terça-feira, 6 de outubro de 2020

 

            Tokugawa Ieyasu   




    Aos dois anos de idade, perdeu a mãe que foi devolvida à família de origem, por questões políticas... Nunca mais a teria perto de si...

Com seis anos ao ser encaminhado como refém da família Imagawa Yoshimoto, foi raptado pela família de Oda Nobuhide... Nobuhide mandou uma mensagem ao pai Matsudaira Hirotada, para se aliar a ele, e garantir a vida do garoto. E o pai respondeu que era aliado da Família Imagawa e não se importava com o destino do filho... Aos oito anos, seu pai faleceu... Dos 9 aos 15 anos ficou refém da Família Imagawa...

      Estava destinado a ser um homem revoltado, porque não conhecera amor materno e nem paterno, fora moeda de troca de acordos políticos e passara a infância só em companhia de um bando de Monges em Monastérios... Mas Tokugawa Ieyasu, cujo primeiro nome fora Takechiyo tinha uma força interior, e uma firmeza de caráter que o tornariam um dos homens mais amados e poderosos do Japão. A moeda de troca que fora jogada pra lá e pra cá se transformaria num guerreiro e governante insuperável.

Nos dois anos que foi refém dos Oda, conheceu Nobunaga que tinha oito anos mais que ele. E Nobunaga foi companheiro, amigo, orientador e treinador do garoto, ensinando-lhe a nadar, a andar a cavalo e outras estratégias que lhe seriam úteis pela vida afora. Nobunaga o tratou como a um irmãozinho e deve ter sido a melhor fase da infância do Yeyasu. O mesmo Nobunaga que fora considerado o “tolo de Owari” e que seria um dos mais poderosos Xoguns da História do Japão.

Era das Guerras. Quem podia mais tomava as terras dos que não podiam se defender. E após muitas invasões, restavam umas dezenas de poderosos suseranos, que mediam forças entre si. Todo o Japão convulsionado em guerras sem fim...

Houve um confronto entre as forças de Imagawa e Oda. As forças de Imagawa invadiram uma das propriedades dos Oda. Essa propriedade era controlada pelo irmão mais velho de Nobunaga, Oda Nobuhiro, que acabou se tornando refém deles. Em vias de perder o Castelo, Nobunaga foi notificado por Imagawa Yoshimoto que se quisesse salvar o irmão, devolvesse o Takechiyo ou Ieyasu. E esse deixou de ser refém dos Oda e passou a ser refém dos Imagawa, dos nove aos quinze anos.

 Aos quinze anos, Takechiyo proclamou sua maioridade com o genpuku. E recebeu a missão de combater o clã Oda. Ele teria que combater Nobunaga que tinha sido tão gentil em sua infância! Mas ordens são ordens, ainda mais para um refém... Para a felicidade de Ieyasu, Nobunaga se antecipou e matou o seu opressor Imagawa Yoshimoto.

Com Yoshimoto morto, Ieyasu se libertou do cativeiro e se uniu a Nobunaga. Com ele encetou a conquista de Feudos e Suseranos adversários e aos poucos acabaram pacificando o país. Em 1567 mudou seu nome para Tokugawa Ieyasu e começou a sua ascensão como um poderoso Suserano, respeitado até por Nobunaga.

Havia um grupo de Monges guerreiros muito poderosos que possuíam Templos em todo o Japão. Eram os Monges Militares de Mikawa Monto. Eles não se submetiam ao Xogunato, e estavam sempre em guerrilhas contra os vizinhos. E Ieyasu foi incumbido de combatê-los. E ele os venceu e destruiu seus Templos.

Em seguida uniu-se ao poderoso exército de Takeda Shingen de Kai e foi pra cima dos Imagawa, seus antigos opressores que se opunham ao Xogunato. Ele os derrotou e acabou com seu reinado.

Mas o poder e a fama de Ieyasu crescendo começou a incomodar Takeda Shingen, que se aliou a Hojou Ujiyasu e atacaram territórios dos Tokugawa. Nobunaga mandou reforços, mas foram derrotados. Ieyasu se retirou para se preparar melhor.

