quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013




                Novamente a Ciranda

            Como fazemos todos os meses, aconteceu mais um Encontro da Ciranda. Foi na sexta-feira, dia 22 deste, a partir das 14 horas, na Chácara do seu Albertino. Quando lá cheguei, já estavam presentes a Jane e sua mãe  Fermina, e a dona Lúcia Valverde e sua cunhada, dona Júlia.
         Enquanto cumprimentava as amigas, foram chegando outros cirandeiros: Joaquim com a dona Adelina e as amigas Onofra e dona Yolanda. E assim os demais foram chegando. Todos numa alegria só.
         Como havia chovido na véspera, o ar estava fresco e agradável, e a tarde estava luminosa.
         Conforme iam chegando, formavam-se rodinhas para conversar. Aí a Flora e a Jane serviram uns salgadinhos e fatias de bolo, seguido de refrigerante e suco de acerola, que o Dedé e a Isabel não deixam de levar.
         Depois de muita conversa, começou a cantoria acompanhada do som de pandeiro e sanfona, que animou a festa, como sempre. A maioria cantava, uns dançavam e outros só saracoteavam no meio da roda.
         Quando estavam cansados de cantar, a Kimie comentou sobre um triste acontecimento que ocorrera na cidade: o fechamento da Casa de Saúde e Maternidade São José, que após 59 anos servindo a comunidade, foi forçada a encerrar suas atividades. A consternação foi geral, porque todos os presentes já haviam utilizado os serviços daquele hospital.
         Foram levantadas hipóteses para formar parcerias e resgatar a Casa, e alguns cirandeiros se prontificaram em discutir o assunto com as lideranças da cidade.
Esperemos que surja alguma luz no túnel...
Aí, o pessoal comeu mais lanche e voltou a cantar para espantar a tristeza da notícia.
 E assim, a tarde chegou ao fim com todo pessoal feliz por ter passado umas horas de lazer. E ter espantado a solidão de viver sozinho.

Mirandópolis, fevereiro de 2013.
kimie oku in cronicasdekimie.blogspot.com



terça-feira, 26 de fevereiro de 2013


    
 Réquiem para uma Casa de Saúde



Há 46 anos, num dia quente de verão nasceu meu primogênito na Casa de Saúde e Maternidade São José. O médico seria o Dr. Francisco Theotônio Pardo, mas na sua ausência, fui assistida pelo Dr. Jenner Vieira dos Santos. E fui muito bem assistida.  E o meu filho está por aí pelejando, já nos seus 45 anos de vida.
Dois anos depois, viria a filha, pelas mãos de Dr. Pardo. Este era uma espécie de “Pai de todos”, sempre gentil e bondoso, atendendo com a mesma simplicidade, sem nenhuma discriminação. Inspirava segurança e confiança. Era um homem bonito, bom e cheiroso.
Já quando tive o terceiro filho, precisei recorrer à Santa Casa de Araçatuba, porque era uma gravidez de risco, pela minha idade e por ser portadora de hipertensão arterial.
Entretanto, por dezenas de vezes, precisei dos serviços de profissionais dessa Casa e sempre fui muito bem atendida.
É verdade que o Convênio-Saúde que eu utilizava era bom, e cobria todos os procedimentos, que se faziam necessários. E os médicos estavam satisfeitos, com os retornos desse Convênio. Mas, de uns anos pra cá, as Empresas de Seguro-Saúde começaram a restringir os pagamentos e as coberturas, visando um lucro maior e, os clientes e médicos passaram a ter perdas.
Acredito que, esse fato deve ter afetado seriamente as finanças dos médicos e hospitais, pois muitos dos profissionais dispensaram os acordos com essa e outras Seguradoras.
O ser humano precisa amiúde dos serviços médicos ao nascer e, durante o seu desenvolvimento. Depois, quando atinge a plenitude, passa uma fase sem precisar desses serviços. Isso só volta a ocorrer, quando o cidadão já está na terceira ou quarta idade. É a fase em que começam a aparecer as dores, quais sejam, dores nas pernas, nos joelhos, na coluna vertebral, nos ombros, e por aí vai.
E naturalmente, a gente volta a procurar médicos, clínicas e hospitais. Ninguém aceita viver com dor. E foi o que me ocorreu. Voltei à antiga Casa de Saúde para resolver uns problemas de dor, reflexos de sete décadas de existência.

