domingo, 13 de outubro de 2013



          A nossa Praça

    Temos em nossa pequena cidade três pontos que definem e a diferenciam das demais cidades. São a Igreja, a Estação Ferroviária e a Praça Manuel Alves de Ataíde.
         A Igreja São João Batista, obra do padre Epifânio Ibañez, de tão bela foi cantada por muita gente. A paixão por essa obra em estilo colonial brasileiro é unanimidade entre todos os que a conhecem.
         A Estação Ferroviária decadente, abandonada às traças já foi também assunto de muitas crônicas e bate papos de amigos.        
         A Praça Manuel Alves de Ataíde já foi a menina dos olhos dos moradores. Já foi. Tinha uma fonte luminosa, cujos esguichos d’água seguiam o ritmo da música, que era tocada nos finais de semana. Era um espetáculo de encher os olhos, porque as luzes iam se alternando em várias cores. Não sei por que, nem quando pararam com esse show. Era muito bonito e as músicas tornavam a praça viva, e atraía casais de namorados, que se assentavam nos bancos de granito e passavam horas agradáveis, apreciando o show das águas e conversando com outras pessoas, que lá iam passear.
       Como em frente havia o Cine São Jorge, todos os jovens tinham o hábito de ficar zanzando na Praça, paquerando as meninas à espera da hora dos filmes. Era o “footing”.

         E como do outro lado há a Igreja, alguns jovens ficavam esperando as moças saírem da missa, para paquerá-las ou marcar encontros, que muitas vezes terminavam em namoros, noivados e casamentos (religiosamente, nessa ordem). Foi assim que ocorreu com a maioria dos casais, que constituíram famílias. Assim foi com a nossa geração.
      Mas, a Praça tem uma história.
         Na década de 30, quando começou o povoado de São João da Saudade, denominação dada pelo fundador Manuel Ataíde em 24 de junho de 1934, tudo aqui era uma grande floresta, onde começaram a chegar forasteiros, em busca de um bom lugar para morar.
     Essa procura era em razão de, estar sendo construída uma linha ferroviária mata adentro, em direção a Mato Grosso, que posteriormente faria ligação de Brasil a Bolívia.
         Nessa época, o vilarejo se resumia a algumas casinhas feitas de madeira, retirada da mata que havia ao redor. Essa floresta densa e fechada tinha sido a morada natural dos índios caingangues, que os primeiros exploradores expulsaram para outras regiões.  Mas, ainda era habitada por onças e outros animais selvagens.

                  Com a certeza de que o progresso chegaria rápido à região, muitos aventureiros vieram para cá e a vila foi crescendo rapidamente.  O baiano Ataíde, que foi o fundador da cidade, percebendo que aqui haveria uma boa fonte de renda, loteou os cinquenta alqueires de terra, que havia adquirido e os vendeu a pessoas que estavam chegando. Por essa época, já a população local estava empenhada em construir uma Igreja, que pudesse abrigar todos os fiéis, uma vez que a pequena capela de madeira já se tornara insuficiente.  E a instâncias das autoridades locais, Ataíde concordou em doar o lote de terra em frente à Igreja, que estava sendo construída, para se construir uma Praça. Impôs uma condição: só doaria o terreno de escritura passada, se a Praça tivesse seu nome. Mas...
    
   Em 1945, o jovem mirandopolense Rafael Pereira, que fora convocado pela Força Expedicionária Brasileira, não voltou dos campos de batalha da Europa. Fora enterrado no Cemitério de Pistóia, na Itália. E os políticos locais, quiseram homenageá-lo denominando a praça de Praça dos Expedicionários, pois uma Lei do Getúlio proibia a prestação de homenagens a pessoas vivas ou mortas, dando seus nomes a logradouros públicos.

         Tudo isso levou a um impasse, porque o fundador Ataíde não aceitava outra opção que dar o seu nome à Praça.  As negociações ficaram paradas um bom tempo. E foi aí que, os Vereadores Savero Tramonte e Alcides Falleiros apresentaram um projeto de lei, que resolveria de vez a questão. De acordo com os termos desse projeto, a Praça ficaria com o nome de Manuel Alves de Ataíde, como justa homenagem por ser o fundador da cidade; e o nome Rafael Pereira seria dado à principal via pública da cidade, que era conhecida como Avenida Internacional. E assim se fez, e permanece até hoje. Isso ocorreu em outubro de 1948.
         Sobre a construção da praça e seu ajardinamento, o livro do Dr. Alcides não faz referências, mas podemos dizer que foi no início dos anos cinquenta, Há fotografias da praça ainda acanhada, quando as obras da Igreja estavam em fase de conclusão, lá pelos meados de 1953.

