Não
gosto de Natal
Quando era criança
nunca soube o que era Natal. É que meus pais imigrantes do Japão tinham outros
costumes, pois seguiam as tradições herdadas de seus antepassados lá nas terras
orientais.
E o que mais contribuiu para não conhecer o
Natal era o fato de morarmos em sítios e fazendas isoladas, que eram
agrupamentos de japoneses, que conjuntamente cultivavam outros costumes. Além
disso, éramos muito pobres e, não tínhamos acesso ao que acontecia na cidade,
uma vez que ninguém possuía carros ou caminhões para sair de casa.
Assim, passei minha infância ignorando
totalmente os costumes cristãos, embora tivesse sido batizada aos dez anos de
idade na Religião Católica. Somente quando vim morar na cidade para estudar é
que tive contato com a Igreja e a Religião. As pregações do Padre Luiz Camargo
Crescente e do Padre César Toppino em Lavínia foram abrindo a minha mente para
o lado espiritual cristão. E depois participei de alguns grupos religiosos:
Filhas de Maria, Grupo de Catequese e Círculo Católico Estrela da Manhã, que
agregava jovens nisseis para seguir a Igreja Católica.
Quando se é jovem há sempre um entusiasmo para participar de
grupos e eu não fui diferente. Fui muito devota, rezei bastante, participei de
procissões, de celebrações de Semana Santa, com fé mais ou menos titubeante.
Automática e formalmente.
Ao tornar-me adulta comecei a questionar comigo mesma se todo
aquele ritual seria necessário para pregar a palavra de Deus... E comecei a
perceber que, nem todos os fiéis que iam às missas infalivelmente, agiam
corretamente no dia a dia. E via na vizinhança as beatas tão “santinhas” que
criticavam tudo e todos...
E li muitas biografias de santos, que me impressionaram de
verdade. Santa Maria Goretti, São Sebastião, São Tomás de Aquino, Santa
Terezinha do Menino Jesus, São Francisco de Assis e tantos outros... Que até
esqueci. Comecei a comparar a verdade pregada e a verdade que acontecia. E
depois em História da Humanidade, li sobre a Inquisição da Igreja na Idade
Média, que queimou pessoas vivas inocentes a pretexto de bruxaria... As Guerras
Santas... Em nome de Deus mataram tanta gente. Tudo isso me desencantou.
Mais tarde leria e veria filmes terríveis sobre a Ku Klux Klan...
E seus adeptos brancos e loiros eram fervorosos seguidores da Religião Cristã,
oriundos das terras europeias.
Aos poucos fui me desencantando da Igreja e de seus padres... A
pregação boa não era ouvida e poucos cumpriam os ensinamentos do Evangelho. Era
tudo apenas fachada para todos posarem de bonzinhos, mas na realidade eram
pessoas muito cruéis e cheias de preconceitos burros.
E estudando a História das Civilizações percebi como a humanidade
foi terrível com os negros, os aborígenes, os ilhéus, os habitantes de outras
latitudes. Sofri na pele a discriminação de colegas na escolinha rural, porque
nasci japonesa. Naqueles tempos, há mais de sessenta anos!
Com o passar do tempo ao me socializar, acabei adotando o Natal.
Lembro-me que, já adolescente fui ao sítio de meus pais em Tabajara, e meus
irmãos estavam trabalhando na roça. E era dia de Natal! E nunca havíamos
comemorado essa data. Penalizada de meus familiares, fui ao quintal e peguei um
frango e o depenei. Em seguida peguei umas espigas de milho verde. E fiz uma
panela grande de frango com milho verde. E foi uma alegria para todos! E foi o
meu primeiro Natal. Tão simples, tão rústico mas feliz de ver o sorriso
estampado nos semblantes de pessoas queridas... Foi o meu Primeiro Natal! E foi
o Melhor de todos que vivi.
De lá pra cá tive Natais e mais Natais. E fui à Missa do Galo,
que era celebrada à meia noite mesmo, pelo reverendíssimo Padre Epifânio
Ibañez. E tive Ceias, umas boas, outras nem tanto... E adotei o costume de
presentear meus filhos...
Hoje, porém, não celebro mais isso. Natal se transformou em
Festa Pagã. A humanidade toda usa o Natal como a Noite de comes e bebes, de
festas, de presentes, de ceias, de consumismo puro. E eu sei que Natal não é
isso. Parece que nesse dia, todos têm a obrigação de ficar felizes, mesmo que
não tenham motivos para isso.
Os dingo bells que tocam sem parar, as luzes que piscam sem
cessar dão um tom de artificialidade, que nada têm a ver com o Nascimento de
Jesus.
Natal para mim é um tempo de reflexão, de renovação para a vida,
para firmar novos propósitos para seguir os caminhos traçados. É um tempo de
balanço das atividades realizadas durante o ano, de programação de outras em
favor dos irmãos, de purificação.
Natal não é o peru, o Chester, a leitoa recheada, o arroz de
festa, a champanhe, a cerveja, as castanhas, o Papai Noel.
Natal é tempo de União, de Perdão, de Paz em família. Só isso.
Tempo de abraços sinceros e reais.
Acho que não só é para Drummond que um anjo disse: “Vá ser
gauche na vida!”
Porque também sou avessa, torta, antiquada e esquisita.
Mas, Feliz Natal para todos! (automaticamente)
Mirandópolis, dezembro de 2015.
kimie oku in
http://cronicasdekimie.blogspot.com.br/
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