E aí descobri que, a Casa de Saúde estava encerrando suas  atividades. Fiquei estarrecida. Não sabia o que estava ocorrendo, e não cabia na minha cabeça que aquela famosa Casa/Hospital  deixaria de servir à Comunidade.
Tirei a foto do aviso que estava afixado à porta e publiquei no face book, para levar ao conhecimento de amigos. Todos tiveram reações semelhantes à minha.
E agora, estamos travados e impotentes, diante da realidade que se consumou. A Maternidade cerrou suas portas e a vida vai continuando... Entretanto...
Como será daqui prá frente, com os profissionais sem um local para atender seus clientes? Onde irão realizar os procedimentos cirúrgicos, como necessárias intervenções?  E agora, onde serão feitos os serviços de parto?
Tá certo, eles têm suas clínicas, mas nas clínicas não dispõem de sala própria para as cirurgias. Parto será em domicílios??????......
Por outro lado, temos um grande Hospital do Estado,  graças a Deus. Que isso é uma bênção, que só existe em nossa cidade. Mas, o Hospital por ser Regional, atende a pacientes de toda a redondeza, e está sempre superlotado. Não tem como absorver a mais essa parcela, que recorria à Maternidade.
De acordo com o depoimento da Doutora Marcela Orsi Francisco, há quatro anos que o nosocômio vinha lutando para sobreviver. Convênios que não cobriam as despesas, falta de dinheiro, caixa em vermelho sempre... necessidade de reformas, mas sem verbas... tudo isso foi paralisando os serviços. Os médicos tinham que pagar os funcionários com verba própria, porque a Casa não estava dando renda mais...
E parece que há também uma questão trabalhista em demanda... conforme ouvi dizer.
Normalmente, os usuários como eu não sabem o que se passa nos corredores de um Hospital. E como cidadãos, gostariam que tudo fluísse bem, funcionando regularmente, com bom atendimento à população, como vinha ocorrendo há décadas.
A Casa de Saúde e Maternidade tem uma história.
Ela foi construída e instalada por Dr. Aldo Genovês Gilberti, que inicialmente clinicou em Machado de Mello, hoje Amandaba. Transferiu-se para Mirandópolis em 1946, e empregando todas as suas economias construiu a Casa de Saúde e Maternidade São José, que foi inaugurada em janeiro de 1954. Quem veio fortalecer o seu empreendimento foi o Dr. Oscar Luiz Gurjão Cotrim, que se associou ao Dr. Aldo, e por mais de cinco anos, esses dois notáveis médicos administraram a Casa com muita competência, tornando-a uma ótima prestadora de serviços para a comunidade e região.
De lá pra cá, os proprietários foram se alternando, e houve fases boas e ruins. Tenho na lembrança que nos anos setenta e oitenta, o Hospital funcionava bem, com boa clientela, e era sempre ali que buscávamos ajuda em nossas dificuldades de saúde. Ultimamente, com os investimentos do governo no Hospital do Estado, e os serviços do SUS, a afluência a esta unidade fez decrescer a da Casa de Saúde.
Na época áurea, poderiam ter investido em equipamentos e numa Unidade de Tratamento Intensivo. Não o fizeram, e acho que foi o maior pecado da administração. O Hospital estagnou-se, não acompanhou as mudanças que estavam ocorrendo no mundo.
Mais tarde, com pouca clientela e sem recursos, a Direção não conseguiu instalar os aparelhos, que se faziam necessários para um melhor atendimento, como os de Raio-X, Mamografia, Ressonância... E como os clientes precisavam desses exames, a tendência foi procurar outros hospitais e laboratórios da região, o que só fez diminuir e paralisar de vez os atendimentos.
E deu no que deu. Infelizmente.
Agora, vendo as portas cerradas, não é hora de culpar estes ou aqueles, mas de tentar resgatar essa Casa, para que a história dela não fique truncada.
Acho que é hora de conclamar a população para procurar uma solução viável. A Maternidade precisa continuar existindo, para servir à comunidade. Toda a cidade precisa de seus serviços.
Onde nascerão os bebês das atuais parturientes?
E qual será o destino dos obstetras?