Nesse ínterim, morre Takeda Shingen, o mais temido inimigo de Nobunaga e de Ieyasu. E contrariando Shingen que, no leito da morte ordenara ao filho Katsuyori para permanecer nos limites de seu território, o afoito jovem partiu para o ataque ao Castelo de Nagashino em Mikawa, território dos Tokugawa. Ieyasu estava preparado e Nobunaga se juntou a ele com trinta mil homens. Foi uma batalha terrível, em que o chão ficou coalhado de sangue dos dois exércitos. Terminou com a derrota dos Takeda, mas Katsuyori conseguiu fugir...

 A esposa de Ieyasu e seu filho estavam incomodados com o domínio de Nobunaga, e se aliaram a Takeda Katsuyori para conspirar a sua morte. Ao descobrir isso, o Xogun exigiu que executasse ambos. E Ieyasu o fez!  A esposa foi executada e o filho teve que praticar o haraquiri. Missão difícil, mas ele a cumpriu como prova de fidelidade a Nobunaga... Era matar ou morrer...

O fim dos conflitos só ocorreu em 1582 após a conquista do território de Kai terra dos Takeda, pelos exércitos de Oda e Tokugawa. Katsuyori cometeu suicídio por haraquiri e isso marcou o fim do Clã Takeda, tão invencível que marcou época no Japão.

Tudo estava indo conforme os planos de unificação do país de Nobunaga, com a derrota e submissão dos mais poderosos suseranos. Mas de repente, Akechi Mitsuhide foi ao Templo Honnou onde descansava Nobunaga, e o obrigou a praticar haraquiri... Essa morte comoveu todo o Japão, porque Nobunaga estava acabando com a Era das Guerras que havia assolado o país, e restituído a paz tão desejada pelos japoneses. Todos temiam a volta das guerras.

Pela importância e pela capacidade, Ieyasu seria o sucessor natural de Nobunaga. Mas, havia um vassalo fidelíssimo ao Xogun, que se antecipou e saiu à caça de Mitsuhide. Toyotomi Hideyoshi, que moveu céus e terras para vingar a morte de Nobunaga. E acabou comandando o Feudo dos Oda. E Ieyasu perdeu a chance de ser o próximo Xogun...

E por questões de sucessão, o filho de Nobunaga recorreu a Ieyasu e declarou guerra a Hideyoshi. Seis meses se confrontaram, mas como ambos os lados eram fortes não houve vitória nem derrota. Hideyoshi percebeu que era melhor ter o Ieyasu como aliado e não como inimigo. Então propôs um acordo de paz a Ieyasu, que aceitou.

Então Ieyasu e Hideyoshi somaram as forças.

Pouco a pouco, Hideyoshi foi assumindo o papel de Xogun e dominando todos os Feudos da região Sul e do Oeste. E determinou que Ieyasu controlasse o Leste e o Nordeste.

Havia um jovem que funcionava como um Tesoureiro, que era de total confiança do Hideyoshi. Ishida Mitsunari, que tinha verdadeira devoção por Nobunaga e Hideyoshi. Quando percebeu que o Ieyasu estava cada vez mais próximo de Hideyoshi, começou a ficar muito incomodado. E na surdina começou a tramar contra Ieyasu... E Ieyasu percebia as manobras do jovem e estava sempre de olho nele, sem nada dizer... Só observando.

Esse Mitsunari tinha forte ligação com uma das concubinas de Hideyoshi, que era sobrinha do Xogun morto Nobunaga. E essa devoção o iria perder um dia... Guindado a um posto de confiança por Hideyoshi como líder do Clã Toyotomi, pretendeu um dia derrubar Hideyoshi, e se aliou a Ieyasu para conseguir esse objetivo. Mas, Ieyasu era muito mais perspicaz... Ele apenas esperava o momento de intervir.

Com a morte de Nobunaga os mais fortes suseranos resolveram tomar as propriedades do clã Oda. Houve um confronto entre Ieyasu e Hojou, que após algumas batalhas indefinidas terminaram num acordo de paz. Enquanto isso, Hideyoshi estava empenhado em vingar a morte de Nobunaga, mas Ieyasu não participou dessa guerra contra Akechi Mitsuhide, que no final foi morto por um lavrador.

