quinta-feira, 20 de junho de 2013



                                               Babá de netos
    Há um tempo atrás assisti a um documentário do Discovey Channel, sobre avós idosas cuidando de crianças no México.
         Isso foi mais ou menos há uns dez anos. Lembro que fiquei muito indignada, com a falta de respeito dos filhos para com as velhas senhoras, suas mães.
         Havia avós de mais de oitenta anos, cuidando de cinco a seis crianças, filhos de seus filhos, para quem ela cozinhava e lavava suas roupas.
         E o mais trágico é que a maioria das vovós-babás não recebia nenhuma ajuda dos pais das crianças. Os genitores em sua maioria eram jovens que viviam na rua se drogando, completamente perdidos. E quando apareciam, era só para trazer mais uma cria, para acrescentar à numerosa prole, sob o encargo da velha mãe-avó.
         Fiquei tão escandalizada ao assistir ao documentário, mais ainda porque o repórter anunciava que havia bairros inteiros, com vovós nessas condições. Isso foi mais ou menos há uma década.
         E de repente, comecei a constatar que no Brasil a moda pegou também. Tem tanta gente pondo filhos no mundo, sem nenhum planejamento, e quando as coisas começam a dar errado na vida do casal (porque ainda é preciso um casal para gerar filhos), cada um segue um caminho diverso, e jogam os netos para as avós cuidarem.
         Eu sou avó e cuidei da única neta quando era pequenina, por um breve tempo, para a mãe dela se aprumar na vida, e sei que a relação de avós versus netos é até mais forte que a relação de pais e filhos. Não sei explicar, mas além do carinho natural, acho que entra mais compreensão, mais tolerância, mais experiência e mais paciência, que a gente adquire com o amadurecimento e o passar dos anos.
         Por tudo isso, acredito que avós não conseguem ignorar netos, que os pais abandonam, tão irresponsavelmente. E então, acabam assumindo a tarefa de cuidar deles, mesmo não tendo condições físicas para tal mister. É coisa de sangue, de pele, de herança genética.
         Deus fez a natureza tão certinha, que todos os animais cuidam de sua prole. As vacas, os cães, os pássaros, as galinhas e até as onças e os leões não se furtam a essa missão. A única exceção parece que é o chupim, que por comodismo não faz ninho e, bota ovos em ninhos alheios. Como resultado, seus filhotes são criados por outros pais. Exatamente como está ocorrendo com a humanidade.
         Ultimamente, tenho conhecido mulheres que têm filhos de três homens diferentes e vivem com um quarto numa boa, fazendo mais filhos. Os outros filhos todos sob a responsabilidade dos avós, ou com os pais em outras localidades. E são mulheres de trabalhadores braçais, gente que mora em sítios e fazendas. E encaram tudo com uma naturalidade espantosa.
         Mas, não é só isso. Tenho amigas de certo nível cultural, que foram reduzidas a babás de netos, porque os filhos não dão conta deles. E essas amigas não são novas, não! Todas elas pelejaram a vida toda, para ajudar na manutenção da casa e, criaram seus dois ou três filhos, com muito sacrifício. E sonharam com a bendita aposentadoria.

         Mas, quando ela chegou, houve uma rasteira dos filhos. Estes foram se casando, fazendo filhos e separando das caras metades, por mil razões que não nos interessam. E como resultado, a avó aposentada ficou com um bebê no colo, porque os genitores não confiavam em outras babás.
         O primeiro neto os avós acolheram com alegria, pois veio preencher um vazio em sua vida e sua casa. Mas depois, vieram outros e outros... E os avós cansados, com dores na coluna, dores nos joelhos, dores nos ombros não puderam recusar-se. A casa se transformou numa creche, que foi se enchendo de mamadeiras, fraldas, brinquedos, bolas, banheiras, colchões... remédios. Não podiam recusar-se porque seria discriminar uns filhos de outros... E assim, a vida das pobres aposentadas se transformou num calvário. Tenho uma porção de amigas nessas condições, que não estão aproveitando a aposentadoria para descansar, mas estão amarradas definitivamente à tarefa de criar filhos dos outros. Netos? Mas não são filhos seus. E elas já cumpriram sua missão de criar sua prole.
         Ajudar a filha ou a nora a se recuperar do parto, por uns tempos é natural, porque não é fácil assumir a maternidade com o corpo sem condições. Mas, daí a trazer a mudança do bebê para a casa dos avós, acho que é o cúmulo da falta de respeito.
         Os jovens pais de hoje têm que assumir seus filhos, como nós assumimos os nossos em nosso tempo. Não importam as diferenças do casal, eles geraram o filho, eles que cuidem dele, assim como os pássaros fazem. Nunca vi em minha vida, um pássaro-mãe levar o filhote para o ninho de outros para cuidarem dele. Nem uma gata faz isso. Nem uma cadela.
         Então, por que isso virou moda?
         A mãe trabalha? Nós trabalhávamos também.
       Não tem como manter uma babá? Economize em roupas, sapatos e perfumes, que dá, sim!  Economize nas badalações sociais, que isto custa muito, e sobrará dinheiro para uma boa babá.
         Ou então, leve a criança para a creche. Hoje, as creches estão recebendo até bebês. Tem medo da criança não ser bem tratada? Vá lá, confira como ela é assistida, compareça às reuniões, converse com as cuidadoras. Fique de olho, pois é seu filho, e de mais ninguém.
         Avós são culpadas? Pode até ser. Mas, elas têm pena de sua filha ou nora, que vive atropelada, que vive numa correria. Mas, essas avós também já correram muito quando criaram seus filhos, e não havia ninguém disponível para ajudá-las. E quem é que tem dó dessa avó desorientada e toda estropiada de dores?
         Quando a gente passa dos sessenta anos de idade, não tem mais aquele pique para carregar peso, cumprir horários e estar atenta a tudo que ocorre ao redor. A gente se cansa facilmente. É difícil ficar mais de dez minutos em pé. Os anos pesam e tudo é feito em ritmo mais lento, mesmo porque o corpo não responde como antigamente. É por isso que existe a aposentadoria, para diminuir os encargos e viver devagar, sem atropelos...
       
        Exigir que uma aposentada de sessenta, setenta anos cuide de uma criança ativa de três, quatro anos de idade é o mesmo que pedir a ela que participe de uma maratona de cinco mil metros. Mesmo que, seja por meio período diariamente, é exigir demais de suas forças e sua capacidade.
         Receber o neto uma vez ou outra é um prazer imenso para os avós. Mas fazer disso uma coisa permanente é peso demais para gente idosa, que quer sossego apenas. Neto não deve ser transformado em tormento.
         Portanto, jovem, se você tiver filhos, assuma-os, não apele para a mãe ou sogra, ou tia, porque a cria é sua e é você que deve cuidar deles.
         Deixe de ser chupim de sua mãe ou sogra.
         Elas devem ser respeitadas.

         Mirandópolis, junho de 2013.
         kimie oku in http://cronicasdekimie.blogspot.com
        

         

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