terça-feira, 15 de maio de 2012


          Grafitando

         Ultimamente, tenho percebido que os jovens não estão mais pichando paredes e muros de casas.
É tão gratificante ver uma casa bem pintada, porque melhora a paisagem da cidade, e faz bem aos olhos.
Toda vez que eu via casas ou muros recém-pintados, borrados de inscrições agressivas, pensava na pobreza de espírito dos autores. Não sou contra grafiteiros, mas sou defensora da propriedade, e como tal fico triste, de ver um estranho estragando a pintura caprichada, que alguém pagou. Casa pintada de novo é como se tivesse tomado um banho e se maquiado. E vem alguém e lança sujeira nela...
E sempre que via uma pichação, me lembrava de uma novela coreana famosa, em que uma jovem revoltada com o tratamento diferenciado que recebia do pai, ia às ruas na calada da noite e desabafava toda a sua ira, pintando os muros que via pela frente, com seus desenhos pessoais. E volta e meia, ela ia presa, porque a lei lá era mais dura. Só que os desenhos eram maravilhosos, de uma arte mais moderna, com bastante colorido. Era tão artístico o seu trabalho, que no final da história se torna uma pintora de verdade.
Acredito que haja gente que, tenha vontade de fazer o mesmo que a mocinha da novela, desabafando todo o seu rancor, contra o mundo cruel em que vive. Mas, o dono da casa ou do muro muitas vezes, nem culpa têm da infelicidade do pichador. E, é aí que, acho a pichação uma agressão ao proprietário e à acuidade visual. Uma verdadeira contravenção para a sociedade organizada.
Acho que, qualquer pessoa tem o livre arbítrio de extravasar seus sentimentos, de desenhar o que deseja, de botar prá fora toda a mágoa que sente. Mas, para isso não é preciso estragar a propriedade alheia. Nada é mais decepcionante do que, alguém ver sua obra toda borrada com dizeres ofensivos, que a ninguém aproveita.
Lembro que até há bem pouco tempo, garotos arriscavam a própria vida para deixar suas logomarcas em lugares quase inalcançáveis, só pelo orgulho de carimbar seu nome.  Tudo para a afirmação da própria personalidade.
Felizmente, essa onda passou. Penso que, os jovens de hoje perceberam que isso não leva a nada. Ou que é um desperdício de tempo, dinheiro e energia.
Comentando sobre isso, alguém me disse que esses jovens que faziam essas inscrições, são os mesmos que consomem drogas, e que não lhes sobra grana, para comprar os tubos de spray. Pode até ser verdade, mas prefiro acreditar que os jovens mudaram, que perceberam a inutilidade desses gestos agressivos, contra terceiros inocentes de seu infortúnio.
Acredito que tudo evolui, que mesmo os jovens que consomem drogas por vício, têm consciência de tudo que fazem e do que ocorre no mundo. Muitas vezes continuam consumindo, porque não conseguem se libertar, mesmo querendo e desejando com toda a alma.
Porque a desgraça dos psicotrópicos é exatamente isso: tornar os usuários dependentes de verdade, anulando até os mais firmes propósitos.
 E a respeito disso há que se lembrar do que o Ministério Elohim está realizando aqui na cidade. É um trabalho de recuperação dos dependentes químicos. É louvável essa iniciativa, e penso que toda a sociedade deve participar, pois as vítimas não se restringem aos usuários apenas, mas abarcam todos os seus familiares, que sofrem juntos. E atingem indiretamente outras pessoas, que acabam sendo lesadas, por roubos e assaltos de dependentes desesperados...
Andei pesquisando sobre o Ministério Elohim, e descobri que o seu trabalho é baseado no Evangelho, nas Artes e na Assistência Social. E salvo algum detalhe que eu desconheça, as intenções parecem ser das melhores. Os participantes estão imbuídos do firme propósito de melhorar a sociedade, tentando resgatar vidas humanas perdidas para as drogas. E usam estratégias diferentes, como a dança, a capoeira, a música e a religião. Estratégias tais, que se aproximam mais da realidade dos jovens, do que confinamento apenas.
Sinal dos tempos... Até outro dia, os jovens escalavam prédios para carimbarem seus nomes em lugares impossíveis. Hoje, os jovens mudaram de atitude. Passaram a consumir porcarias, no vão desejo de se afirmarem. Afirmação que conduz à perdição, irremediavelmente.
Pensando melhor, é preferível que os garotos voltem a pichar muros e paredes, do que se autodestruírem.  Os muros e paredes podem se pintados de novo, podem ser refeitos, são recuperáveis. Muros e paredes são apenas matéria inorgânica, que não sofre. Ao passo que, os humanos dificilmente conseguem se libertar das drogas, que os destroem. E o caminho de ida para o mundo dos psicotrópicos, leva para uma viagem de sofrimento atroz, que muitas vezes só a morte pode libertar.
Então, é melhor pichar, grafitar, pintar, borrar muros e paredes, que isso não tira a vida de ninguém, não destrói famílias e relações.
Grafitar ainda é bem mais saudável e inteligente.

Mirandópolis, 8 de maio de 2012.
kimie oku in cronicasdekimie.blogspot.com

P.Scriptum : a imagem  ilustrativa é o Muro de Berlin  de 1,3 km de extensão, grafitado por 118 artistas de 21 nacionalidades , em 1980.

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