terça-feira, 3 de julho de 2018


               Não sou árvore!  




Sempre que vejo cipós e plantas trepadeiras fico pensando em nossa necessidade de locomoção. Os vegetais em geral são estáticos como os postes que o homem finca no chão, mas acredito que todas as árvores gostariam de sair do lugar e ver outras paisagens.
      As árvores nascem num determinado ponto e lá permanecem até acabarem secando, sem nenhuma possibilidade de mudar de ambiente de per si. A mudança dessa condição só ocorrerá vindo de fatores externos, nunca de vontade própria. Mas, penso que até as árvores desejariam caminhar, conhecer outras árvores, outras folhagens, outros troncos, outras flores...
     Quando passa uma brisa, as folhas se sacodem e parecem estar se comunicando com outras folhas. Se é um vendaval, até os galhos se agitam, revoluteiam e parecem estar se defendendo...
Reparem quando as folhas de outono estão espalhadas pelas calçadas e subitamente sopra um vento. As folhas que não pertencem mais às árvores começam a bailar, rodopiando no chão e às vezes até se elevando a alturas nunca sonhadas... Já vi flores róseas de primavera executando uma dança incrível no meu quintal, desenhando espirais e círculos sem parar... Então, elas têm vontade, têm desejos enrustidos de andar, de rodopiar, de dançar. As folhas e as flores assim caídas realizam um desejo da árvore de onde vieram e, executam movimentos proibidos a ela. Quando penso nisso, lembro-me de Sartre, o filósofo do Existencialismo que abordou a questão da náusea de viver... Árvores centenárias ou milenares habitando o mesmo lugar por séculos e séculos, vendo o mundo sofrer transformações, exaustas de existir  dia após dia, cansadas de viver porque são fracas demais para morrer...
      Também o homem que não achou sentido em sua existência sentirá náusea de viver. Pra quê lutar e pelejar com forças hercúleas, se as pernas estão irremediavelmente condenadas a apodrecer? (expressões de Jean Paul Sartre)
      Ler Sartre dá um nó na cabeça de gente desavisada, porque ele vai fundo na análise do Existencialismo e na falta de sentido da própria existência, provocando a desesperança e desgosto de viver...
      Mas, voltando ao movimento de que são dotados os homens e os animais, ainda penso no desejo das árvores de se moverem, nem que fosse um pouquinho. Há ervas fraquinhas que conseguiram realizar isso, com sucesso. São os cipós e as trepadeiras, que se enroscam em muros e cercas, em árvores mesmo e lá do alto jogam suas flores, suas folhas e seus frutos, como o maracujá, o chuchu...
       E todos os homens e animais têm a vocação de caminhar, de andar por aí, mesmo sem destino. Em geral todos se mobilizam por uma razão fundamental, que é a procura de provisões para se alimentar. Comida não chove do céu...
       Entretanto, ultimamente tenho reparado que pessoas idosas estão cada vez mais confinadas em seus cantinhos, diante de uma tevê assistindo a tantas bobagens e se esquecendo da vida que flui ao seu redor. Pessoas que se levantam apenas para ir à mesa se alimentar, ao banheiro fazer suas necessidades fisiológicas e à cama repousar... Tenho visto amigos que elegeram o sofá e a tevê como limites de seu mundo, de seu cotidiano e não se importam mais com nada, porque passaram a viver numa bolha. Ora, o corpo humano assim como o dos animais foi feito para ser flexionado, para ser estendido, realizando movimentos sempre. É tal qual uma máquina, que precisa funcionar continuamente, para não perder sua função. Máquina parada por meses e anos acaba se travando, se enferrujando. E aí o movimento se torna impossível.
       Tem gente que ainda não descobriu as academias, as hidroginásticas, as clínicas de Fisioterapia. Todos os idosos deveriam frequentar um desses lugares para mexer o seu corpo e conservá-lo em funcionamento.
       Aposentar-se não é parar de viver.
    Grande parte de aposentados deixa de realizar atividades que o manteriam funcionando como um ser vivente e desistem de andar, de circular pela cidade, de realizar compras, de visitar parentes e amigos, de se preocupar com os vizinhos, de cuidar de outros que precisam de ajuda.
     Enquanto no mundo todo há centenários que levam a vida em comunhão com a natureza, procurando uma forma mais saudável de terminar seus dias, vejo por aqui, gentes que desistiram de viver, que estão apenas esperando a morte chegar.
 A vida é tão preciosa! Vamos saborear esse vinho até a última gota. Vamos imitar as trepadeiras, vamos nos enroscar em cercas e alambrados da vida e sentir até o fim os doces haustos do ar, do sol, e da luz.
Morrer de forma gloriosa, porque a vida é prêmio que só acontece uma vez!

Mirandópolis, julho de 2018.
kimie oku in


Nenhum comentário:

Postar um comentário