Mirandópolis, fevereiro de 2013.
kimie oku in cronicasdekimie.blogspot.com





sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Artes e Artesanato


                                                                  
    Artes e Artesanato


Gosto muito de artesanato.
E conheço artesãos admiráveis. Interessante é que a maioria descobriu o seu talento sozinho, e o desenvolveu praticando sem que ninguém os dirigisse ou orientasse.
A primeira artesã para mim foi a minha mãe. Ela fez tanta coisa bonita em vida, que merecia uma Mostra Pública de seus trabalhos, que incluem crochê, tricô, macramê, bordado à mão, costura, confecção de flores e chinelos. Ela nos deixou um legado maravilhoso, confeccionado por seus dedos hábeis e caprichosos. Toalhas de mesa, colchas, joguinhos de sala, de quarto, bicos em toalhas de banho e panos de prato, caminhos de mesa, ela os fez às dezenas. E os ostentamos com orgulho para nossas visitas e, para as pessoas que apreciam essa arte delicada.

Tenho também algumas amigas, que confeccionam peças maravilhosas de bordado e de crochê. Essas amigas não sofrem de depressão, porque têm sempre um trabalho delicado e bonito para fazer. E o fazem com alegria, e quando terminam, elas mesmas se admiram do resultado.
Tenho um amigo que faz trabalhos com bambu. Mesinhas, prateleiras, porta-abajures são confeccionados com leveza e servem para decoração de ambientes. Infelizmente, nem todas as pessoas dão valor ao trabalho feito manualmente. Antigamente, faziam-se cestas e balaios de bambu. Hoje, esses objetos são raros, mas foram muito úteis. Ainda hoje, gosto de colher frutas e verduras no sítio armada de uma cesta de bambu.

Conheço gente que faz peças de cerâmica. Eu as aprecio muito. Essa arte remonta há milênios atrás, quando os homens  inventaram as primeiras peças para pegar água nos rios. No Japão, durante o Período Jomon, período que remonta há mais de dez mil anos antes de Cristo, foram confeccionados jarros rendados, apenas utilizando-se as mãos.
A Cerâmica Marajoara dos índios brasileiros também foi uma das coisas mais belas, feitas pelos primitivos.
 E o fino da cerâmica está na China, que era feita de porcelana delicadíssima.

Mas, tudo começou há milênios, quando o homem, ainda um ser rústico, mal acabado, meio humano, meio bicho se viu jogado nesse planeta sem ter noção de sua existência. Só atendia às suas necessidades físicas, procurando água nas fontes e alimentos na floresta. Pouco a pouco, sentiu a necessidade de determinar seu território, para não ser atacado por outros seres, que compartilhavam da mesma mata densa. E foi se esconder em buracos ou cavernas, disputando com alguns ferinos. E por séculos e séculos, as grutas e cavernas foram sua moradia, porque os protegia do frio, das tempestades e das feras.
E para ocupar seu tempo ocioso, porque só saia para colher e caçar alimentos, começou a matutar um jeito de trazer a água da fonte, para matar sua sede sem ter que andar enormes distâncias toda vez que precisava beber. Acho que a primeira vasilha utilizada foi a folha de algumas plantas, depois foi a cuia de coco, onde havia coqueiros, naturalmente. E aí, desenvolvendo o raciocínio, chegou a amassar o barro que secava em seus pés, e à ideia de confeccionar uma cuia, uma bacia, um jarro.
 Eureka! Foi a grande descoberta! Ele tinha o poder de fazer coisas. Era o “homo faber” se descobrindo, se revelando.
E a partir daí, tudo aconteceu.  Confeccionou suas armas de pedra, de madeira, sua moradia, sua roupa, sua comida, seus remédios e até seus meios de comunicação e transporte.
Enquanto vivia nas cavernas, o homem inventou a pintura, que chamamos rupestre. Nos tetos das cavernas, ele desenhou seus grandes feitos, que se resumiam em caçadas de animais e cerimônias religiosas. É fantástico imaginar o que esses pintores primitivos pensavam, enquanto faziam seus desenhos. Usaram sucos de folhas das plantas e sangue de animais para colorir os desenhos. Devagarzinho, os homens descobriram seus talentos artísticos. Mais tarde, fariam até suas urnas funerárias com barro, amplamente utilizadas pelos índios da América.
E recentemente, foi descoberta a Tumba do Imperador chinês Qin Shi Huangdi, que foi enterrado com 6000 soldados guerreiros de terracota, e centenas de cavalos em tamanho natural. Segundo a lenda, os soldados o protegeriam nas batalhas de outro mundo.
Tudo isso é muito fantástico, porque conta a evolução do homem desde a sua criação até os dias de hoje. Temos os famosos Museus de Arte, que guardam como tesouros, todas as mais belas obras confeccionadas pelo homem. Museus de Amsterdã, de Louvre, de Tóquio, de Ankara, de Nova York, de Bruxelas... resumem a capacidade criativa do ser humano.
Do primeiro rústico jarro até as finas porcelanas da China, muito tempo decorreu. E o “homo faber” utilizando sua capacidade criativa chegou à tecnologia dos dias atuais.  O poder de imaginação humana é sem limites. Hoje, a gente se espanta com as máquinas voadoras que vão para outros  lugares no espaço sideral. Espanta-se com o avanço da tecnologia, da Informática, que tudo pode, que cada dia tem novidades...
Até onde irá a capacidade criadora do homem?
         Inimaginável...
Só o futuro dirá.


