Seis anos depois...
Parece que foi
ontem...
Minha amiga senhora Natsuko,
genitora do nosso querido médico Dr. Roberto Yuassa morava sozinha. Já era bem
idosa e eu ia visitá-la regularmente, para aprender a língua japonesa. E ela,
tranquila, fina e delicada foi me ensinando tantos procedimentos corretos e
falares, que eu desconhecia na minha profunda ignorância da cultura japonêsa.
E volta e meia ela chorava de tristeza, com saudades de seu esposo que partira bem antes e do jovem neto Júnior, que havia ido tão precocemente... Eu ficava desolada, vendo-a derramar lágrimas
de saudades... E um dia, me ocorreu que seria tão bom se eu pudesse levá-la ao
campo, num lugar bem aprazível, para respirar o ar puro e curtir o som dos
passarinhos cantando... Para enxugar essas lágrimas...
Passado um tempo, o Senhor Mário Varela, empresário e pecuarista
local que eu nunca vira antes, apareceu em casa de repente e disse: “Vim comprar o
seu sonho! O sonho de ajudar os idosos!”
Fiquei atarantada, sem saber o que dizer. Mas, o senhor Varela
que é rápido no gatilho, apesar de na época já ser uma pessoa idosa, foi reunir
amigos que pudessem entender a minha intenção.
Nessa época, a dona Natsuko não tinha mais condições de
participar da Ciranda, devido à idade e às condições debilitadas de sua saúde.
Gostaria tanto de tê-la levado pelo menos uma vez... Tempos depois, ela veio a
falecer. Amiga Yuassa sama... Inspiradora da Ciranda. A ela, minha gratidão eterna, pela gentileza de seus ensinamentos e pela inspiração da Ciranda.
Importante, porém foi estabelecer três regras fundamentais:
O Grupo Ciranda não teria
O Grupo Ciranda não teria
- conotação política,
- conotação religiosa,
E assim, partimos a fim de convidar as pessoas. Encontramos muita resistência, porque pessoas sós e esquecidas são muito desconfiadas. Era também época de campanha eleitoral, e percebia-se no olhar que desconfiavam que pediríamos votos... Muitos nem quiseram ouvir nossas propostas... E morreram tristes e sozinhos algum tempo depois. Foi uma pena!
Apesar de tudo, conseguimos juntar treze idosos e realizamos o encontro. Foi no dia 15 de outubro de 2010, Dia do Professor. Como
não tínhamos um lugar definido, fomos ao Restaurante Cozinha Caipira, a oito
quilômetros da cidade. E lá conversamos bastante. Alguém levou um violão, e as
pessoas ensaiaram timidamente algumas canções. Lembro-me que o professor
Walther foi, assim como a esposa Rachel. Como estava fraco das pernas, o Milton
e uns amigos carregaram o Professor numa cadeira de varanda, do carro até o
interior do Restaurante. E brincamos de Ciranda. Algumas pessoas declamaram,
outras cantaram. Foi uma brincadeira de criança, protagonizada por adultos.
E a partir de então, viemos realizando esses encontros
mensalmente, sem falhar. Só não nos reunimos no mês de dezembro, que é meio
atropelado para todos do grupo de apoio.
Logo, outros amigos foram se agregando ao grupo, como a Flora
Forte, a Poliana Ventura, a Isabel e o Zé Maria de Carvalho. Depois, vieram o
Professor Gabriel Carbello, o José Antonio Lima, a Vina Ramires, o Oswaldo Resler, a Maria José
Braga Candil, a Fátima Sanches, a dona Aurora Florindo, a Dimar, a Leonor Rezeke.
Convidei muita gente que teria condições de ajudar o grupo, mas se recusaram,
dizendo que não tinham tempo. E eram todos aposentados... Difícil arrebanhar
voluntários... As pessoas não sentem empatia pelos idosos esquecidos... Não
pensam que também serão velhos e esquecidos, um dia. Até hoje não entendo essa indiferença.
Percebi com muita tristeza que, muitos idosos são ariscos
e não aceitam esse tipo de lazer. A princípio, andei convidando umas pessoas
que realmente precisavam para espantar sua total solidão, mas parece que a timidez ou o orgulho falaram mais alto e não aceitaram. Convidei uma vez, duas vezes, três e... Acabei desistindo. Tem gente que
não aceita ajuda, apenas por orgulho. Desventurados! É tão bom ser simples e
aceitar os convites da vida, para viver melhor. E reconhecer que todos têm
limites... E que todos nós precisamos demais uns dos outros, para tornar a vida
menos áspera. Barreiras de orgulho e preconceitos tolos... Somos todos pobres de Deus, e todos precisamos da companhia de outras pessoas, para amenizar a solidão.
