terça-feira, 13 de novembro de 2012


Gente de fibra - Takeshi Kido



Takeshi Kido é um popular Cirurgião Dentista, que durante décadas cuidou dos dentes da comunidade mirandopolense.
É de origem nipônica, mas é brasileiro. Nasceu em 1937, no Bairro Km 50 que foi o berço da cidade de Mirandópolis.
Naquela época, o Bairro do Km 50 era uma pequena cidade no meio da floresta, fundada pelo Senador Rodolfo Miranda, que pretendia instalar uma metrópole na região, para concorrer com a cidade de Araçatuba. Embora pequena, era uma cidade com serrarias, hotéis, farmácias, restaurantes, bares,  máquinas de beneficiar arroz e café, escolas, igrejas, armazéns de secos e molhados... e crescia a olhos vistos.
O sonho do Senador não se concretizou, porque a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil que veio ligar Bauru ao Estado de Mato Grosso, não passou pelo Km 50  e instalou a Estação Ferroviária aqui  onde está até hoje, com o nome de Mirandópolis.
O Senador havia nomeado a nova cidade do Km 50 de Mirandópolis, mas o nome não pegou, pois todos a chamavam de Km 50. E com os trens passando aqui em Mirandópolis, transportando de forma rápida e prática  além de pessoas, até animais, cereais e maquinários, a população de lá acabou se transferindo para cá, mudando de vez a sede da cidade.
A família de Takeshi Kido, que possuía uma Selaria e Sapataria no Km 50, também para cá se mudou, juntamente com todos os imigrantes japoneses, que lá moravam. Seu pai continuou no mesmo ramo de Selaria e Sapataria, para criar os sete filhos, dos quais uma era japonesa, pois nascera no Japão.
Naquela época, os nipônicos que vieram do Japão se organizavam em associações, para não perderem o contato uns com outros. Assim, formaram-se grupos de senhoras, “Fujin-kai”; dos jovens “Seinen-kai”; dos representantes das famílias, os “Nihonjin-kai”. E essas associações cuidavam dos estudos das crianças e jovens, com o objetivo fundamental de conservarem as tradições lá da pátria distante, ensinando-lhes a língua japonesa, os costumes, os cultos e a parte recreativa. No que concerne aos esportes, o forte era o beisebol, que era praticado com muito entusiasmo pelos jovens e adultos de todas as aglomerações de japoneses no Brasil. Assim, havia competições de grupos de cidades vizinhas, de regiões, de Estado e até campeonato brasileiro.
Nessa época, aqui estavam estabelecidas as famílias japonesas dos Amikura, dos Anze, dos Hombo, dos Ijichi, dos Kawasaki, dos Kawata, dos  Koike, dos Kojima, dos Miike, dos Mizukami, dos Mochida, dos Motomiya, dos Nagata, dos Sadano, dos Sato, dos Suguisaka, dos Tanaka, dos Tanikawa, dos Takayanagui, dos Tonossu, dos Yanagui e outras dezenas de agricultores como os Ariki, os Nakano, os Miguita, os Inoue, os Sumita, os Fujikawa, os Miyamaru, os Sassaki, os Shiota ... Grande parte delas se instalou com suas casas comerciais na Avenida Internacional , hoje  Avenida Rafael Pereira.
Anos mais tarde, a maioria dessas famílias acabou deixando a cidade, em busca de trabalho e escolas para estudar seus filhos. Aqui restaram alguns remanescentes desses primeiros japoneses, que acabaram se miscigenando com os brasileiros.
Como não podia deixar de ser, Takeshi também foi educado nos  moldes do sistema japonês, que ensinava a postura correta diante da sociedade e o amor ao trabalho. Assim, frequentou a escolinha japonesa, jogou muitas partidas de beisebol e pertenceu às associações da época. Entretanto, como sua vida era dividida entre Sorocaba e Mirandópolis, nunca assumiu a Direção do Clube Nipo, no que foi cobrado muitas vezes pelos companheiros.
Takeshi fez os estudos iniciais aqui e foi da primeira turma de formandos do Ginásio Estadual, em 1953.  Foi aluno dentre outros renomados mestres, que marcaram época na História de Mirandópolis, do Professor Júlio Mazzei, de Educação Física, que se tornaria famoso como  Preparador Físico do Palmeiras e do Santos; e que levaria o Pelé para o Cosmos de Nova Iorque, que congregou os jogadores mais famosos do mundo. Dessa fase, Takeshi se lembra que o Prof. Mazzei gostava de beisebol e participava de algumas partidas com os jovens alunos, no campo do antigo Clube Nipo.
Seus colegas de Ginásio foram o Natsumeda, o Kamada, o Kazuo Kawamoto, o Toshio Suguisaka, Keitaro Mizukami, Shinzo Amino, Kunitaka Shimoda, Aiko Morita, Akiko Kanazawa, Naoko Suguisaka e Miyuki Mochida.
Como não havia Colégio no local, Takeshi foi enviado a Sorocaba, onde concluiria o Curso Científico em 1956. Em 1957, ingressou na Faculdade de Farmácia e Odontologia de Araraquara. Ao concluir a Faculdade, fez Estágio de Cirurgia Hospitalar na Santa Casa de São Paulo, no Departamento de Odontologia, com o Professor de Cirurgia Bucal, Doutor Mário Grazziani. Com esse Professor, o jovem Kido aprendeu muito sobre os procedimentos cirúrgicos, que viriam ajudá-lo no exercício de sua profissão.
Após a formatura, Kido abriu o seu consultório em 1961, à Rua Armando Sales de Oliveira, numa sala alugada no prédio pertencente ao senhor Mário Koike.
Naquela época, os dentistas estabelecidos na praça eram: Dr. Alcides Falleiros, Dr. Rubens Conrado, Dr. Elzio Bizarri, primo dos Ramires, e Dr. Lago. Havia trabalho para todos, porque a cidade estava em pleno desenvolvimento.
Os pais de Takeshi também se instalaram na Avenida Internacional, que era a principal rua do comércio. Em 1962, Takeshi casou-se com a senhorita Haiko Miura, que nasceu em Paraguaçu Paulista. Eles se conheceram quando estudavam em Sorocaba. Dessa união, tiveram uma filha, que seguiu a carreira do pai, tornando-se Ortodontista também.