Mirandópolis, fevereiro de 2013.
kimie oku in cronicasdekimie.blogspot.com

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013



    Sobre raios, relâmpagos e trovões



         Sempre tive cisma de relâmpagos, raios e trovões.

      Nunca fui atingida por um raio, mas tenho receio daqueles riscos, que de repente, cortam o céu sem nenhuma explicação.
Sei que não é racional, mas tenho medo. Um medo animal, que vai até o fundo do coração.
Fico a imaginar, como os primeiros homens que habitaram as florestas devem ter sentido o mesmo que eu, mas em grau muito mais intenso, porque não tinham abrigos, e viviam em contato direto com a natureza, nas cavernas ou sob as árvores .
Entendo a razão dos nossos índios temerem a Tupã, Deus do Trovão. O medo do desconhecido fê-los crer num ser onipotente e invisível, que volta e meia mostrava a sua fúria ribombando... Acho que não há um lugar que desperte pavor maior que, uma floresta fechada e escura, durante uma tempestade. A água e o vento descem vertiginosamente, lavando e retorcendo as copas das árvores, encharcando tudo, e clarões de relâmpagos mostram o cenário, que parece uma ameaça à segurança física. Além disso, os trovões ribombando, fazem a Terra tremer...
Sei de gente que tem tanto medo dos temporais, que se esconde num lugar escuro, tampa os ouvidos e espera a borrasca passar, sofrendo muito. Não é o meu caso, felizmente.
Por outro lado, sei de aventureiros que saem à caça de furacões e tornados, para registrar a força e a velocidade do vento. Esses realmente ficam no olho do furacão e, não têm medo de nada.
Sei que existem explicações lógicas de Física sobre a formação da chuva, do vento, dos raios e dos trovões. Acredito nessas leis, e como pessoa de inteligência normal não duvido das teorias, que sábios estabeleceram para explicar os fenômenos da  Natureza. Mas, isso não me impede de temer aquele corisco de fogo que risca o céu, e o estrondo que vem depois, fazendo a Terra estremecer... Nessa hora eu me sinto como uma formiguinha, diante de um precipício.

