quinta-feira, 9 de junho de 2022

 

        Porque já fiz oitenta anos...

      Viver oitenta anos é um privilégio concedido a poucos.

Honestamente nunca pensei que viveria tanto.

Só que no limiar da vida, a gente fica só olhando pra trás e pensando como poderia ter vivido melhor, sem errar tanto, sem cultivar mágoas, sem discriminar pessoas, sem ter sido tão exigente...

Porque nessa altura da vida, a gente percebe que somos apenas uma carreira de formiguinhas operárias cumprindo uma dura missão: alimentar e proteger a prole. Apenas isso. Nada mais importa.

Vivi os primeiros vinte anos querendo ser alguém... Depois passei trinta anos trabalhando incansavelmente para melhorar a vida de crianças e jovens.  Apesar de nunca ter sido reconhecida como Educadora na verdadeira acepção da palavra, tive momentos maravilhosos nessa missão de ensinar e aprender.  Acho que mais aprendi que ensinei. Conheci crianças simples, inocentes, completamente ignorantes dos problemas do mundo, que se tornaram cidadãos honrados e trabalhadores, dos quais muito me orgulho.

Nos últimos trinta anos aposentei o relógio e vivi para a minha família e para mim. A ironia dessa fase é que quando eu me tornei disponível, meus filhos já não estavam mais em casa, tinham partido para procurar seus destinos. Mesmo assim, pude curtir a neta.

E nesses trinta anos pude cuidar de mim, pensar em mim, viver por mim. Fazendo o que gosto de fazer como ler, tocar piano, escrever, estudar a cultura e a língua de meus ancestrais. Nunca fiquei depressiva, porque o tempo foi sempre muito limitado para tudo isso. Conheci muita gente maravilhosa que me apontou caminhos, que me indicou e emprestou livros em nihongô/japonês. Gostaria de ter começado esse estudo mais cedo, mas... o tempo!

Hoje, já antevejo o fim dessa jornada e quero viver plenamente, sem remorsos. Por isso, me reservo o direito de aceitar ou recusar propostas. Não aceito propostas ou convites que não me acrescentam nada. Não me preocupo com as opiniões alheias. Vivo como uma roceira, cutucando o chão, plantando minhas mudinhas, colhendo os frutos da época e distribuindo aos amigos.

Com essa idade percebi qual é o propósito de Deus ao nos colocar nesta terra. É ajudar na obra de Deus. Cuidando dos desventurados, entendendo a mão, o coração e doando-se diariamente. Quando faço algo pelo próximo como um agasalho para uma criança, sinto que o dia foi abençoado. E quando recebo uma muda de uma flor ou de um legume, sinto que a bênção é maior...

Como tenho oitenta anos, quero usufruir a vida só cirandando.

Com amigos.

Mirandópolis, junho de 2022.

kimie oku in

http://cronicasdekimie.blogspot.com

 

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