Hideyoshi prejudicara os herdeiros de Nobunaga na partilha dos bens e na questão da sucessão, então Ieyasu se aliou a Nobukatsu filho do Xogun morto e partiu para o ataque. Após dois meses de enfrentamento, tudo terminou num acordo de paz.

Havia ainda um Suserano resistindo; era o Hojou Ujiyasu, que não reconhecia Hideyoshi como Xogun. Era um poderoso senhor de oito Províncias da região de Kanto (região que abrange Tóquio  atualmente). Ieyasu e Hideyoshi partiram para o ataque aos vários castelos com duzentos mil homens. Hojou derrotado e seus líderes se suicidaram. O Clã Hojou também fora aniquilado.

E de repente, Ieyasu se tornou o Senhor das oito Províncias ou Estados de Kanto em troca de Kai, Suruga, Shinano, Totomi e Mikawa da região de Kansai. Transformou-se no segundo homem mais influente do Japão. Controlou e pacificou os samurais de Hojou. E modernizou a infraestrutura das Províncias, conquistando o respeito de seus vassalos. A História considera que “Ieyasu ganhou o Império recuando”

Quando Hideyoshi doente pressentiu o seu fim, nomeou um Conselho de Anciãos para governar o país, no lugar de seu filho de seis anos. Era o Conselho de Regentes, do qual Ieyasu foi escolhido como Conselheiro Mor. Além de Tokugawa Ieyasu, participaram Maeda Toshie, Mori Terumoto, Ukita Hideye e Uesugi Kagekatsu.

Como Conselheiro Mor, Ieyasu estabeleceu alianças com os suseranos contrários a Hideyoshi preparando o terreno para o seu Xogunato, que se estabeleceria aos poucos com a morte de Hideyoshi. Dois anos depois, morre o Conselheiro mais idoso Maeda Toshie.

Ieyasu tomou o controle do Castelo de Osaka, onde residia o filho de Hideyoshi, Hideyori e sua mãe. Que era uma das sobrinhas de Nobunaga. Isso despertou a ira dos demais Conselheiros e de Ishida Mitsunari. Este planejou matar Ieyasu, mas foi perseguido pelos generais. Tentou escapar vestido de mulher, porém foi protegido pelo próprio Ieyasu. E ninguém entendeu a atitude de Ieyasu.... Como estrategista, deve ter pensado em ficar de olho no jovem afoito e confrontar os próprios Conselheiros.

E de repente, a Guerra!

De um lado a Facção Oriental de Ieyasu.

E do outro, a Facção Ocidental de Mitsunari.

A Batalha de Sekigahara ocorreu nos campos de arroz de Gifu. Foi a mais importante batalha da História do Japão. Duzentos mil homens se envolveram nessa contenda. A Facção de Mitsunari tinha tudo para vencer com cento e vinte mil homens. Mas, Ieyasu com a sua estratégia de parlamentar com adversários, conseguiu que muitos importantes Suseranos passassem a lutar pela Facção Oriental. Kobayakawa e Mori Terumoto entre outros que ficaram famosos pela traição a Mitsunari... Trinta mil soldados perderam suas vidas... A Facção Ocidental foi totalmente dizimada e Mitsunari e seus líederes foram capturados e mortos.

E derrotado o último dos resistentes, Tokugawa Ieyasu  se tornou de fato o Governante do Japão. E como tal, distribuiu as terras tomadas dos adversários entre os parceiros que lutaram com ele. Muitos suseranos foram executados, com exceção de Shimazu, que foi poupado e que teria papel importante na história do Xogunato. Hideyori teve permissão para ser um cidadão comum e continuou morando no Castelo de Osaka.

Como Xogun, construiu o Castelo de Edo/Tóquio, que seria o maior Castelo do Japão e hoje é o Palácio Imperial. Reformou os Castelos da Corte e promoveu a modernização dos Feudos conquistados, assegurando uma vida de paz para todos os vassalos. 

Em 1603 Ieyasu foi reconhecido e intitulado oficialmente como Xogun pela Corte Imperial. Já estava com sessenta anos. Teve que esperar por décadas para assumir esse papel, que fora usurpado por Hideyoshi...

