terça-feira, 22 de maio de 2012

   A nossa Estação Ferroviária



          Ultimamente tem se falado muito da nossa Estação.
     É que aquele prédio, em estado deplorável, tem incomodado  bastante aos cidadãos, que amam esta cidade.
     E a novidade de que, a União autorizou a reforma do prédio  provocou um frisson, nos meios políticos e culturais.
      Mas, quem sabe a história da Estação?
  Fui pesquisar na Bíblia dos mirandopolenses, ou seja, no livro “Mirandópolis, sua evolução no século XX” de Alcides Falleiros, e descobri com pesar que, muito pouco consta sobre sua construção.
    Entretanto, descobri que a nossa cidade fundada pelo Senador Rodolfo Miranda, e denominada “Mirandópolis” por ele próprio, inicialmente fora estabelecida no Km 50, na Estrada para Lussanvira, antigo povoado que deu origem a Pereira Barreto. Pretendia o Senador, construir uma metrópole no meio da selva, que superasse Araçatuba.
     Mas, a cidade localizada ali mesmo no km 50 da estrada para as Alianças, que se tornara próspera e possuía hotéis, farmácias, bares, restaurantes, serrarias, máquinas de beneficiar café e arroz e casas comerciais ficou conhecida como “Quilômetro Cinqüenta”, porque “Mirandópolis” não pegou.
         A decadência do vilarejo de “Km. 50”  se acelerou com a abertura da Estrada de ferro Variante de Araçatuba – Jupiá,  e com a construção da Estação Ferroviária no  Vilarejo São João da Saudade, que fora  fundado pelo baiano Manoel Alves de Ataíde. Os proprietários rurais começaram a mudar-se para o novo povoado, que oferecia um meio de transporte mais barato e mais rápido, que eram os trens da Noroeste.
        E foi assim que floresceu a cidade de Mirandópolis, cuja parte fronteira seria denominada “São João da Saudade”.  A parte traseira recebeu  o nome de “Paulicéia” por seu fundador Dr. Raul da Cunha Bueno. Sobre a construção da Estação há uma história curiosa.                                                                                            
     Quando o senhor Manoel Ataíde soube que a ferrovia passaria na região, onde ele possuía  cinqüenta alqueires de terras, mais que depressa ofereceu um espaço para a construção da Estação, certo que isso ajudaria na formação da cidade de seus sonhos. Mandou derrubar a mata, queimou a coivara e preparou esse terreno que abrigaria a Estação e onde estão os trilhos para as manobras de trens e adjacências. Aceita a doação, ele começou a vender lotes de terreno e a procura foi grande. Da noite para o dia ele ficou rico, com os lotes que vendeu. E ele cheio de si, mudou de caráter e passou a ser o Coronel, que mandava no pedaço.
      E aí ele fundou o povoado, sacramentando o ato com uma missa rezada numa capelinha, construída bem no local onde está a praça do seu nome. Mandou levantar uma cruz no local, com os dizeres:   “São João da Saudade -  24 de junho de 1934”. Mas, por ser um homem simples, não se lembrou de fazer um registro do ato e, depois que a cruz foi retirada para a construção da nova Igreja, esses fatos foram esquecidos.
         Em 1955, a Câmara Municipal aprovou o projeto de Lei do Vereador Dr. Neif Mustafa, que relembrou os fatos e propôs  considerar o dia 24 de junho como data da fundação, e assim permanece até o dia de hoje.
         Mas, a construção da Estação Ferroviária foi marcada por marchas e contramarchas. Quando a  direção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil houve por bem, construir a Estação no local que está  até hoje, o senhor Ataíde não aprovou a ideia. É que do outro lado era domínio de Doutor Raul da Cunha Bueno, membro de antiga e tradicional família de São Paulo, que possuía muitas terras aqui na região.
         E do lado de lá da estação estava florescendo a cidade de Paulicéia, pelos seguidores de Cunha Bueno.
         Ao saber do projeto da estação, o senhor Ataíde teve uma violenta reação, mandou parar a construção, foi reclamar junto aos órgãos competentes em Bauru, e teve até uma audiência com o Presidente da República, Getúlio Vargas.
         Mesmo com tudo isso, ele perdeu a demanda. A topografia local não o favoreceu, e a Estação foi construída de acordo com os planos da Ferrovia, sem acesso para os moradores da vila São João da Saudade.
         E assim, as duas cidades foram se formando separadas pelas linha férrea e sem nenhuma ligação. O  doutor Cunha Bueno porém, não estava interessado no futuro da pequena vila, e a abandonou à própria sorte, mesmo tendo sido aquinhoado, com a construção da Estação voltada para a vila de Paulicéia.
E os moradores da São João da Saudade ficaram realmente sem acesso à Estação. Só mais tarde, com a instalação da Prefeitura de Mirandópolis é que foram feitas as devidas correções, com o alinhamento das ruas  e a construção da passagem de nível.  E com isso, as duas vilas foram unidas, e se completaram, formando a cidade de Mirandópolis de hoje. 
E revisando a história da linha férrea, os trilhos começaram a avançar mata adentro em direção a Jupiá em 1934. Dois anos depois, em 1936 foi inaugurada a Estação de Mirandópolis.
A partir de então, os trens percorreram o trecho,  vindo de Bauru e seguindo em direção a Mato Grosso, e vice-versa durante décadas, transportando gente, cargas, combustível,  máquinas e gado.
E as Estações passaram a ser o centro da vida social, de todas as cidades, que floresceram ao longo dessa linha férrea. As pessoas embarcavam na estação para viajar, chegavam de viagens, iam receber os que voltavam, e se despedir de quem partia. Na hora da chegada e da partida de trens passageiros, formava-se uma multidão em burburinho, acrescida de ambulantes, que iam até a plataforma vender lanches, frutas e outros petiscos para os passageiros.
         Em 1957, a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil passou a integrar a Rede Ferroviária Sociedade Anônima (REFESA), mas continuaria com a mesma prestação de serviços à comunidade. Essa prestação de serviços perderia em breve, para as linhas de ônibus, que começariam a transportar passageiros com segurança, rapidez e conforto, pelas rodovias que foram abertas. Também o transporte de gado passaria a ser feito por caminhões, que podem adentrar nas fazendas, e carregar os animais com mais facilidade. 
E em 1995, o transporte de passageiros seria desativado de vez e em 1996 a linha passou a pertencer a Rede Novoeste, com a função de só transportar carga.
       Então, a linha não foi totalmente desativada; os trens cargueiros passam diariamente, pelos trilhos da nossa velha Estação Ferroviária, transportando combustível e máquinas. E todas as noites, se ouvem os longos apitos do trem cargueiro avisando que, está indo para algum lugar.
         Da época de ouro dos trens passageiros, ficaram só as lembranças, mas a Estação está firme e  forte, resistindo aos tempos, e aguardando um destino mais glorioso que o abandono, a que foi relegada até agora.
       Quem sabe em breve, teremos a alegria de ver o espaço  ser inaugurado como Centro de Cultura de Mirandópolis?
         Só então, Mirandópolis fará jus de verdade, ao cognome de “Cidade Labor”.