E com essas e outras chegamos aos seis anos de Ciranda. Nesse
período perdemos uma porção de amigos, que partiram de mudança, outros que
desistiram da Ciranda por problemas na família. E outros que foram cirandar no
céu como o senhor Egídio Vicente, que foi fundamental no começo da Ciranda, a
dona Luisinha Cury, o senhor Aristides Florindo, que foi meu chefe na Escola
Ebe Aurora, o Jorge Cury, que se apaixonou totalmente pela Ciranda, o Professor Walther Sperandio, a
Lourdinha Codonho, a Maria Menegatti, a Palmira Martins, o divertido Toninho do
pandeiro, a Onofra Nunes, o Lupércio Salvá, o seu Marcolino... É natural que tenha
havido tantas mortes, porque somos todos idosos, e uma hora alguém tem que
partir... Então, estabelecemos que não faríamos
homenagens a quem quer que morresse. Apenas proporcionaríamos um pouco
de lazer enquanto vivos. E mesmo nos aniversários, nada faríamos de especial
para a pessoa, a não ser cantar e cumprimentar, para não discriminar ninguém. E
assim, viemos fazendo em nossas tardes de ciranda. Tudo em paz, sem desentendimentos.
e seis encontros, em que cantamos, contamos piadas, declamamos, fazemos orações e brincamos de roda, como se fôssemos crianças... Aliás, nessa hora, todos se tornam crianças e revivem os tempos inocentes da infância. E o melhor de tudo é dar as mãos aos parceiros da direita e da esquerda, para todos sentirem que há alguém segurando firmemente a mão, e passando só energia positiva... Nessa hora, há uma comunhão de sentimentos pelo bem estar de todos. Uma roda, uma mandala, um círculo só de forças positivas. Energia pura.
A Ciranda só quer ajudar pessoas idosas, que passam seus dias
numa solidão sem fim. Então, quem tem seus grupos sociais não precisa da
Ciranda. Só convidamos algumas pessoas, porque o espaço não é tão amplo, e
precisamos respeitar o pessoal da Chácara.
E na sexta feira passada, dia 21 fizemos um almoço de celebração
pelos seis anos de Ciranda. Para nossa decepção, o seu Mário Varela passou lá para nos cumprimentar e não ficou, mas a sua esposa dona Zilda participou da festa.
Estavam presentes setenta e duas pessoas, somando os cirandeiros e familiares
que estavam de visita, os organizadores e os anfitriões. Para mim, foi muito
gratificante ver os filhos de meu antigo chefe Aristides Florindo, que foi
cirandar no céu. Dona Aurora veio acompanhada dos filhos Júnior e Adriana, que
vi crescer e hoje são adultos pelejando pela vida. Vieram também o Milton Lima
e sua esposa Remir que moram na Ilha, mas que volta e meia comparecem para
rever os amigos. O Milton foi o esteio da Ciranda, sempre resolvendo os
problemas que surgiam e facilitando a vida de todos. Foi a peça fundamental
para estabelecer e estabilizar o grupo.
E a presença especial do pessoal do Jornal Diário de Fato, que
ao longo desses seis anos, vem nos prestigiando e cobrindo nossos encontros.
Alice Barravieira e seus filhos Eloice e Allan, que acabaram se tornando
membros queridos da Ciranda.
E não poderia encerrar esse relato sem citar os responsáveis
pelo sucesso da Ciranda, os músicos! A Ciranda é sempre animada por pessoas
especiais, que vão lá tocar seus instrumentos e proporcionar alegria a todos.
Albertino Prando é um sanfoneiro de mão cheia, que há cinco anos nos acolheu em
sua casa, e nos alegra com o som maravilhoso de seu acordeão. Convidados por
ele, outros músicos da cidade se juntaram: a dupla Gerval no acordeão e o
Jovaninho no violão, o Zeferino Coqueiro com seu violão, o João sem Terra
cantador, o Valdenir violeiro e cantador, o seu Agenor Garcia cantador, o Agnaldo e seu pandeiro, o
Wesley com seu cajon... E a turma da Ciranda que forma um coral
maravilhoso cantando as músicas caipiras do nosso cancioneiro.
Tudo convergiu para o sucesso da Ciranda. E ao terminar a minha explanação sobre o sucesso da Ciranda,
por sugestão do seu Garcia, fizemos uma oração em agradecimento, pelos seis
anos bem vividos e convividos pelos cirandeiros.
Depois, foi a degustação do delicioso almoço.
E só cantoria pela tarde
toda.
E viva a Ciranda!
Mirandópolis outubro de 2016.
kimie oku in