No geral, eram horas longas que não passavam, com os familiares sem jeito diante do absurdo das perguntas sem sentido, como morreu, o que aconteceu, por quê morreu... Tudo isso nem importava mais. Morreu e pronto. Pra quê cutucar a ferida? E as rodinhas que se formavam falando de campeonatos, de gols, de juízes, de pênaltis... Era uma festa!

     Então, tudo isso acabou.

     Será que foi melhor? Pior?

     A família que perde um ente querido fica destroçada pela inesperada visita da morte. E precisa de um ombro amigo, de um abraço carinhoso, de umas palavras sinceras para amenizar a sua dor. Não precisa de discursos, de um desfile de gente que nem conhece. Não é a multidão que importa, mas o conforto de perceber a empatia dos amigos. Gente que chora as mesmas lágrimas.

     Mas, os velórios longos não têm sentido.

Muitas vezes, a família já vinha velando aquele que partiu, por um longo tempo, tentando salvá-lo ou pelo menos amenizar seu sofrimento. Todos esgotados, no limite de suas forças... E ainda mais vinte e quatro horas de velório... Dureza.

Então, não velar parece mais tranquilo e lógico.

Mas é tão frio, tão impessoal.

Uma amiga enterrou alguém com a presença de meia dúzia de familiares. E ela me contou isso com muita tristeza. Ficou em mim a impressão que, a sociedade não se importou com a passagem desse homem. Homem que labutara a vida toda para tornar melhor a vida de todos...

Mas, agora é assim que tem que ser.

Sem velórios, sem abraços, sem choro.

Um funeral rápido, sem pompa e sem honras.

Afinal, somos apenas umas formiguinhas indefesas, desfilando pelas campinas verdes, sonhando com o Paraíso...

As campinas verdes estão todas intoxicadas.

Mirandópolis, março de 2021.

kimie oku in

http://cronicasdekimie.blogspot.com