sábado, 27 de maio de 2017

Vai um cafezinho aí?

Cada país tem o hábito de receber as visitas com um agrado, uma gentileza.
No Japão, em qualquer ocasião oferece-se chá, assim como na China e outros países do Oriente.
No Brasil, o costume é oferecer café.
O café quentinho, passado na hora tem o poder de ligar as pessoas numa roda de descontração e bem estar. E transforma qualquer reunião num bate papo agradável.
O cafeeiro fez parte da vida de grande parte dos brasileiros... Nos anos 40, 50 e até 60, o café ainda era o propulsor da economia do país. E, nascidos nos anos 40 e 50 tivemos que labutar muito nas roças de café. Desde crianças tivemos que ir à roça e ajudar os pais e irmãos mais velhos na colheita dos grãos. Era um trabalho duro e áspero. Tínhamos que segurar os galhos e puxar os grãos pretos e vermelhos para baixo. Isso machucava nossos dedos que ficavam com as pontas todas perfuradas e doíam muito, até a gente se acostumar.
 As mãos perdiam a maciez e ficavam ásperas e grosseiras. (A gente nem conhecia cremes para proteger a pele. E mesmo que soubéssemos, não tínhamos dinheiro pra comprar esses luxos.) O café derrubado era rastelado e peneirado ali mesmo na roça e depois ensacado. Só os adultos fortes conseguiam peneirar os grãos. Os grãos meio verdes eram pesados e havia muita terra misturada, pedregulhos e folhas do cafeeiro. Então era necessário abanar, lançando todo o conteúdo para o alto várias e várias vezes, para eliminar as folhas e a terra. Depois, as carroças transportavam os sacos de café para casa, onde eram colocados num terreiro de cimento para secar. Lá eram revirados todos os dias, até a secagem completa. Só depois de tudo isso, era vendido para as Máquinas de café da cidade, que os descascavam e os revendiam para os exportadores.

O cafezal fez parte de minha infância e da maioria dos brasileiros de minha época. O Brasil foi o maior exportador de café do mundo. E a vida dos lavradores embora dura e árdua era mais ou menos confortável, porque todos plantavam arroz e feijão e verduras nas entressafras do café. Todos eram pobres, mas a comida era farta e ninguém saía pedindo ajuda... Quando revejo os cafezais, eles me parecem soldadinhos verdes parados nos morros, cumprindo a missão de produzir aqueles frutos vermelhos tão bonitos, que garantiam o sustento de tantas famílias brasileiras. Nada era fácil, porque a colheita era apenas uma vez por ano, e enquanto não se vendia o produto, era preciso recorrer a outros meios para sobreviver. Assim, muitos produtores passaram a plantar algodão, cebola, feijão, banana... Mais tarde, a superprodução de café provocou uma crise e o Governo brasileiro mandou queimar sacas e mais sacas de café... Pra manter os preços. E os cafezais foram queimados, e substituídos por pastagens para se criar gado bovino. Hoje, até as pastagens estão sendo tomadas pelos canaviais, para produzir o etanol...
Outros tempos...
Diz a História do Brasil que o café foi introduzido aqui pelo Sargento mor Francisco de Mello Palheta. Palheta fora encarregado pelo Governador de Maranhão e Grão Pará, João de Maria da Gama a ir a Guiana Francesa resolver problemas de fronteira e, conseguir sementes de café. Isso em 1727.
Inicialmente, o café foi cultivado no Norte do país, mas logo se alastrou por todas as regiões, especialmente no Sul. Sua produção enriqueceu muita gente, que até fez surgir uma classe social diversificada, a dos Barões do café que moravam
em belíssimas fazendas, explorando a mão de obra gratuita de centenas de escravos africanos...
Mas, outros países começaram também a produzir café e a superprodução provocou a queda dos preços e a falência da economia do café. E a falência da agricultura. Os braçais que perderam o emprego na roça vieram todos para as cidades, e incharam as periferias com seus barracos. E como não havia emprego disponível, essa população desocupada se transformou num grande problema. Décadas se passariam até as cidades recuperarem o equilíbrio. Muitos desses desempregados passaram a exercer pequenos serviços, como ambulantes oferecendo seus préstimos de porta em porta. Quando a agricultura se recuperou em parte, nova classe social surgiu – eram os boias frias, que passaram a ser levados das cidades para trabalhar nas roças de algodão, de cana...
Hoje, até os cortadores de cana estão sendo substituídos por máquinas colheitadeiras...
Mas voltando ao café, antigamente os grãos eram socados no pilão para descascá-los, e torrados numa torradeira que nós girávamos sobre um fogãozinho de tijolos ao ar livre. E todas as manhãs, os grãos eram moídos para se fazer o café. Era tudo um processo difícil, que nós encarávamos naturalmente. Não havia alternativas...
Hoje, a tecnologia facilitou tudo. A geração atual não conheceu os cafezais e nem os grãos de café. Conhece o pó moído e nem coa o café mais. Existe o café instantâneo, que é preparado só acrescentando água quente... Café cremoso, com chantilly, café expresso... Já tomei café à moda alemã, com limão...
Lembro que um amigo me ensinou que tomar muito café provoca azia. E é fato! Passei a reduzir os goles de café diário e adeus azia! Isso devo ao inesquecível e saudoso Professor Carlos Rizzo. 
Quando trabalhava ainda, tomava muito café. O café era a fuga dos aborrecimentos, a pausa para esfriar a cabeça. E o amigo Jorge Chaim costumava dizer que as melhores decisões não saiam durante as reuniões, mas na hora do café.
De qualquer forma, o café ainda é o rei absoluto de pequenas reuniões, servido quase sempre com bolos ou pães.
E eu gosto muito de visitar amigos e tomar um cafezinho enquanto batemos um papinho.
Vai um cafezinho aí?





Mirandópolis, abril de 2017.
kimie oku in


Um comentário:

  1. Trabalhei um pouco nas fazendas da café, empreitada que não me deixou saudade. Para mim que era garoto foi sofrimento...

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