Em 1611 acompanhado por um séquito de cinquenta mil homens foi a Kiyoto testemunhar a coroação do Imperador Go-Mizunoo. Após as cerimônias, ele ordenou a remodelação da Corte e dos edifícios  imperiais. Forçou os Suseranos do Oeste que foram parceiros de Mitsunari a assinarem um Termo de Lealdade a ele. Compôs o Kuge Shohatto, documento que subordinou todos os nobres da Corte sob estrita supervisão sua, transformando-os em meras figuras cerimoniais.  Isso deve ter sido uma grande humilhação para os arrogantes nobres, que se comportavam como se fossem tão nobres e inatingíveis como a Família Imperial. Promoveu a modernização dos Feudos conquistados, assegurando uma vida de paz para todos.

 Entretanto, ele também baixou o Edito de Expulsão Cristã, proibindo a divulgação da fé cristã no Japão. Estrangeiros foram expulsos e os que resistiram foram mortos... E com exceção da Holanda, navios de outros países ficaram proibidos de atracar nos portos japoneses. Isso atrasou muito a modernização do Japão. Os japoneses conservadores temiam a influência modernizadora dos estrangeiros, especialmente os seguidores do Budismo e do Xintoísmo...

Após superar Nobunaga e Hideyoshi, vencer Shingen, Mitsunari e Uesugi Kenshin, solidificou o Xogunato Tokugawa, que governaria o Japão por 250 anos.

Dois anos após ser nomeado Xogun, ele abdicou do título em favor do filho Hidetada. Por ter assistido ao sofrimento de Hideyoshi. que morrera deixando indefeso um sucessor de apenas seis anos de idade, agiu de forma coerente para garantir  a sucessão de forma tranquila e segura. Apesar de ter se aposentado, não deixou de governar o país. Do Castelo de Sunpu, para onde se retirou continuou dando as coordenadas de administração ao filho Xogun, até o fim. Ainda editou o Shohatto Buke, que estabeleceu a forma administrativa do Xogunato Tokugawa, que passou para a História como a “Idade da Paz Ininterrupta” que duraria duzentos e cinquenta anos.

     Ainda restava uma grande tarefa para completar a sua obra. Era preciso destruir o único herdeiro de Hideyoshi, que reivindicava o cargo de Xogun. Hideyori conseguiu conquistar alguns suseranos poderosos que se opunham e conspiravam contra Ieyasu... Então durante mais de dois anos os dois grupos se enfrentaram. Houve o Cerco de Inverno de Osaka, em que um tiro de canhão levou a um armistício. Mas, a oposição não parou, então Ieyasu fez o Cerco de Verão com cinquenta mil homens. Hideyori, sua mãe, seu filho e seu neto foram executados. E assim, sua missão estava completa.

Mas Ieyasu não usufruiu da paz que veio em seguida. Um mês depois, veio a falecer com setenta e três anos de idade.

Assim foi a vida do mais famoso Xogun do Japão. Sua vida foi permeada de sofrimentos atrozes, mas conseguiu superar tudo com infinita paciência e sabedoria. Matou familiares e pessoas próximas e isso soa estranho para nós agora em 2020, mas a época era de Guerras e convulsões no mundo inteiro. A ordem era Matar ou Morrer. E sobreviver era preciso. E ele sobreviveu para organizar o Estado Japonês. E os japoneses entenderam o seu sacrifício. E o reverenciam todos os anos no mês de abril em Okazaki, sua cidade natal em Aichi ken com o monumental Festival Ieyasu Gyoretsu, desfile de cavaleiros, guerreiros vestidos a caráter como nos tempos das guerras... Para ninguém se esquecer.

"A vida humana é um longo caminho que deve ser seguido carregando uma carga pesada: Não devemos nos apressar."  Tokugawa Ieyasu - 1543/1616

Dentre os inúmeros pensamentos que deixou, esse define bem o caráter desse bravo samurai,  que desde a primeira infância aprendeu que para viver era preciso paciência, muita paciência...

Mirandópolis, outubro de 2020.

kimie oku in

http://cronicasdekimie.blogspot.com




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