Sei de gente que, ao abrir a porteira da fazenda, foi atingida por um raio e teve morte instantânea. Sei de rebanhos inteiros de gado, em dia de temporal que, morreram porque uma árvore rachada por um raio caiu na cerca onde estavam estacionados. Não é para se ter medo mesmo?
Talvez o medo que a gente sinta tenha a ver com ignorância, com o desconhecimento dos fenômenos naturais. E medo, temor, pavor e terror não é coisa fácil de controlar. É uma sensação interna, visceral, que nada tem a ver com o racional. Acredito até que, os cientistas que lidaram com a Usina Nuclear de Fukushima, quando da tragédia do tsunami, tenham sentido terror, porque estavam mexendo com algo fora de controle, e não sabiam exatamente a extensão dos perigos, a que se expunham.
Por mais que eu leia e pesquise, talvez pela limitação da inteligência, não consigo uma explicação lógica e fácil para a ocorrência de um raio, de um relâmpago e de um trovão... E o estrondo, que vai se repetindo, como um eco, sem parar... Talvez seja burrice mesmo, mas ninguém consegue convencer-me por A mais B, a razão de um relâmpago e o porque dos estrondos do trovão. Para onde vai aquele risco de fogo, que corta o céu tão repentinamente? Onde ocorrem os estrondos do trovão? No choque das nuvens? E por que o chão estremece? Que força é essa que chega a balançar o chão? E o que absorve todo esse barulho? Perguntas mil, sem respostas aceitáveis... 
 É verdade que os estudiosos têm todas as respostas lógicas, mas a minha limitação não possibilita um entendimento claro e plausível. E daí o temor...
Quando o dia está ensolarado, tudo parece ser mais fácil, até uma longa viagem. E mesmo, os pilotos de avião almejam sempre céu límpido para suas navegações. Tudo é mais difícil com borrascas, ventos contrários e escuridão.
Acredito que temporais, ciclones, furacões, tsunamis, vendavais e períodos prolongados de seca sejam como as estações do ano da Terra. Deve ser tudo natural e ocorrer ciclicamente, como acontece a Primavera, o Verão, o Outono e o Inverno. Só que o ser humano, por ficar à mercê dessas poderosas forças da Natureza não se acostuma nunca com elas.
Desde que o homem pisou este planeta pela primeira vez, já se passaram milhões de anos. Cientistas os mais sábios já passaram por este chão, se dedicaram ao estudo desses fenômenos e deixaram suas conclusões em forma de leis e teorias. E para viver tranquilamente, é preciso aceitar essas teorias que, explicam racionalmente a maioria dos fenômenos naturais. E assim tem sido.
Entretanto, nenhum ser humano pode declarar que se sente totalmente seguro em meio a um terrível furacão,  por conhecer a razão de sua ocorrência. E acredito firmemente, que nem mesmo os mais sábios cientistas se sintam seguros, quando  presenciam um vendaval a 180 km por hora, que vai varrendo tudo que encontra pela frente.



   E parafraseando Shakespeare: “Há mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia”
Daí, o meu medo.




