segunda-feira, 9 de dezembro de 2013



                               Viver por viver
     Estive conversando com uma senhora não tanto idosa, que vive  praticamente sozinha, e ela me contou que não tem nenhum objetivo nesta vida. Vive por viver.
         Ouvir isso me deixou arrepiada. Como é que uma pessoa pode viver por viver? Sem um objetivo sequer? Acho isso impossível.


         Todos os seres vivos têm um objetivo: a cigarra vive para cantar no Verão. A formiga vive para abastecer provisões, para garantir a subsistência da família no Inverno. O cachorro vive para cuidar do seu território e de seus filhotes. As plantas vivem para fornecer flores e frutos e sombras... Tudo tem sua razão de ser, de existir. Agora, uma senhora dizer que não tem nenhum objetivo, pra mim é demais.
         E ela disse que ouviu numa certa palestra, que todo mundo tem que ter um objetivo (mokuteki em japonês). Após a palestra, foi para casa e ficou pensando, pensando, nem dormiu à noite, porque não achou nenhum objetivo em seu viver...
         Enquanto ela comentava isso, alguém lhe perguntou: “Por que não cria um bichinho?” E ela: “Bichinho prende a gente em casa, e prende pelo coração, que se morre, a gente sofre muito. E se a gente morre primeiro, como fica o bichinho?”“ E você não gosta de cultivar flores?” “Gosto, mas quando quero ver flores, vou a uma floricultura”.
         Olha, achei o caso sério demais, como pode uma pessoa ir pela vida, como um barco sem destino levado pelo rio?
         O normal de todas as pessoas é ter uma meta, um alvo na vida. Os jovens querem ficar adultos logo, para se emanciparem, para ter carteira de motorista e dirigir. E aí, o sonho é ter um carro. E ter um namorado ou namorada, casar, constituir um lar, ter filhos.
         Bom, ela já passou por tudo isso, é viúva e não tem compromissos com ninguém, pois o filho com quem convive é adulto e não depende dela.
         Acho muito estranho, porque também estou quase nas mesmas condições dela, mas todos os dias tenho várias metas: fazer exercícios para evitar dores no corpo, preparar uma refeição gostosa e saudável, bordar para cultivar o lado artesanal feminino, tocar piano para ouvir melodias, estudar a língua de meus pais, para conhecer mais sobre o Japão, conversar com os amigos pelo face book, escrever crônicas para compartilhar ideias com os  leitores e, orar pela segurança e saúde de familiares... São pequenas metas, que me estimulam todos os dias a continuar vivendo e pelejando. Metas que, levam ao objetivo maior que é viver bem, ser feliz e não desperdiçar os momentos, que Deus vai me concedendo.
         Deve ser muito triste não ter uma meta, uma razão por que lutar, se empenhar. Porque seria tanto faz como tanto fez... Que a água vá para cima ou para baixo... Nada importa. C’est toute la même chose...
         Chegar a esse nível é o mesmo que se congelar, deixar de viver, como uma folha seca levada pelo vento, sem lutar, sem se defender, sem se importar, despreocupada com o que poderá advir...
         Mas, essa conversa me fez prestar atenção em mais pessoas idosas ou não, que ao se aposentarem se entregam a uma tristeza sem fim, achando que o mundo acabou. Meu Deus, a vida não é só trabalho! Há tanto que se aproveitar, que curtir, que desfrutar.
         O aposentado tem tempo para conversar com amigos, visitar gente querida, ajudar algum vizinho doente, fazer um mimo bordando ou crochetando, para dar de presente a alguém que foi gentil com a gente. Conversar com o carteiro, com a margarida que passa varrendo a rua, dar-lhe um cafezinho, ir pescar, andar pelas ruas da cidade, para conversar com algum conhecido, ir ao bar da esquina tomar um cafezinho. Essas pequenas ações é que fazem a nossa ligação com o mundo, com a sociedade.
         Ficar no cantinho da casa, lamentando a tristeza da solidão, do abandono é o mesmo que aguardar a morte. E a vida é tão breve. O momento que passa não volta mais. Por que desperdiçá-lo suspirando? Esse minuto que não volta mais deve ser usado cantando, dançando, fazendo exercícios com os braços, caminhando com amigos, papeando com familiares. Mais tarde, alguém já terá partido e, as coisas não conversadas serão motivo de mais tristezas e remorsos. Aí, a lamentação vai crescer mais.
         Toda pessoa deve ter uma meta pelo menos por dia: dar uma pequena caminhada, ler algo interessante, dar um telefonema para aquele amigo ou parente de quem não se tem notícias, consultar o médico para descobrir as causas das dores na coluna, no joelho, no ombro... Isso significa zelar de si próprio, para não onerar ninguém com o desconforto da dependência. Porque se a pessoa não tem objetivo e não se cuida, vai descobrir um terrível objetivo mais tarde, que é se livrar da dependência de alheios, quando isso for praticamente impossível.
         Dizem que o choro é a manifestação de pena de si mesmo. Acredito que seja mesmo. A gente chora quando fica muito decepcionada, quando leva uma rasteira, quando perde uma pessoa querida. Chora de dor da perda, de comiseração de si mesma. E isso é uma coisa boa, serve de catarse, para aliviar a alma. Depois do choro vem o sorriso, o alívio. Então, é muito bom chorar para desafogar o peito, que parece explodir de mágoa, de tristeza, de dor. E isso acontece esporadicamente. Ninguém vive chorando constantemente, porque o choro é uma válvula de escape. Limpa a alma.
         E as pessoas que vivem travadas, sem uma esperança, um sonho, um desejo? Será que choram? O choro levaria a uma decisão com certeza. Decisão de descobrir um objetivo, uma meta, uma razão de viver.
         Gostaria de ajudar essa amiga que não tem nenhum objetivo, para que a sua vida seja mais agradável e cheia de esperanças... Entretanto, não sei o que lhe dizer. Como fazer uma pessoa normal retomar o gosto pela vida?  E a vida é tão breve!
         Talvez a convide para participar da Ciranda, onde aparecem tantas pessoas solitárias, querendo amizades, carinho, companhia...
        
         Mirandópolis, novembro de 2013.      
         Kimie oku in http://cronicasdekimie.blogspot.com.br/




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