Velórios e Funerais
Não sei quem estabeleceu que é preciso esperar 24
horas para enterrar o corpo de uma pessoa que morreu. Deve ter sido um médico.
Eu me lembro que umas décadas atrás, o médico marcava até a hora extrema para o
enterro, no atestado de óbito...
E ao longo da História, a humanidade
cumpriu o rito do enterro após 24 horas ou mais, conforme as condições de
preservação do morto.
E de repente, sem mais nem menos, um vírus
mortal mudou tudo! De 2020 até agora, os velórios foram proibidos e os funerais
são feitos rapidamente, como se as famílias estivessem cometendo algo ilícito.
O que é um velório?
E o derradeiro momento de se despedir de
alguém que marcou nossas vidas. Muita gente ia a um velório só para marcar
presença e assinar a lista de comparecimento. Eu, não! Só compareci a funerais,
tirando uma hora do meu dia a dia para homenagear aquele que partiu e, fazer as
orações para uma viagem de paz para a eternidade.
Como eram os velórios? Longos, cansativos e
muitas vezes adentravam pelas madrugadas, deixando os familiares esgotados.
Familiares que passaram o dia sem se alimentar e estavam enfraquecidos e
tristes... Por outro lado, durante o
dia, era um desfilar de gente de todas as categorias que chegavam para lamentar
a perda. Muitos amigos que não se viam há décadas se abraçando e matando saudades...
No geral, eram horas longas que não passavam, com os familiares sem jeito
diante do absurdo das perguntas sem sentido, como morreu, o que aconteceu, por
quê morreu... Tudo isso nem importava mais. Morreu e pronto. Pra quê cutucar a
ferida? E as rodinhas que se formavam falando de campeonatos, de gols, de
juízes, de pênaltis... Era uma festa!
Então, tudo isso acabou.
Será que foi melhor? Pior?
A família que perde um ente querido fica
destroçada pela inesperada visita da morte. E precisa de um ombro amigo, de um
abraço carinhoso, de umas palavras sinceras para amenizar a sua dor. Não
precisa de discursos, de um desfile de gente que nem conhece. Não é a multidão
que importa, mas o conforto de perceber a empatia dos amigos. Gente que chora
as mesmas lágrimas.
Mas, os velórios longos não têm sentido.
Muitas
vezes, a família já vinha velando aquele que partiu, por um longo tempo,
tentando salvá-lo ou pelo menos amenizar seu sofrimento. Todos esgotados, no
limite de suas forças... E ainda mais vinte e quatro horas de velório...
Dureza.
Então,
não velar parece mais tranquilo e lógico.
Mas
é tão frio, tão impessoal.
Uma
amiga enterrou alguém com a presença de meia dúzia de familiares. E ela me
contou isso com muita tristeza. Ficou em mim a impressão que, a sociedade não
se importou com a passagem desse homem. Homem que labutara a vida toda para
tornar melhor a vida de todos...
Mas,
agora é assim que tem que ser.
Sem
velórios, sem abraços, sem choro.
Um
funeral rápido, sem pompa e sem honras.
Afinal,
somos apenas umas formiguinhas indefesas, desfilando pelas campinas verdes,
sonhando com o Paraíso...
As
campinas verdes estão todas intoxicadas.
Mirandópolis,
março de 2021.
kimie oku in
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