sexta-feira, 5 de maio de 2017

                                                Sem óculos...
    Quando eu tinha 38 anos de idade, meu excelente colega de trabalho Yussuf Hsain Alaby começou a usar óculos. E eu comentei que ele estava ficando velho, porque sua visão começara a falhar. Lembro-me bem que ele achou graça e me disse: “Deixa estar, que a sua hora há de chegar!”
      E chegou mesmo! Mais cedo do que esperava! Com 45 anos já não conseguia localizar os números na Lista Telefônica. As Listas da época eram imensas, pesadas e eram impressas em letras bem miúdas...      Os primeiros óculos me incomodaram muito. Não paravam no lugar e me faziam suar. Detestei o uso deles! Mas, a visão falhando mais e mais me obrigou a adotá-los de vez. E quando os esquecia em casa, tinha que voltar para buscá-los. Sem eles não conseguia trabalhar. Como ler ou escrever sem óculos?
      Acredito que os óculos tenham provocado uma revolução quando foram inventados. Lembro-me do filme “O nome da Rosa”, da obra de Umberto Eco em que um Frei tinha o privilégio de possuir um par de lentes grossas, com as quais lia as Escrituras no Monastério. Isso provocava muita cobiça aos demais religiosos, que tinham a visão também enfraquecida. Era uma novidade e todos ficavam fascinados pelo par de lentes de vidro... Desejando possui-los também...
       No início dos tempos, usava-se um par de lentes, que eram presos no nariz por meio de uma mola. Eram os famosos pince nez, sem pernas. Pince nez expressão francesa significa “preso no nariz”. Como não eram práticos, inventaram as pernas para apoiá-los nas orelhas...
       Os primeiros óculos eram feios, de aros redondos, que deveriam ser usados por todos indistintamente, sem considerar o formato da testa, a distância e a cavidade dos olhos... A maioria das pessoas ficava muito estranha com esses óculos... As lentes eram bem grossas e a armação era sempre preta ou marrom e a face do usuário ficava muito séria, com expressão pesada.
      Com o decorrer dos tempos, inventaram novos modelos, que se adaptassem aos diferentes formatos dos rostos. E hoje existem os mais variados modelos, que além de serem úteis servem ainda para ornamentar os rostos. Modelos diversos de cores suaves e delicadas até os mais ousados e extravagantes. Há uma infinita variedade de modelos e cores, e os óculos já fazem parte do vestuário das pessoas como protetores do sol ou, apenas como objeto de requinte.
      Os óculos são indispensáveis para a maioria das pessoas que ultrapassaram os cinquenta, sessenta anos de vida. A visão assim como as demais partes do corpo tendem a se enfraquecer com o tempo. E um dia, a maioria busca ajuda de um oftalmologista para continuar enxergando. E daí em diante, esses objetos passarão a ser parte do seu traje diário. Eu também os uso constantemente, se bem que ainda consiga enxergar mais ou menos bem os objetos distantes. Mas, para dirigir não os dispenso.
      Pois bem, um dia desses perdi o único par de óculos que me permitem ver de perto e de longe. E os procurei nas gavetas, nos armários, entre os livros, nas bolsas, entre minhas sacolas de crochê e de tricô. E nada. Se evaporaram! Daí, liguei para os mercados, as lojas, fui ao Banco, ao Conservatório, ao Foto Celso para atormentar as pessoas com minhas indagações! E nada!
      Não fiquei desprovida totalmente da visão porque tenho uma porção de óculos. Toda vez que avio nova receita, aproveito a velha armação e faço uma reserva que fica na minha escrivaninha, no meu criado mudo, junto do computador... E para dirigir tenho os solares que permitem visão à distância. Mas, os que perdera eram bifocais e caros, daí a minha decepção e o desejo de recuperá-los...
      Como último recurso postei no face pra ver se alguém os achara em algum lugar. Muita gente se solidarizou comigo, torcendo que os encontrasse, com palavras de alento. Mas... o melhor foram as chistes que foram surgindo dos amigos “terríveis”, que tenho como Ademar Bispo, José Roberto Drubi, Maria Célia Sanches Drubi e Moacir Bonadio. Sugeriram que os procurasse embaixo da cama, embaixo do banco do carro e até na testa! O Zé Drubi disse que eu precisava de outros óculos para procurar os perdidos!!! E o Ademar Bispo, meu amigo de Araçatuba, que é um exímio contador de histórias, publicou no face um “Monólogo dos Óculos da Kimie”, muito engraçado, que divertiu à beça todos os envolvidos. Dentre as graças inventadas pelo Bispo, meus óculos teriam sido usados como olheiro do meu filho, deixando-os propositadamente no seu carro. Sim, porque lá estavam esquecidos durante uma viagem que fiz, e troquei de carro para voltar... Ainda, ele escreveu sobre minha cegueira forçada e minhas trombadas com as portas, a troca de sapatos ao calçá-los...a desastrada tentativa de acertar a boca com o garfo nas refeições, a troca de sustenidos e bemóis na Nona Sinfonia e para completar... disse que preciso de óculos porque sou japonesa e não consigo abrir os olhos... A veia satírica do amigo estava inspirada e dei muita risada. Mas, valeu para desopilar o fígado de muita gente.
      Felizmente achei os benditos óculos.
      E essa história serviu para a gente se divertir um bocado. E a presente crônica foi sugestão do Moacir Bonadio, que com seus 81 anos de idade tem um humor impagável.
      E se nada é por acaso, a perda dos meus óculos foi providencial para fortalecer a amizade de todos esses amigos e mais outros do face.
      Obrigada a todos!
      Um crônica por uns óculos esquecidos...
      Mirandópolis, abril de 2017.
kimie oku in

8 comentários:

  1. Oi Kimie,
    Como sempre, é muito agradável ler suas crônicas!...suas letras parecem estar batendo papo com a gente...por isso, a "conversa" flui facilmente e nos faz tão bem!
    Parabéns e obrigada! Bjo, amiga!

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    1. Muito obrigada,Joana. Agradeço por prestigiar o meu trabalho (ou minha diversão?)

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  2. Kimie,em meu coração fui solidária a você e desejei muito o seu encontro com o "danadinho". Não consigo ler quase nada sem meus óculos de perto! Quando os perco, fico aflita...!! Mas... esta perda suscitou doces "provocações" e em dias pesados e cinzentos , estes momentos são de refrigério e alegria! Amo suas crônicas e sátiras! Bjos.

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    1. As provocações foram ótimas, né Ana Maria?

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    3. Sim..., Kimie, muito criativas !!

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  3. Bom dia!
    Com os meus óculos pude ler mais esta obra sua que, sem sombras de dúvidas, fora escrita com os dedos, com a mente e com os seus óculos reaparecidos.
    Beijos!

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  4. E de olho nos amigos do Face, Ulisses.

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