Mirandópolis, fevereiro de 2013.
kimie oku in cronicasdekimie.blogspot.com
                                             

sábado, 9 de fevereiro de 2013



Nomes, sobrenomes e apelidos

      Há um tempo atrás, quando comecei a me comunicar através do face book, tive uma troca de impressões muito engraçada a respeito de apelidos. O amigo conhecia apelidos inusitados.
         Prá começar, ele fez parte de uma geração que apelidava todo mundo com as características que punham em destaque a figurinha do outro; tipo “Cabelo de fogo”, “Zoiúdo”, “Gaguincha”, “Beiçudo”...
       Essa história de nomes e apelidos é uma coisa interessante. Há nomes e nomes. Meu sobrenome de casada é Oku, que significa profundo e se escreve com apenas um ideograma. Mas, ao pronunciá-lo, se se acentuar a última sílaba se transforma em um palavrão, em Português. Sobre isso aconteceu um fato hilário. Quando meu cunhado passou no concurso do Banco do Brasil, há décadas atrás, ligaram daqui para o Rio para conferir os resultados. E alguém do outro lado da linha disse: “Passou o fulano ... mas o sobrenome é um palavrão.”
         E quando meu primogênito ia começar a frequentar a escola, preocupada com as gozações dos colegas, eu o alertei sobre o seu sobrenome, que poderia lhe trazer aborrecimentos. Mas, ele me tranquilizou dizendo que, Oku é menos feio que Francisco Cuoco...
     Certa vez, uma amiga me contou que tinha uma colega chamada Fulana Bruschetta Pintão. E a moça sofria toda vez que lhe pediam o sobrenome...
         Uma senhora havia esperado tanto uma filha, que, quando ela veio, lhe deu o nome de Idolatrada! Pode?
       Conheci num desses Cursos de férias, um Professor tristinho, desajeitado e esquivo que se chamava José. E a gente lhe perguntava: “José do quê?” “De nada” “José de nada?” e ele, muito sem graça, dizia: “Não tenho sobrenome!”
        Realmente, é melhor ser Oku, Cuoco ou Bruschetta Pintão do que não ter sobrenome algum.
         O sobrenome é uma referência. Ele diz a que família, a que grupo, a que clã você pertence.
No Japão Medieval, o culto do nome de família já levou às raias de exacerbação. Quando não nascia filho-homem, muitas vezes a mulher era devolvida à família de origem, como incapaz. E quando não havia filho-homem, para perpetuar o nome da família, um jovem era comprado para casar com uma das filhas e, adotar o sobrenome da moça. Em troca, ele recebia muitas regalias, como terras, casas, dinheiro, títulos e até toda a herança da nova família.
Só que, o jovem que se submetia a esse tipo de contrato tinha o desprezo da maioria da sociedade... Ainda hoje ocorre esse tipo de acordo, entre alguns grupos de japoneses. O sobrenome ou nome da família é muito importante para a tradição japonesa, por isso ele antecede o nome quando a pessoa se apresenta, ou assina um documento. Assim, eu seria Oku Kimie. E seria sempre chamada pelo sobrenome; o nome seria só para os íntimos. Estranho né?
Falta de respeito é o que certos pais fazem com a denominação de seus filhos. Conheci um sujeito que, registrou o filho com o nome de Luatom!!! Quando lhe perguntei a razão, disse que era uma homenagem à chegada do homem na Lua e à Era Atômica. Tive eu, a vontade de mandar o sujeito prá Lua!...
Agora, apelidos existem os mais incríveis como: Boca Podre, Boca Rica, Cascolar (ele gostava de professoras), Faísca, Caboré, Feijão, Grilo, Fornalha, D 20, Jacaré (pai) e Lagartixa (filho), Mimosa, Repórter Esso, Fumaça, Breguedé, Lígia bang-bang e por aí vai.
Um amigo que curte apelidos me passou uma lista, dentre os quais selecionei estes: Bacuri, Manga Chupada, Visgo (de jaca), Canário, Sanhaço, Galo Cego, Jurupoca, Beição, Bogato, Bizorro, Bisteca, Cudiga, Dez prá duas, Fumanchu, Morróida (de hemorróida), Tiriça, Tocó, Xepa e Zapata.
Mas, um apelido que caiu como uma luva foi Seis e meia (horas), o apelidado não era nem claro nem escuro.
Conheci uma família que tinha dois cachorros: o branco se chamava Maradona e o preto era Pelé. Isso foi no auge da carreira desses famosos jogadores.
Falando em nomes, acho ridículo colocar dez prenomes para uma criança que nasce, como se usava entre a realeza. O Príncipe recebia nomes como Antônio, Guilherme, Francisco, Coriolano, Manoel, Leonardo Pedro de Alcântara de não sei das quantas... Já imaginou a própria criança ter que decorar seu próprio nome, logo no começo da vida? Maldade, né? E quando tivesse que escrever? Só prova a arrogância de quem a denominou assim.
Acho isso tudo uma tolice só.
Prenomes, nomes, sobrenomes, apelidos são apenas palavras. Palavras inventadas pelo próprio homem. Não acrescentam pompa nem glória; e muito menos diminuem o caráter de alguém. São apenas referências para identificar pessoas.
Quem recebeu nomes inconvenientes ou de mau gosto ao nascer, deve sempre pensar que nome não tem importância. O que importa é a pessoa, o seu caráter, a sua maneira de viver e de ser no mundo.
Apelidos? Bobagem.
Quer superar isso? Seja alguém especial que, comprove para que veio a este mundo. Seu nome, sobrenome ou apelido ficará na História como um marco, uma referência, por mais feio e inadequado que pareça.
E será copiado por outros, com certeza.

Mirandópolis, janeiro de 2013.
kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”