Como o Dr. Kido era especializado em Cirurgia Bucal, os demais profissionais lhe encaminhavam todos os casos, que requeriam maiores cuidados. E assim, o seu trabalho se desenvolveu rapidamente. Teve clientes famosos como o Dr. Osvaldo Brandi Faria, os Godoy, Dr. Yoshito Kanzawa.
Seu sucesso foi rápido e em 1964, construiu a atual clínica que possui, mas que está desativada, em virtude de recente aposentadoria.
Como o Dr. Kido pretendia se especializar em Correção Dentária, com a anuência da esposa Haiko, fez o Curso de Especialização em Lins durante dois anos e meio. O curso de Técnica BEGG de Correção Dentária era aos sábados, e para estimulá-lo, a esposa e a filha o acompanhavam. Enquanto ele estudava, elas ficavam no hotel. Foram anos de muito sacrifício, de cansaço, porque a Marechal Rondon era de pista única e as viagens eram demoradas.
Quando concluiu o Curso em Lins, ele frequentou  por mais dois anos e meio,  o Curso de Correção Dentária da Técnica Edwise, ministrado por um Professor australiano, em Bauru. Já nessa altura, ele ia sozinho, mas era muito cansativo, porque trabalhava a semana inteira, e muitas vezes fazia serão até de madrugada, sempre com a ajuda inestimável da companheira Haiko.
Com o passar dos tempos, Dr. Kido percebeu a importância da incrustação fundida, que era mais segura e duradoura. Esse tipo de restauração dentária era feito nos dentes posteriores, quando havia muito desgaste, fraturas e ou grandes cáries. Incrustação dentária era uma restauração do dente lesionado, embutindo-se peças confeccionadas com ligas de  prata ou ouro, para recompor a parte que faltava. Essas peças eram cimentadas no dente, e tinham vida mais longa que as restaurações por amálgama. Atualmente, essas incrustações podem ser feitas com resina e porcelana.
Como os laboratórios demoravam na entrega dessas incrustações, Dr. Kido resolveu ele mesmo, confeccioná-las. Para isso, comprou o material, aprendeu a técnica e produziu as peças que eram colocadas nos dentes dos clientes. Chegou a fazer mais de trezentas incrustações por ano, que era um número espantoso. E isso por mais de dez anos seguidos, trabalhando além do expediente, sempre com a competente colaboração da esposa Haiko. A dificuldade do trabalho se concentrava nos diferentes tamanhos  e formas das peças, devido às características dos dentes de cada cliente.
Além de tudo isso, Dr. Kido foi convidado a dar aulas no Ginásio, porque era necessário um corpo docente habilitado para se instalar o Curso Científico e o Clássico. Atendendo a um pedido do Dr. Neif Mustafa, então Secretário do Colégio Noêmia Dias Perotti, deu aulas de Biologia por uns dois anos. Diz que foram anos duros, porque trabalhava o tempo todo e à noite ainda tinha o compromisso de ministrar aulas aos jovens do Colégio. Até nisso, a esposa Haiko foi a secretária perfeita, anotando os tópicos dos assuntos, que deveriam ser abordados pelo Professor Kido nas aulas...
Além disso, ainda se envolveu com a política local, tornando-se Vereador por uma legislatura, na gestão do então Prefeito Dr. Jorge Maluly Neto, de 1963 a 1966.
E tudo isso, trabalhando de oito a dez horas por dia para atender à clientela. Durante mais de trinta anos, deu assistência à Comunidade Yuba, que pagava os serviços mais em espécie, porque as dificuldades financeiras eram muito grandes. A Comunidade agradecida lhe envia até hoje, frutas e verduras  quase semanalmente. Essa prática se chama "ongaeshi" em japonês, que é um agradecimento  para sempre.
Durante 25 anos, Dr. Kido viajou de Mirandópolis a Sorocaba e vice-versa, porque sua agenda de atendimento era de duas semanas ao mês em Mirandópolis, e duas semanas em Sorocaba.
Em 1987, aposentou-se pelo INSS.
Continuou trabalhando para atender a clientela de longa data, mas problemas de saúde o forçaram a parar. Aos poucos, foi reduzindo o ritmo de trabalho e em 2011, deixou de vez a Clínica. Tem saudades, porém, do serviço de dentista...
Hoje só cuida do gado, que possui numa fazendinha. Faz Inseminação Artificial de Tempo Fixo, sendo o Dr. Kido e o senhor Itio Nakano, os pioneiros dessa técnica em Mirandópolis.
A Inseminação Artificial por Tempo Fixo tem como ponto fundamental a padronização do cio e do parto, e é possível obter sucesso em 55% dos casos inseminados. Em conseqüência, padronizam-se os lotes de gado de corte.  Há sete anos, Dr. Kido está praticando essa modalidade de inseminação, que requer observação, muito treinamento e trabalho. Ele aplica em animais da qualidade “Aberdeen-Angus”, que é um gado escocês e nas fêmeas Mestiças Angus, fertilizando-as com o sêmen do gado “Wagyu”, de raça japonesa.
O gado Wagyu é conhecido internacionalmente como o produtor de carne mais macia e suculenta. E pelos cuidados e tratamento dispensados a esse gado no Japão, produz-se o Kobe beef, que é considerada a carne mais cara do mundo, pela excelência do sabor e da qualidade.
Dr. Takeshi Kido que foi um verdadeiro artesão, e passou horas intermináveis no seu mini-laboratório, construindo pequenas peças que devolveriam a saúde bucal e o sorriso de seus clientes, passa agora a cuidar de produzir gado, que forneça carne de qualidade superior aos consumidores.
Dr. Takeshi Kido, que sempre procurou a perfeição em tudo que realizou em sua vida, seja na profissão, seja nos estudos e em outras jornadas, é sem dúvida alguma, Gente de Fibra!

