Velhice
De repente, percebi
que a velhice se apossou de mim. E foi devastador o momento em que tomei
consciência disso.
Estou devagar em tudo. Em andar, em
pensar, em entender o que me falam... Ao ver filmes, tenho que voltar várias
vezes para entender a trama da história, principalmente se é legendado, ou
quando as personagens falam muito depressa... Ao fazer compras, preciso de uma
listinha, senão esqueço tudo ou pelo menos alguns itens... Mesmo assim, vou às
compras, porque isso me mantém mais ativa e participativa. E ao sair do
Mercado, às vezes não me lembro onde deixei o carro... Ainda bem que não
esqueci a direção do carro, porque é meio automático.
O grande esquecimento de 2017 foi não
ter lembrado de recadastrar-me no Banco, para continuar recebendo os proventos.
E isso pela terceira vez. E olhe que anoto tudo na Agenda... Mas esqueço de
olhar nele...
Como é triste a velhice! Muitas vezes, encontro pessoas queridas, que
me abraçam fazendo a maior festa e eu...nem lhes sei o nome! Depois que me
despeço, a memória vem! Que coisa!
O pior de tudo é quando me perguntam
sobre algum fato que relatei. A pessoa fica atarantada quando digo que nunca
comentei tal coisa! Aí, fico duvidando
de mim mesma!
Mas, o mais triste é perder as coisas.
Chaves, cartões, documentos, bolsa, óculos... Por isso tenho óculos na bolsa, na
escrivaninha, no criado mudo... Outro dia, perdi a Carteira de Motorista!
Estava com ela na mão e no segundo seguinte não sabia onde a colocara. Só horas
mais tarde, a descobri caída no chão... Quando perco as coisas, a casa fica em
polvorosa. Meu esposo sai
procurando, revirando as coisas e me perguntando onde eu estava, o que fazia,
com quem falava... E isso me deixa mais irritada... A empregada também quer
ajudar e refaz mil vezes os meus passos, os meus atos, e isso me deixa louca.
Então, procuro não alardear quando perco as coisas... Mas eles percebem... E a
tortura recomeça.
Engraçado é que não me esqueço de
preparar as refeições, de planejar o que cozinhar no dia seguinte... Já
imaginaram se me esquecesse de pilotar o fogão?
Também não esqueço os meus crochês, os
meus bordados, os tricôs, o piano, a leitura de livros japoneses, de escrever...
E não esqueço de fazer as visitas às
pessoas queridas e a Ciranda...
Mas, já percebi que pouco a pouco devo
delegar certas atribuições da Ciranda a outros participantes, porque percebo
que não estou dando conta de tudo. (Tenho que anotar isso na Agenda da Ciranda!)
Só pra enfeitar, alguém disse que essa
fase que estou passando é a melhor idade. Melhor idade? Apelido mais
inconveniente e fora de propósito.
Melhor idade é a juventude, é a
maturidade, quando tudo ainda está funcionando. E a gente ainda dá conta de
tudo e está na plenitude para trabalhar, para vencer os obstáculos.
Não estou na melhor idade, estou na
velhice.
A velhice é triste, porque vamos ficando
cada vez mais incapazes para atuar neste mundo. Mesmo não querendo, acabamos
nos transformando em fetos, para voltar ao útero da Terra.
Apesar disso, sou grata por estar na
velhice.
Porque mesmo na velhice há muita coisa
boa também. Um dia, vou escrever sobre elas...
Se eu não me esquecer.
Mirandópolis, 09 de fevereiro de 2018.
kimie oku in
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