     
    Houve uma época em que os Prefeitos de partidos políticos diferentes, que se alternaram no comando do município, sem razão aparente, reformavam a praça, dando uma visão diferente da que o Prefeito anterior havia feito. Acho que queriam apagar a memória do outro. Mas, ao longo dos anos, a praça foi ficando bonita, com dezenas de árvores crescendo e fornecendo boas sombras aos passantes, que volta e meia descansavam nos bancos de granito.  E bem no centro, foi construída a belíssima fonte luminosa.
         Além da fonte foi construído um palanque, onde se apresentava a Banda Marcial do Maestro Pavesi, para animar os finais de semana. Sob o palanque foram instalados sanitários, que ficaram ultrapassados, devido aos estragos por má conservação. Recentemente, a Prefeitura instalou novos sanitários.
         A foto colorida de 2003 passou a ser o comprovante de bons tempos da praça, quando havia água na fonte, onde nadavam belos espécimes de peixes e tartarugas, e aliviava a sede de pássaros que vinham pousar nas árvores.
         Mas, nos últimos dez anos, a praça ficou esquecida pela administração pública, não se sabe por quê. Árvores velhas não estão sendo podadas, os canteiros não têm mais flores nem gramíneas, e a varrição contínua debaixo das árvores está assoreando o solo, pondo grandes raízes à mostra.  Com o ato contínuo da varrição, há o perigo das árvores tombarem... A fonte secou, não há peixes mais e, nem água para os pássaros. Não há mais esguichos de água, não há mais música... tudo se perdeu com o passar do tempo e, o nosso cartão postal florido passou a ser a prova contundente da administração relapsa. Muitas pedras portuguesas se soltaram do calçamento e se perderam ao longo dessa década.
         É lastimável.
         Todos os moradores lamentam o estado do nosso lindo Jardim. Esperemos que a nova administração volte os olhos para a nossa antiga Praça, para que possamos cantar de novo com o Chico Buarque:
         “... a mesma praça, o mesmo banco,
         as mesmas flores, o mesmo jardim.”
        
         Um Jardim sem flores não tem sentido.  
          E sonhar não é pecado.

         Mirandópolis, outubro de 2013.
         kimie oku in http://cronicasdekimie.blogspot.com.br/



2 comentários:

  1. Kimie, sou uma das maiores incentivadoras da recuperação da nossa Praça...concordo com você...é lastimável o estado em que ela se encontra...esquecida e acabada...não consigo passear com meu netinho ali qdo vamos a Mirandópolis...buracos, sujeira, e drogados se aproximando, xingando, incomodando....em pleno centro da cidade!!!...é uma vergonha!...os meus pais moram ali em frente, idosos, sozinhos...é sempre um motivo de preocupação a presença contínua de estranhos pedindo dinheiro o tempo todo no portão de casa...qdo não são atendidos, esbravejam e muitas vezes ficam violentos!...é um descaso em todos os sentidos....a arquitetura e localização dos novos banheiros é de um mau gosto incrível!....nada mais há naquele espaço maravilhoso de outrora que convide as pessoas a se sentar nos bancos imundos de hoje...uma pena mesmo!...e custaria tão pouco resgatar esse espaço para os mirandopolenses usufruirem dele, não é mesmo?....sua crônica, como sempre, estava deliciosa pra se ler!....desculpe o desabafo, mas é um assunto que me incomoda bastante e não podia deixar o bonde passar sem me manifestar! Um abraço...Joana

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    1. Obrigada por colocar aqui suas impressões, elas são válidas, pois me estimulam a escrever. Já cansei de cobrar das autoridades o descaso da Praça, mas eles fazem cara de paisagem. É uma pena.... Agora, quem são seus pais, Joana talvez eu os conheça. abraço. kimie

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