Senhoras
e senhores,
Estou
aqui para lhes contar uma história.
Como
Professora trabalhei no Grupo Escolar de Amandaba, onde atuei há mais de 50
anos. E conheci muitas crianças a quem
ensinei por longos anos. E conheci seus pais. Foi assim que conheci o senhor Kaoru
Hattori, cujos filhos Mitsuo e Tomiko foram alunos meus. Bons alunos.
Amandaba
já foi um bairro bastante povoado e tinha comércio mais forte que Mirandópolis.
Após me
transferir para a Escola Ebe Aurora, comecei a escrever crônicas para o Jornal
do seu Idanir Momesso e anos depois para o Jornal Hoje da Alice Barravieira. Crônicas
são comentários dos fatos que ocorrem no dia a dia. Escrevi pelo prazer de
escrever, simplesmente.
Além das
crônicas, passei a contar as histórias de trabalhadores que construíram Mirandópolis.
Contei histórias lindas de comerciantes, charreteiros, farmacêuticos,
barbeiros, dentistas, boiadeiros, lavradores. Gente de fibra. Gente que muito
labutou para a grandeza de nosso município. E me lembrei
de
contar a história do senhor Kaoru Hattori.
Seu
Hattori veio do Japão há 92 anos.
Sua
família era da Província de Fukushima. Seu avô Shiguezo foi um bravo soldado
que se destacou na Primeira Guerra Mundial. E por esse mérito, o filho
Tadaichi, pai do seu Kaoru teve a honra
de ser nomeado Guarda da Família Imperial.
Mas, as
guerras contínuas do Japão tornaram difícil a vida dos japoneses e, a família
Hattori se emigrou para o Brasil em 1933. Seu Kaoru era uma criança de oito
anos de idade. Aqui, enfrentaram mil dificuldades, derrubaram matas, plantaram
café, algodão, arroz, feijão. Inicialmente em Lins, depois às margens do rio
Tietê.
Seu
Hattori estudou um ano no Japão e não conseguiu continuar os estudos de japonês
aqui, porque seu Professor foi convocado para a Segunda Guerra. Então, estudou
numa escola rural onde aprendeu a ler e escrever em Português. Mas lê e fala
fluentemente o japonês.
Em 1940,
a família se transferiu para a Fazenda Buenópolis em Lavínia e em 1946 para Amandaba,
onde comprou o sítio que tem até hoje. Conheceu a prosperidade plantando
cebola, mas essa fase logo passou.
Seu
Hattori casou-se com a senhorita Tokiko Sakine com quem teve cinco filhos. Sua
esposa já é falecida, mas os filhos estão vivos. E tem muitos netos.
Em
Amandaba havia muitos japoneses imigrantes, que fundaram a Associação Japonesa
de Amandaba, que promovia festas e competições esportivas. No cinquentenário da
Imigração Japonesa em 1958, eles mandaram construir um obelisco marcando a data,
com a bandeira japonesa e a brasileira, e registraram os nomes das famílias que
ali moravam. Tudo em kanji, ainda está lá na pequena praça local, com os nomes
dos Uemura, Kanamaru, Onishi, Suguimoto, Hattori, Sano, Nakashima, Sako, Matsunaka,
Yamaguchi, Koakutsu, Seimo, Yoshikawa,Terao e Shoji Ochi.
Um dia,
o Vereador Tsuyoshi Takagui propôs ao seu Hatori uma campanha para realizar o maior
sonho de todos os amandabenses, que era asfaltar a estrada que liga o bairro a Mirandópolis.
São apenas seis quilômetros que, em tempos de chuva tornava quase impossível
transitar por ela. Eu mesma como professora fiquei muitas vezes atolada ali,
esperando ajuda de tratores.
O seu
Hattori assumiu essa missão de corpo e alma, pedindo a colaboração dos
fazendeiros e sitiantes, que sofriam para trazer seus produtos para a cidade.
Livro de ouro foi passado entre pessoas que colaboraram prontamente. Essa verba
era necessária para ir à capital e, entrevistar-se com as autoridades, para conseguir
a aprovação do projeto.
Essa
campanha teve o apoio do Prefeito da época Mitsutoshi Ikejiri, que intermediou
junto ao Secretário de Transportes, Walter Nory, e ao Governador Orestes
Quércia que aprovaram o projeto. E a estrada asfaltada foi inaugurada em1993,
com o nome de Estrada Tadaichi Hattori, que foi o Guardião da Família Imperial
do Japão.
Foi uma
realização de grande porte, que beneficiou não só os amandabenses, mas os
mirandopolenses também. E se realizou graças ao empenho do senhor Hattori,
principalmente.
Foi
preciso vir um menino de oito anos do distante Japão em 1933, para se realizar
o sonho maior de todos os moradores de Amandaba e arredores.
Seu
Hattori também se destaca por realizar missas em reverência aos falecidos. Por anos seguidos tem cumprido essa missão,
para confortar as famílias japonesas de religião budista.
Por ter
se adaptado no Brasil, um dia foi solicitar a cidadania brasileira na Polícia Federal.
Indagado por qual razão queria ser naturalizado brasileiro, prontamente
respondeu:
“Vim do
Japão ainda criança com a família, e meu pai não conseguiu vencer aqui. Eu
quero adquirir o Título de Eleitor, para votar em nossos governantes. Não quero
voltar ao Japão, porque já tenho filho nascido no Brasil e quero morrer aqui!”
Diante de tal resposta, sua naturalização foi aprovada na hora.
Essa
frase define bem o caráter desse senhor que hoje completou cem anos de longa
existência, permeada de lutas, sonhos e muito, muito trabalho. Japonês/brasileiro
de coração, benquisto de todos, não viveu em vão. Deixou a marca de sua
passagem aqui em Mirandópolis. Estrada Tadaichi Hattori.
Por tudo
isso, o senhor Kaoru Hattori é sem dúvida um Homem de fibra!
Parabéns
e que Deus o abençoe e a toda a família.
Mirandópolis,
29 de novembro de 2025.
Kimie Oku in
http://cronicasdekimie.blogspot.com
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