sexta-feira, 10 de agosto de 2012



            As Primaveras da Vida

      Agora que estamos no meio do Inverno brasileiro, percebemos quantas árvores estão desfolhadas, com aparência de mortas, apresentando imagens tristes de figuras esqueléticas.
         As árvores, porém, irão renascer quando vier a Primavera, e se cobrirão de folhas verdes e flores coloridas.
         Nós temos o costume de comparar a nossa vida com as estações do ano: Primavera significando a infância até a juventude, Verão significando a formação completa e o amadurecimento, Outono como um tempo de produção e de trabalho, e Inverno como o ocaso da vida.
 Sendo assim, é como se na Primavera da nossa vida, o botão se formasse e florescesse, no Verão preparasse os frutos, no Outono sazonasse os frutos e formasse sementes, para garantir o futuro da espécie, e no Inverno se despojasse dos galhos e folhas secas, para recomeçar tudo de novo.
 Entretanto, não é assim. Isso só ocorre com as árvores. As árvores de beira de estrada, no meio das pastagens, nos pomares, nas matas, que ainda sobreviveram à ganância do homem, se transmudam conforme o tempo vai passando: todas elas, independente de nossa vontade, sentem as mudanças que o tempo impõe, ou seja, despindo-se totalmente, rebrotando com folhas verdes, cobrindo-se de lindas e perfumadas flores, apresentando frutos e sementes... e ... voltando ao novo ciclo.
         Os animais e os humanos não procedem assim. Quando o inverno chega é o fim da vida, e não há retorno. O ciclo não se repete. E é uma pena. Para nós, diferentemente das árvores, a Primavera é só uma vez, assim como o Verão, o Outono e o Inverno. Quem está no ocaso da vida, não terá a Primavera de volta. Não há outra chance de rebrotar, de renascer, de florescer, e de frutificar.
É certo que a nossa Primavera tem longa duração: é a fase que vai do instante que, nascemos como seres totalmente dependentes e incapazes, e descobrimos aos poucos a utilidade das pernas, dos braços e do próprio corpo, até sermos capazes de nos conduzir sozinhos.
O Verão já é o tempo da adolescência, da formação, do amadurecimento, da aprendizagem para sobreviver.
O Outono é mais longo. É o tempo de produção, de trabalho,  de cuidar da prole.
E o Inverno que, deveria ser uma preparação para recomeçar o ciclo, para nós é apenas uma preparação para encerrar o ciclo, para sempre.
Então, quando vejo árvores secas e esqueléticas penso sempre em nós, seres humanos, que ao chegar nessa fase só vai perdendo a vitalidade, até fechar o ciclo. E penso: Como seria se a gente tivesse a oportunidade de repetir as primaveras, os verões e os outonos?
É certo que os animais e os humanos têm a capacidade de procriar várias vezes, de viver uma boa fase de produção, mas a Primavera só dura uma vez, assim como as outras estações.
Que felicidade seria se, ao chegar ao Outono da vida, a gente pudesse retornar à juventude! Sonho de tantas gerações, que já provocou a busca incessante da fonte da juventude, que nunca se concretizou.
Há árvores seculares, que já viram tantas transformações ocorrerem ao seu redor, e continuam firmes, presas ao chão, repetindo, repetindo as mudanças que o tempo impõe: desfolhando-se, rebrotando em galhos e folhas verdíssimas, florindo e alegrando  os insetos e enfeitando o lugar, frutificando para saciar a fome dos bichos e dos homens e novamente, se descobrindo da cobertura verde.
Por outro lado, as árvores podem até se cansar de existência tão interminável, como as existências de seres que pensam no absurdo da vida. Essa questão foi profundamente estudada, pelo moderno pensador francês Jean Paul Sartre (1905/1980).
Sartre levantou a questão da existência inconsciente, em que os seres vivem por viver, sem nenhuma consciência de seu próprio EU nesse mundo, sem nunca atinar com o significado de viver. E propôs que, o pensar é que torna o homem consciente de sua existência. Quem não pensa não tem consciência de seu existir. É como as árvores que repetem os ciclos interminavelmente, por séculos e séculos. Ele considerava a existência de uma árvore gratuita e absurda, sem lógica.
Esse sentimento doentio sobre a Existência foi dissecado dolorosamente em A Náusea, em que o pensador ateu coloca todo o pessimismo diante da vida, considerando-a absurda, sem sentido.
Com ou sem razão, o certo é que suas idéias agitaram os meios filosóficos e, provocaram mais questionamentos sobre o significado da vida, em todo o mundo.
E sem querer, vendo as árvores se vestindo deslumbrantemente outra vez de flores, vem à minha mente, o desejo inconsciente de querer retornar à Primavera.
O que não deixa de ser um desejo absurdo, para quem já chegou à última estação.

Mirandópolis, 10 de agosto de 2012.
kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”

5 comentários:

  1. É Kimie, seu relato das estações é impressionante e lemos e caem-se a realidade da vida, ficamos triste, mas é o vertedouro da existência humana, sempre lembro desta frase "Só Deus é Eterno".Efim perecemos e nada impede a esse destino trágico que nos acometemos. Por enquanto vamos viver, vivendo.

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  2. Você também não queria a Primavera de volta, pelo menos uma vez mais? Quando chegamos à maturidade, sabemos que com sorte, teremos a oportunidade de viver o Inverno, antes de partir definitivamente. E por mais que você esteja consciente disso, não lhe dá um frio na barriga? O que será que existe daquele lado? E para onde vai a nossa alma, hein, Dinho?

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    1. Kimie Oku, ninguém até hoje veio até nós disser o outro lado da vida, aprendemos coisas belas, jardins suspensos, acho que tudo isso é para nós encorajar e preparar nossas mentes para um bom fim devemos acreditar nisso para que nós possamos viver em plenitude sem medo. Mas essa discussão nunca chegará a um fim, vai ser eterna e por isso a vida também é eterna. Vamos viver sempre a primavera e esperar o inverno chegar.

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  3. Bela crônica Kimie. O paralelo que voce traça entre o ciclo de vida da natureza marcado pelas estações do ano e o sentido da vida dos humanos que a habitam nos levam a refletir em tempos de meio ambiente o quanto de responsabilidade temos com a natureza. Ela por sí só faz a sua parte e nós humanos com toda a inteligência somos os curadores dessa natureza. Se não for assim, como teremos mais primaveras?
    Abçs,

    Lupércio Ailton

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  4. É, Lupércio, como teremos mais Primaveras? No sentido lato da palavra, Primavera significando a florescência das árvores e Primaveras nossas de sobrevivência neste planeta,né? Fico tão feliz quando pessoas como você pegam a essência do que estou tentando passar... Um abraço

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