         Mirandópolis, 14 de maio de 2012.
         kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”
        
                                                                                             

4 comentários:

  1. Kimie, mais uma bela crônica.
    Ainda bem que a bitola desses trilhos da antiga N.O.B. é imensamente estreita comparando-a com a sua trilha escribal, que está mais voltada para a de um trem bala.
    Seria a descendência nipônica?
    Parabéns!

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  2. Nos da ONG Gentileza Gera Gentileza e Teatro Trapos e Cacos, Luta e Lutadores, ficamos no local por vários anos, mas fomos vencido pelo abandono e depredação. Agora surgiu uma luz no final do tunel para transformar aquele espaço num imenso laser e cultural. Voce Kimie relatou a historia de nossa estação com preciosidade e essa não pode ser esquecida. Abraços, felicidades. Dinho.

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  3. Prá você escrever isso tem que estar descarrilhado, mesmo! Quem anda na linha certinho, certinho, com certeza não é capaz dessas comparações de trilhas e trilhos de marias-fumaças com trem-balas.
    Ulisses, você é impossível. Agradeço de coração o poder de sua imaginação. Arigatô gozaimasu!

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  4. Dinho, vamos vivendo e pelejando cada dia, movidos por pequenas esperanças. Ainda bem que, há centenas de amigos envolvidos em nossos sonhos de, transformar a velha Estação Ferroviária num Centro Cultural, como Mirandópolis merece. O apoio desses mirandopolenses é que está sustentando o nosso idealismo. Quando esse sonho se realizar, e espero que seja logo, convidaremos todos esses amigos que hoje estão nos apoiando, Dinho.

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