terça-feira, 5 de fevereiro de 2013




         Sua sina é cantar até morrer

     Descobri recentemente que as galinhas foram os primeiros bichos domesticados pelo homem. É que são mansas e só atacam quando em perigo.
         E desde os primórdios dos tempos, elas têm servido ao homem, fornecendo-lhe a proteína leve, de origem animal que é necessária à sua alimentação.
 E todos os dias, a humanidade consome os seus derivados,  em forma de frango a galeto, frangos recheados com farofa, canjas de galinhas que caem bem nas noites frias de inverno, frango xadrez com pimentão e amendoim, frango com gengibre e shoyu... E os ovos? Sem eles, seria impossível as confeitarias produzirem grande parte de guloseimas... Sem contar com as penas, que são bem aproveitadas para encher travesseiros e almofadas, além de serem aproveitadas em decoração.
Quando se fala em galinha, sempre retorno à minha infância nos anos cinquenta, quando todas as famílias tinham criação de cabras, porcos e galinhas. E a gente morava longe da cidade, onde havia alguns açougues, mas que vendia só carne bovina e suína.
Lembro que costumávamos ter umas trinta cabeças dessas aves, incluindo os galos e os pintinhos. Eram criadas soltas no quintal, e comiam todos os insetos daninhos... As galinhas punham ovos periodicamente, e eu adorava fazer a coleta deles. Os ninhos eram feitos em balaios velhos que ficavam nos galhos das laranjeiras, para se evitar que os lagartos-teiús viessem roubar os ovos, e os pintinhos que iam nascendo. Logo que a galinha cantava o cocoricócó,  anunciando que acabara de botar, lá ia eu buscar o ovo quentinho. (Diz-se que o primeiro publicitário foi a galinha, que logo após botar o ovo, anuncia o seu feito cantando para todo mundo saber).
Certo dia, vi um pintinho bicando o casulo, querendo sair e saltar para a vida. Notei que ele fazia um esforço enorme, e condoída de suas tentativas, tirei-lhe toda a casca, feliz por ter  ajudado. Mas, que desolação! O pintinho viveu um minuto e morreu na minha mão. Fiquei tão arrasada de minha ignorância, que nunca contei essa arte para minha mãe, e eu tinha uns oito anos apenas. Foi quando descobri que a gente não deve interferir na Natureza.
A gente criava galinhas para o nosso consumo, que só acontecia aos domingos.
No sábado à tarde, jogava-se milho no quintal e chamava as bichinhas: pi, pi, pi, pipiiiii... e elas vinham felizes, beliscar os grãos amarelinhos. Mamãe escolhia o frango maior e mais gordo e lhe agarrava o pescoço. Quando o bicho era arisco, apelava-se à ajuda do cachorro, que resolvia a parada em instantes. O pescoço era torcido, e a ave era deixada alguns minutos de cabeça para baixo, para esgotar todo o sangue. Enquanto isso fervia-se um tacho de água, onde  mergulhava   o frango para amolecer a pele para depená-lo. Essa tarefa competia a nós crianças, mas era horrível, porque o bicho fedia. Esquartejar era tarefa de mamãe. (Anos mais tarde, quando tive que fazer isso também, descobri que era a pior parte. Cortar os membros, tudo bem, mas enfiar a mão lá dentro do corpo para se retirar as vísceras, dava uma terrível sensação, porque estavam quentes e parecia que o animal ainda estava vivo).
O frango depenado, lavado e esquartejado era temperado com limão, sal, alho e pimenta do reino e só seria preparado para o almoço de domingo. A cada membro competia apenas um pedaço, porque a família era grande e muito pobre. Mas, era delicioso, e o tempero de mãe é uma coisa que a gente nunca esquece...
Recentemente, conheci as galinhas garnizé, ou galinzé, que é uma espécie de galinhas e galos nanicos, mas que são da mesma família dos galináceos. Têm pernas curtas e acho que, servem apenas como enfeites, porque são muitos pequenos e não produzem muita carne. A característica principal do garnizé é o seu interminável cantar. Desde que amanhece, ele abre o bico e canta, e canta e canta de cinco em cinco segundos, por horas sem parar. Acho que só descansa na hora de comer, beber água, acasalar-se e dormir. Ainda bem que, de dia tira umas cochiladas para descansar. Mas, ele tem uma voz potente, e deve com certeza ter bofes fortes e uma garganta poderosa. Seu cantar se ouve de longe, e tem gente que se incomoda com isso... Se há gente que se incomoda com esse cantar do galinho, imagine a sua parceira que, tem que aguentar todos os dias, toda a vida o seu cocoricó sem fim.
Deve ser enjoativo para as aves que convivem com ele, e também para ele próprio, que nasceu com essa sina.
Isso me fez lembrar de Jean Paul Sartre, um filósofo francês, que abordou a Teoria do Existencialismo. Em sua obra “A Náusea“, ele levantou a questão do cansaço de existir, de viver. Comentou que as árvores devem sofrer pela existência longa e interminável. Penso que os galos garnizés devem sofrer dessa mesma náusea, de cantar sem parar. Porque é como um disco repetindo sempre o mesmo som, interminavelmente.
E tudo que é demais cansa.
Ops, será que também não estarei cansando o leitor?
Vou ficar por aqui.
Mas, curtam o canto do galinzé, enquanto puderem escutar, porque é melhor ouvir isso todos os dias, do que ser surdo, né?

Mirandópolis, janeiro de 2013.
kimie oku in cronicasdekimie,blogspot.com