Mirandópolis, novembro de 2012.
Kimie oku in “cronicasdekimie.blogspot.com”

Legenda das fotos:


1.     Dr. Takeshi  Kido em seu gabinete
2.     Bairro Km 50 em 1936
3.     Avenida Rafael Pereira em 1947
4.     Formatura do Ginásio e amigos
5.     Certificado da Faculdade de Odontologia de Araraquara
6.     Time de beisebol dos Old Boys e torcida
7.     Família Kido (pais, irmãos, cunhados e sobrinhos)
8.     Espadas japonesas
9.     Takeshi e Haiko (meio século juntos!)

4 comentários:

  1. Familiares e amigos do Dr. Kido, entrem no facebook de kimie oku e, verão os comentários que as fotos aqui publicadas estão suscitando. A foto dos Old Boys e torcida provocou um verdadeiro frisson. Pra melhor localizar, vejam a linha de tempo de kimie oku, ok ? Bom divertimento e curtição de saudades.
    Um abraço a todos que admiram o Dr. Kido.

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  2. Esse senhor Takeshi Kido foi meu recuperador dos meus dentes quando era criança, minha familia sempre ia no seu consultorio dentário. Pessoa educada e querida por nossa cidade, pela lembrança Kimie e parabens ao Dr. Kido pelo que fez e construiu. Abraços, familia Resler.

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  3. Da. Kimie, gostaria de parabenizá-la por este dom maravilhoso da escrita.Que Deus a conserve sempre com saúde para que possamos ter o prazer de ler suas crônicas.Obrigada pelas palavras escritas sobre meus Pais...Eu, como filha que se orgulha dos Pais que tem, os admira e ama, fiquei muito feliz ao ler a matéria.
    Eles realmente são gente de fibra !!!
    Um grande abraço
    Mércia

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  4. Mércia, a história deles é muito bonita, principalmente pela persistência de seu pai, e pelo apoio incondicional de sua mãe, que todos nós na cidade ignorávamos. E agora há pouco, este blog atingiu a marca de dez mil visualizações em apenas um ano. E esta história de Dr. Kido já está beirando cinquenta visualizações em apenas dois dias, contribuindo para se alcançar tal sucesso. Seu pai é uma pessoa bastante respeitada e querida aqui na cidade. Com certeza, vai ser lido e admirado por muita gente ainda. E muito obrigada pelas palavras de estímulo. Estou deveras feliz com o sucesso de seu pai. Um beijo!

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